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quarta-feira, 15 de abril de 2020

WILLIAN VIGLIONI, UM HOMEM RARO.

                                                        SR. WILLIAN VIGLIONI E SUA FAMILIA.

É com imensa satisfação que o nosso Blog, Candeias MG Casos e Acasos, estará prestando uma justa homenagem a um dos mais ilustres candeenses ao completar, nesta data, 15 de abril de 2020, 96 anos de idade: WILLIAM VIGLIONI. Trata-se de um patrimônio vivo da história política e social do município de Candeias e que muito honra os anais da nossa história.

Nascido no dia 15 de abril de 1924, em Candeias, no casarão de sua família que situava onde hoje está edificado o prédio do Banco do Brasil S.A. --- Filho de Torquato Viglioni e Dona Maria Marques Viglioni.

Em 15 de junho de 1938 foi estudar em Barbacena, na Escola Agrícola, onde se formou em 1944, como técnico agrícola. Em 1945, seguiu para Belo Horizonte onde trabalhou na corretagem da Rádio Inconfidência e Guarani, e nos jornais: O Estado de Minas e Diário da Tarde. Foi ainda, funcionário lotado no gabinete geral do Estado, Pimenta da Veiga (pai). Em 1953 regressou à Candeias, passando a administrar a fazenda de seu pai, que estava com a idade avançada. Em 1954 casou-se com Maria Lúcia Viglioni, filha do Sr. José Pacheco Lops e Dona Nica, de cuja união teve quatro filhos: Marília Cristina, Ana Maria, Júlio Cezar e Torquato José.

Candeense na essência da palavra por ter a sua existência voltada para os interesses do município, da família e dos amigos. Teve grandes oportunidades de fazer a vida fora de Candeias com muito mais progresso; no entanto, preferiu ficar na sua terra lutando pelos seus ideais herdados da sua descendência de melhores gemas de linhagens candeenses. Sua origem familiar vem desde os tempos de Domingos Tendais. Neto do Coronel Marques além de sobrinho e discípulo do maior líder politico candeense, o Dr. Zoroastro Marques da Silva.

Seus interesses pela vida politica e social do município de Candeias honra os anais da nossa história; não só pela sua origem familiar, mas também pelo seu comportamento; pelo seu feito como cidadão candeense, cujos direitos e deveres sempre andaram juntos de si.

Obteve conquistas marcantes na área social e para o desenvolvimento da cidade, entre elas a fundação do Sindicado dos Trabalhadores Rurais de Candeias. --- Uma participação ativa junto ao ex-prefeito Francisco Coelho dos Santos na construção do Hospital Carlos Chagas. --- Teve grande atuação junto ao seu tio Dr. Zoroastro Marques, na instalação da Comarca de Candeias, quando foi concursado e nomeado 2º Tabelião. ---- Presidente do Clube Atlético Candeense, num tempo em que nossa cidade teve um futebol acirrado e disputava o campeonato regional, tendo sido o Clube Atlético Candeense, campeão de 1958 num dos maiores eventos esportivos da história do futebol do município.

William sempre se utilizou de sua cidadania consciente no auxilio aos menos favorecidos e foi durante 17 anos, responsável pelo Juizado de Menores do Município. Em 1972 a comarca foi extinta, e após este feito, iniciou-se o movimento para que voltasse novamente, sendo um dos baluartes nesta luta, e obtendo êxito a partir de 1990.

William Viglioni foi um dos vereadores mais atuantes, mais ativos e dos mais representativos da história do município. Eleito por dois mandatos, 1954 a 1958 e 1962 a 1966. Contudo, no último teve o seu diploma caçado covardemente, pela Ditadura Militar. Acusado de comunista, subversivo e um dos líderes do GRUPO DOS ONZE, injustamente, talvez pelo seu interesse comunitário; foi com isso considerado uma ameaça à ordem da ditadura.

 Foi preso tendo sido levado para a prisão em Campo Belo e posteriormente transferido para a Penitenciária Magalhães Pinto, onde ficou encarcerado durante três meses. Nesse tempo esteve dividindo os porões daquele presídio com figuras de altíssima relevância na politica nacional. Em 24 de maio de 1966, foi julgado pela 4ª Auditoria da junta militar de Juiz de Fora, levando-o, assim, à sua absolvição.

