Eu tive um sonho na vida o qual não consegui realizá-lo: ser coroinha! ----
As vagas eram raras e não sobravam para um menino bobo como eu, vergonhoso, que
não sabia chegar e nem concorrer.
Eu adorava as aulas de catecismo do meu tempo. Elas eram completas. As
catequistas se faziam eméritas professoras de religião. Faço-me lembrar, aqui,
a minha querida Maria Brasileira, neta do Padre Américo Brasileiro. O carinho e
o amor com que se dedicava a sua tarefa de catequista; ela era realmente
admirável.
Lembro-me de tê-la visto falar sobre o incenso e da Bênção do
Santíssimo.
O incenso é usado na Igreja Católica como um ato de adoração. A fumaça, acrescida do aroma característico, transforma-se num clima de alegria, de júbilo e satisfação; indicado para as solenidades nos momentos de liturgia e, com isso, criar uma pressão atmosférica bendita de oração, como nuvens subindo até Deus.
Trata-se, portanto, o incenso, de um elemento litúrgico, durante a
bênção e adoração do Santíssimo Sacramento.
A bênção do Santíssimo pode ser feita de duas formas diferentes:
Simples: com o Santíssimo no cibório (aquele pote sagrado) nesse caso o incenso
é facultativo. Contudo, a bênção solene com o Santíssimo no ostensório (o
objeto com que o santíssimo fica exposto) o incenso torna-se obrigatório.
Nessa Semana Santa, quando eu estava na Catedral de Santo Antônio, aqui
em Juiz de Fora, e ao ver um acólito balançar o turíbulo e o padre incensar o
altar, fermentou-se nas profundezas do meu cérebro, o meu tempo de criança nos
dias de Bênção do Santíssimo. O incenso e os coroinhas... Eles eram em torno de
dez ao redor do Monsenhor Castro.
Durante as solenidades em que havia um coroinha, eu ficava admirando o
trabalho dele, especialmente aos domingos durante a Bênção do Santíssimo
Sacramento. Naquele tempo não havia missas à tarde. E à noite era o terço com a
ladainha em latim. Enquanto o padre ia de “mater,
Christe e sancta”, nós, os fiéis, íamos de “ora pro nóbis”. A gente
não sabia o que estava ouvindo e nem falando, mas ia com fé, e muita fé.
O sacristão era o Antônio do Arlindo Barrilinho. Nesse caso, grande
parte das vagas de coroinha teria sido cedida aos seus irmãos, Sebastião,
Vicente e José. Afinal, um padrinho sacristão evidentemente iria interceder a
favor de seus irmãos no sentido de ceder uma vaga da irmandade tão cobiçada e
raramente conseguida pelos candidatos da meninada católica.
Os coroinhas tinham funções durante a solenidade que revisavam a cada
cerimônia. Dois deles ficavam ajoelhados ao lado do padre assegurando em cada
ponta o paramento que se chama capa magna. Outro seria o encarregado do véu
umeral. Outro ficava a cargo do pote de incenso; mais um a cargo da sineta e outro do genuflexório; e o
ultimo cuidava do turíbulo. (incensório) --- Para os que faltasse função, na próxima vez estariam em exercício.
Quando o terço estava no terceiro mistério, o coroinha da ponta direita
saia. Era ele, naquele dia, o encarregado de buscar brasas nos vizinhos (Tempo
de fogão a lenha) para colocar no turíbulo.
O coroinha do turíbulo era o que mais me causava inveja. Eu queria
muito, um dia poder ficar encostado naquela pilastra afastada do altar e
sacudindo para lá e para cá aquele incensório, soltando aquela fumacinha
cheirosa. Eu tinha a impressão que aquele coroinha naquele dia saia mais bem
abençoado da igreja.
Certo dia, quando o Vicente irmão do sacristão, estando de posse do
turíbulo, sacolejando-o para lá e para cá, talvez um tanto desajeitado, ou
então muito envaidecido, já bem na hora da Bênção, o momento mais puro da
solenidade, uma das correntes do cabo daquele instrumento se rompeu; e foi um
desastre espalhando brasas por todo lado.
Aquele transtorno
causou-me um tremendo impacto. Fiquei assustado. E como eu ficava o tempo todo
apreciando aquela operação do coroinha do turíbulo, cheguei a pensar que
pudesse ter sido um pouco de inveja avançado o sinal da minha alma pura.
A partir desse dia, nunca
mais pensei em ser coroinha. Eu não teria sido forte suficiente para passar por
um transtorno que teria passado o Vicente, o meu vizinho apelidado de “ratinho”;
porque tinha um caracol nos cabelos acima da testa.
Armando Melo de Castro
Candeias MG Casos e
Acasos.
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