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segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

OS GATOS DO SEGUNDO ANDAR.



Eu moro no terceiro andar de um prédio. No apartamento que fica debaixo do meu, reside uma família de três pessoas, tal como a minha: marido, esposa e uma filha moça. 
O convívio com vizinhos chega ser uma coisa realmente interessante. Tem vizinho bom, tem vizinho ruim. Tem vizinho feio e tem vizinho bonito. Tem vizinho chato e tem vizinho que não é chato. Tem vizinho que vive pedindo coisas emprestadas e tem vizinho que não pede nada. Tem vizinho que dá agrado e tem vizinho que não dá nem bom dia. Vizinho considerado parente mais próximo ou um inimigo bem próximo. 
Bom, enfim, tem vizinho que faz barulho e tem vizinho silencioso. Assim, são os meus vizinhos aqui de baixo são silenciosos, a gente quase não escuta o que eles falam. Normalmente ouvimos a voz da mocinha que tem algumas amigas numa cidade próxima daqui de Juiz de Fora, Matias Barbosa, e de quando em vez ela vai para lá passar o fim de semana na casa das colegas de Faculdade. Ai é que eu fico com a cuca crescida, ouvidos atentos e neurônios a todo vapor. É que quando a menina viaja eu tenho a impressão de que no apartamento de baixo vive um casal de gatos do tamanho de um casal humano. E a partir da meia noite começa o show dos gatos, corridas dentro do AP, chiados, coisas parecidas com essas coisas que os gatos fazem sobre o telhado. E o mais interessante, o cara não tem jeito de macho e a mulher não tem as características de fêmea, e a menina parece ser adotada. 
Ainda bem que isso só acontece depois da meia noite e às vezes com um espaço de tempo de até mais de um mês. Já pensou se o gato fosse um tipo viril?! Eu acho que o jeito deles engatar é diferente. Já a vizinha do primeiro andar, uma idosa dos seus setenta e tantos anos, diz que não sabe o que pode ser isso. Eles ficam em silêncio o mês inteiro e depois tira uma noite para deixa-la desassossegada. 
“Tadinha” da velha... Quanta inocência!

Armando Melo de Castro
Candeias MG Casos e Acasos.

sábado, 13 de dezembro de 2014

JOAQUIM, O PAI DE SANTO TARADO!

Certa vez apareceu em Candeias um cidadão que atendia pelo nome de Joaquim. Ninguém ficou sabendo se Joaquim de quê ou de quem... Sabe-se que “nas Candeias” é de bom hábito as pessoas serem chamadas pelo seu nome acrescido do nome do pai, da mãe, ou do cônjuge.  Assim por exemplo: João do Nestor, Zé do Ângelo, Carlinhos do Emílio, Luzia do Vico, Maria do Vete, Pedro da Dalva, Doca do Carneiro, Maria do Antero e por ai vai. Acontece às vezes que esse tipo de cultura pode até causar constrangimento como “Rola do Estevão... Rola do Norberto”. Isso aconteceu certa vez quando alguém perguntou à esposa do Norberto Cordeiro como se chamava e ela tranquilamente disse: “Eu sou a rola do Norberto” E o cara começou a rir sem parar deixando a pobre senhora toda sem graça.

Mas, voltando ao assunto do Joaquim de ninguém, esse não era candeense. Teria chegado a Candeias trazido por um amigo chamado Eduardo, que tinha um armazem, na Rua Professor Portugal, onde hoje reside a família do Nenem  da Zenóbia. Supõe-se, portanto que o ilustre desconhecido fosse de Itapecerica, também, como o comerciante Edudardo.---  Ninguem tinha certeza de onde ele saiu. Uma hora alguém dizia que ele era de Formiga, outra vez diziam de Itapecerica. O João Cambota que era viajante, disse que já o teria visto na cidade de Oliveira.

Itapecerica e outra de Campo Belo. E às vezes até de cidades distantes. Talvez tenha vindo através das águas, e com certeza águas de enxurradas, isso porque no pouco tempo em que se estabeleceu na cidade foi o suficiente para dar o cano na venda do Antônio do Orcilino, e aprontar com outras pessoas, inclusive com uma senhora distinta, como a Dona Lica do João Passatempo, que vendeu 2 feixes de lenha para ele e não recebeu. O bichão era escolado para passar a conversa nos outros. E o meio que ele escolheu era de pessoas humildes, carentes, desprovidas de tudo... Logo, logo, ele já foi fazendo, como se diz no linguajar do futebol: foi fazendo o seu meio de campo.