 Foi William um dos pouquíssimos brasileiros a ganhar posição de anistiado politico no Estado de Minas Gerais e no Governo Federal, sendo que este último efetuou a Declaração de Anistiado Político, oficializando em nome do Estado Brasileiro, o pedido de desculpas ao Sr. William Viglioni, além de efetuar pagamento pecuniário para ressarci-lo dos danos morais. Na época de sua prisão teve sua família dividida, cada filho com um parente em uma cidade diferente. Sua vida familiar passou por turbulências inacreditáveis, mas tudo foi superado. Ele voltou a assumir o seu cartório e a sua cidadania após ter sido julgado inocente. Seu processo se encontra arquivado na Biblioteca do Ministério da Justiça.

Mais recentemente foi agraciado com a medalha de “Desembargador Hélio Costa”, numa cerimônia que aconteceu no salão do Fórum de Candeias, presidida pelo senhor Juiz de Direito, na presença de muitos convidados. A Medalha Desembargador Hélio Costa é uma das maiores honrarias do Poder Judiciário mineiro, porque faz condecorar em todo o Estado de Minas Gerais, as personalidades cujo trabalho fazem a diferença e são relevantes no cenário politico e social do município.

 A medalha deve o seu nome ao Desembargador Hélio Costa, um dos desembargadores que mais se destacaram na presidência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Dessa forma, William Viglioni novamente representado pela justiça nos leva a observar a sagrada bandeira de Minas: JUSTIÇA AINDA QUE TARDIA!

O NOME DE William Viglioni é sinônimo de trabalho e honestidade. Foi sempre um homem que nunca recebeu salários como vereador e o seu trabalho foi sempre voltado em prol do nosso município; foi sempre por amor a terra que lhe viu nascer.

O legado que o William Viglioni deixa para a história política de Candeias é o da política com dignidade, honestidade e sem interesses pessoais. Uma política exercida em benefício do povo, dedicada a servir à população em sua defesa e por seus interesses. Uma referência de homem público inteligente, polido com educação destacada pela ética e pelo compromisso com o povo que o elege.

Parabéns meu amigo Willian Viglioni, e que esta data se repita por muitos e muitos anos e que a sua voz continue expressando a sua sabedoria e experiência que foram conquistadas com luta e sacrifício.
 Grande abraço e que Deus o abençoe Sr. Willian, hoje e sempre.

Armando Melo de Castro

Candeias MG Casos e Acasos.

quarta-feira, 8 de abril de 2020

O SUBACO RAPADO.

                                               Taís Araújo  -- Foto para Ilustrar o Texto.

Eu me sinto estarrecido com a violência do homem contra a mulher. Não existe, a meu ver, um ato de covardia mais humilhante. A força do homem não lhe foi concedida por Deus para atos dessa natureza e sim para defender a mulher que, na constituição da família, entra com a parte da sensibilidade tão necessária ao ser humano na sua formação. --------- Portanto, entendo que a força do homem é para proteger a mulher. ------- É verdade que existem mulheres exaltadas e agressivas que não reconhecem a inferioridade da sua força física e avançam nos homens principiando um atrito. Mas esse não é o caso da personagem da nossa história e nem justificaria hum homem levantar a mão contra uma mulher.

Eu tenho bem guardado, nas gavetas da minha memória, um fato triste que presenciei, quando criança, na residência de um casal Lourdinha e Tiãozinho, ---- Eu frequentava a sua casa que tinha um grande quintal onde eu brincava com o seu filho Jesus, mais ou menos da minha idade. Por mais que eu viva, jamais me esquecerei do drama que assisti ali naquela residência e que ficou marcado como um ferro candente no meu cérebro para o resto de minha vida.


Lourdinha, uma mulher de traços lindos, morena escura, canelas finas, corpo mediano, lindo e sedutor, capaz de atender os mais exigentes anseios masculinos, porém, faltava-lhe trato. ---- Um banho de loja e alguns cuidados, com certeza, lhe faria sósia da famosa Taís Araújo, atriz da Rede Globo de Televisão. ----- Se ao nascer lhe tivesse sido dado um endereço diferente para aportar-se neste mundo, o destino de Lourdinha poderia ter sido muito diferente.

No entanto o torrão natal que lhe foi concedido foi nos fundos de uma fazenda, sendo depois sido transferida para um canto da cidade de Candeias.  Como filha de pessoas humildes sem nenhuma perspectiva de vida. Nascera num meio pobre, o pai lavrador e a mãe doméstica. Contudo, faltou-lhe um meio favorável e sendo o homem um produto do meio, podemos reconhecer que Lourdinha foi favorecida pela natureza nas a sorte nunca lhe teve presente.

A pobreza eleva o ser humano que sabe viver com dignidade diante das dificuldades. Mas a vida sempre apresenta uma promessa de sonhos que todos esperam no seu amanhã. Mas o destino de Lourdinha não lhe prometia nada se não lhe bastassem os problemas que a vida lhe teria oferecido oriundos do berço. ---- O único sonho de Lourdinha realizado em toda a sua vida, foi ter participado das coroações da Mãe Maria no mês de Maio. Ela conseguiu ganhando de presente, já usadas, as asas e veste de anjo de uma amiga que já teria passado da idade para tal.

Aos 17 anos durante uma Festa do Rosário, se envolveu em namoro com um cidadão fora dos bons princípios morais, sem ânimo para o trabalho e o pior: cheio de tendências negativas. Era dado à bebida alcoólica e nos excessos se transformava totalmente de comportamento e personalidade. --- É de todo sabido que o álcool não sendo usado com moderação, faz efeitos diversificados e pode até chegar ao agravamento levando o ser humano a caminhos tortuosos, caminhos contrários aos bons costumes impostos pela sociedade.

Lourdinha conheceu Sebastião em uma Festa do Rosário. Dias depois com a pose de bom mocinho aproximou-se dos pais da moça para pedir autorização para o namoro. Como contava com dezesseis anos e ele já rapaz feito, com uma profissão, (Era um pedreiro de meia colher) o namoro foi autorizado tendo em vista os pais julgarem-na ter os dotes necessários pra o casamento, pois, sabia cozinhar, lavar e cozer. -------- Logo depois, se casaram com a aprovação da família que via para a filha uma reserva de futuro,

Sebastião era pedreiro do tipo meia colher. Era conhecido por Tiãozinho, mas, não tinha nada de “inho”. Era um mulatão forte, alto, cabelo bem aparado, rosto largo, dentuço, nariz tala larga e uma boca de dimensão respeitável que esguichava uma voz pastosa, principalmente, quando estava bêbado. Tipo encrenqueiro. Não se dava bem, nem mesmo, com os seus pais. Brigava por coisas ínfimas como, por exemplo, se alguém lhe tomasse o seu pedaço de frango preferido já era motivo para um falatório danado.
Chamava o pai de bobo e a mãe de ignorante, em um tempo em que os filhos beijavam as mãos dos pais. Era grosseiro e estúpido enquanto a mulher era uma figura delicada e amável.

Quase sempre, entrava em conflitos nos botequins quando exagerava nos goles e, ao chegar a casa, tinha a mão solta sobre a família, principalmente, na pobre mulher que vivia com o rosto sempre mostrando as marcas da violência do marido. Os pais, comumente, em conformidade com a história bíblica dos “Setenta vezes sete” (Mateus 18/22) não se envolviam e o pior é que não existia lei que punisse isso. Aquela velha história de que em “briga de marido e mulher não se mete a colher” era coisa efetiva. Para certas mulheres, a sua própria casa poderia ser vista como um protótipo do inferno.

O irmão caçula de Lourdinha iria casar-se na cidade de Campo Belo e a família foi toda mobilizada para a cerimônia. Tiãozinho teria descartado a sua presença, mesmo porque não teria como comprar roupas e nem arcar com um presente. Permitiu que a mulher viajasse desde que não lhe coubesse nenhuma despesa o que lhe foi bancada pelo seu irmão que tinha uma posição financeira boa.

Três dias foi o tempo de ausência de Lourdinha enquanto esteve hospedada com seus familiares na cidade de Campo Belo. Naquele afã da festa, as mulheres se arrumaram com esmero. Lourdinha foi levada a mudar o seu visual, pinçando as sobrancelhas, depilando as axilas, buço, etc. Isso, com certeza, teria mexido, talvez, com a única gota de vaidade que lhe restava.

O filho mais velho do casal não teria ido. Permanecera com o pai. Eu e ele éramos amigos e sempre nos juntávamos para brincar de bolinha de gude e rodar pião no quintal de sua casa que ficava nas proximidades da venda do Antônio do Orcilino, hoje mercearia do Rogério, na Rua Coronel João Afonso, com Rua José Furtado.