Era um camarada baixo, cabeça grande, cabelo na nuca, tinha uma meia calva, tipo testa longa que lhe ia até ao meio da cabeça; cavanhaque e bigode bem aparados, olhos fundos e boca grande; nariz avantajado cujas ventas cabeludas pareciam que iam aspirar o mundo. Tinha uma voz macia e agradável. Ouvia atentamente as pessoas para depois dar a sua opinião. Estava sempre trajando calça de brim e camisa de mangas compridas, branca e de colarinho preso. Contava uns quarenta anos mais ou menos e não tinha família. Bom, ele dizia que não tinha família, mas ele logo se ajeitou com uma candeense que morava lá pelos fundos do Bairro da Gruta e acabou engravidando a moça e depois disso ninguém nunca mais o viu. E a coitada ficou na rua da amargura.

O tal de Joaquim, logo que aportou em Candeias alugou uma casa velha que existia nas imediações da Praça Geraldo Cândido da Costa, e montou ali um tipo de clinica de charlatanismo e saiu anunciando que era benzedor, curador, raizeiro, pai de santo, quiromante e cartomante. Enfim, ele era tudo só não falou que era pai do diabo. Apresentado aos primeiros adeptos por um tal de Eduardinho, de Itapecerica, vendeiro estabelecido, onde hoje reside a família do Neném da Zenóbia. Diziam-se amigos e como Eduardinho era chegado nessas crenças poderia ter sugerido ao Joaquim, vir para Candeias.

Joaquim de ninguém, logo conseguiu formar um pequeno rebanho de idiotas já envolvidos na sua conversa fiada; que sob um efeito placebo, começou acreditar naquele elemento para o qual só faltava estar escrito na sua testa: “Eu sou um malandro”.

O malandro trouxe na sua tralha um secretário, um tal de Joãozinho, um mulato bem apessoado de cabelos lisos amarelados; magro, bem lavado, anca de mulher, andar de mulher, voz meio a meio. Ele orientava às pessoas a chamar o charlatão de “Pai Joaquim”, marcava consultas, recebia pelos serviços, vendia as garrafadas, inventava histórias e observava os homens que por ali passavam principalmente os mais jovens, robustos e viris.

E essa malandragem chegava a ultrapassar fronteiras, começou a vir gente de Campo Belo e Formiga e de outros lugares. Na quarta e sexta feira eram dias de incorporação. Na quarta o malandro incorporava um espírito de um tal Padre Jaci, que resolvia os problemas de relacionamento, amores desarrumados, brigas de casais etc. E nas sextas feiras ele recebia o espírito de um suposto Dr. João Napoleão, um médico que curava até câncer, apesar de que naquele tempo câncer era chamado de doença ruim. Nos demais dias ele dava passes e exercia as outras especialidades. Atendia, também, em domicilio. Dava para ver que a fonte monetária do Pai Joaquim começava a fluir ouro.

Um belo dia aparece à porta desse mundo de soluções, um carro com placa da cidade Belo Horizonte. Era um carrão. Desce ali um casal dando-se a entender tratar-se de pai e filha. O motorista corpulento, já de cabelos grisalhos, rosto bem escanhoado, trajando um terno de casimira. E a moça toda enfeitada como se tivesse vindo para um desfile de modas, deveria contar uns vinte e cinco anos. O jeito de ambos expressava tratar-se de gente inteligente e aristocrata.

Quando o Joãozinho viu aquela gente adentrar aquele ambiente totalmente desconforme para o seu porte, quase sentiu um orgasmo e lhes ofereceu um tratamento diferenciado, levando-os para um cômodo da casa onde diziam ser o escritório do “Pai Joaquim”, que naquele momento estaria em concentração, pois, entraria em transe dentro de alguns minutos. Naturalmente estaria se preparando para atender individualmente a cada um, sob o pagamento de “cinco cruzeiros” mais a venda da água energizada por ele, seguido de uma prevista garrafada que ele fabricava cujas raízes só Deus poderia dizer quais. Apenas os passes espirituais e as bênçãos eram gratuitos.

A sala cheia de gente aguardando ser chamada pelo Joãozinho, empanado num jaleco branco parecendo um enfermeiro do Hospital da Clinicas. E de repente: “---Dona Jussara, pode entrar, sem acompanhante”!
Depois de aproximadamente quinze minutos sai correndo e aos gritos lá de dentro a Dona Jussara: Ele me deu uma água para beber!!!... Ele me amoleceu... Ele me passou a mão!!!...

E o pai da moça, vai lá dentro, pega esse Pai Joaquim, dá nele uns sopapos e o nome mais bonito que saiu lá de dentro foi FDP. Nada restou ao Joaquim de ninguém, a não ser dizer que aqueles dois estavam encarnados no diabo.

É isso ai, nem todo aquele que vem em nome do Senhor, merece entrar no reino de Deus. E quem acredita em desconhecido, corre esse risco de ao invés de encontrar um pai de santo, encontrar um pai de diabo.


Pai Joaquim desapareceu no outro dia: não pagou a sua conta na venda do Antônio do Orcilino, não pagou o aluguel, afiançado pelo Eduardinho. Mais tarde chegou a notícia em Candeias de que o malandro estava em Goiás, com outro nome.

Armando Melo de Castro
Candeias MG Casos e Acasos