Lembro-me como se fosse hoje. Eu estava presente, quando chegou Lourdinha, toda feliz, com um visual mais cuidado, ainda dentro do vestido da festa, presente de sua mãe. O cabelo teria ganhado um banho de óleo e o rosto retocado. Trazia no colo a filha caçula e um embrulho com alguns doces, bombons, pedaços de bolos, ou seja, um pouco da festa para agradar o marido e o filho.

Ela não sabia o que lhe esperava:
Logo depois, ainda naquele calor da chegada, quando Lourdinha dava a mim e ao seu filho as delícias da festa, Tiãozinho vem chegando. Não teria ido trabalhar e já estava embriagado. Quando bateu os olhos empapuçados sobre a mulher e a vê com um novo visual começou com os ataques verbais que logo passariam aos ataques físicos:
Tomou-lhe das mãos o embrulho dos doces da festa e o atirou longe. E aos gritos dizia:

--- Vagabunda! Que negócio é esse de subaco rapado. E esses ôio pelado? Onde qui ocê tirô isso? Até a boca tá rapada. Que mais que ocê rapô? O que ocê andô fazeno nesse inferno de casamento? Deve tá tudo rapado sua “puta”, sem vergonha. Ocê tá mais é pareceno uma vaca do Zé Bolinha. (Zé Bolina era o dono da zona do meretrício). Muié, igual ocê, pricisa é morre! Sua ordinária. Trem ruim. Ocê juntô com a cachorrada da sua famía pra vortá desse jeito igual uma vagabunda de zona. Eu vô te mostrá sua safada, ispera aí.

Pegou a pobre mulher às tapas e lhe tomou pela nuca arrastando-lhe até a uma caixa d’água próxima à porta da cozinha e lhe mergulhou a cabeça causando-lhe um estado de desespero tão grande difícil até mesmo de descrever. Lourdinha estava ali, às portas da morte. Daí o canalha soltou a pobre mulher que se foi ao chão, cujo vestido novo se misturou com a lama da beira da caixa.

O rosto refletia a presença da morte. Eu e seu filho, Jésus, (chorando) com os olhos arregalados, assustados, impotentes, intimamente desesperados, assistimos àquele quadro de terror, quando aquele homem que mais parecia um animal irracional tomou-se da mulher e a depositou numa cama saindo em seguida para a rua.

 Diante disso, eu e o seu filho saímos desesperados até a venda do Antônio do Orcilino e pedimos socorro o que fez logo com que a casa se enchesse de gente.

 A partir desse dia, algo muito sério aconteceu com Lourdinha. Talvez, uma forte lesão cerebral. Ela nunca mais foi a mesma. Ficava o tempo todo olhando em uma só direção. Não ria, não chorava, tornou-se uma criatura vegetativa. Não dava notícia de nada e não falava coisa com coisa. Os filhos que outrora andavam limpos e saudáveis já não mostravam esse quadro. Tiãozinho vivia bêbado. Saía cedo e voltava à noite. Não fosse a família de Lourdinha, esta e os seus filhos teriam morrido de fome.

Após algum tempo, mudaram-se para a cidade de Formiga e eu, nunca mais, tive notícia dessa família. Até que um dia, muitos anos depois, no Bar do Vicentinho Vilela, alguém se aproximou de mim e perguntou:

---Disseram-me que você é o Armando?
---Sim, pois não...
---Eu sou o Jésus da Lourdinha. Talvez, você não se lembre de mais de mim. Moro em Belo Horizonte e sou motorista de táxi.
---Claro que me lembro de Jésus! Como iria me esquecer de você, meu amigo!

Após um abraço emocionante, perguntei:

---E sua mãe? Como está?
---Minha mãe morreu muito nova, logo após nossa mudança daqui. Ela nunca mais se entendeu como gente!

Naquele momento, caíram duas lágrimas que se encontravam guardadas nos fundos dos meus olhos, há muitos anos! Não tive coragem de perguntar pelo seu pai e, felizmente, ele não me disse nada a respeito dele.

Eu gostaria tanto de não ter esta história para contar! Ela me transporta ao inferno das mulheres violentadas por demônios que pensam que são homens.
É triste! É muito triste!...

Armando Melo de Castro
Candeiasmg.Casos e Acasos
Candeias -MG

NB) O título um tanto bizarro inspirado na estranheza da palavra até então para mim.  Era um tempo em que os meninos eram muito bobos. E a palavra teria sido pronunciada várias vezes.