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quinta-feira, 28 de maio de 2020

EXPEDICIONÁRIO CLOVIS CAMBRAIA ALVARENGA

                                                                   Expedicionário Clovis Cambraia Alvarenga.

Vamos imaginar a nossa querida cidade de Candeias no principio da década de 40: Uma cidadezinha do interior de Minas Gerais, recém-emancipada de Campo Belo, vivendo a rotina de uma precariedade natural; sem verbas; sem trabalho, sem saúde, escolas sem estruturas; sem telefone; rádios escassos; televisão nem pensar... Transporte ferroviário limitado,

O trabalho existente voltado, quase que exclusivamente, em sua maioria para a área rural quando o trabalhador vivia praticamente do exercício de um trabalho próximo do escravo, cuja renda se limitava a alimentação. -=-- Enfim, uma população humilde, com um alto índice de analfabetismo; e a pobreza retratada através das vestes tomadas de remendos e as compras a granel quando o freguês comprava, às vezes, o suficiente para uma refeição.

A palavra guerra para essa gente seria, sem dúvida, o sinônimo de medo e morte.  No entanto, havia uma guerra bem longe dali incomodando as nações. Mas isso muito distante de Candeias e, além disso, o Presidente da República, Getúlio Vargas, havia se pronunciado de que o Brasil teria uma posição isolada com referência à participação nesse conflito.

De repente a notícia de que o Brasil iria entrar na guerra em resposta a uma ação estratégica da Alemanha  quando afundaram cinco navios brasileiros ---- Getúlio Vargas resolve por entrar na guerra. E o nosso país agora se vê entre o susto dos jovens soldados e o pranto dos pais desses jovens- Partir para a guerra poderia ser a ida sem volta, como aconteceu com dois de nossos heróis.

E foi nesse clima de grande emoção que em 1944, doze jovens soldados candeenses, os denominados pracinhas, partiram para incorporar os 25.334 que embarcariam a fim de lutar na Segunda Guerra Mundial, na Itália. São eles: 
Antônio Teixeira Souto
Clóvis Cambraia de Alvarenga  
Guilherme Pulhês 
Humberto Pulhês, (dois irmãos)  
João Sidney de Sousa Filho
Jorge Alvarenga da Silva 
José Laurindo V. Sobrinho 
José Nicodemos Gomide 
Lázaro Lopes de Alvarenga
Lázaro Moncefe de Castro
Leonidas Macêdo Filho 
Rui Cândido Alves.
Esses heróis voltariam um ano depois ao final da guerra em 1945.

CLÓVIS CAMBRAIA DE ALVARENGA.

Hoje, o nosso Blog estará fazendo uma simples homenagem a um desses heróis que partiu levando a sua vida deixando para trás todos os seus sonhos, todas as suas esperanças. Afinal, ir para guerra era como fazer o jogo da roleta russa: viver ou morrer!

Clóvis Cambraia de Alvarenga, nascido em Candeias, no dia 27 de março de 1915, filho de Cristovam Alvarenga e Iracema Cambraia de Alvarenga. ---- Casado com Maria Aparecida Alvarenga em 02 de fevereiro de 1947. Tendo um filho adotivo desde o nascimento, Edgar Cambraia Alvarenga e pai de dois netos: João Paulo Oliveira Cambraia e Richard Oliveira Cambraia.

Como candeense foi um homem rigorosamente cumpridor dos seus deveres. Bom filho para com o seu pai Cristovam, bom marido, bom pai e bom amigo. Foi abençoado porque conseguiu sobreviver sem os traumas e sequelas da guerra. Um homem digno de respeito, pois, o seu nome não representava não somente Candeias e Minas, mas sim o Brasil.

Clóvis não trouxe traumas da guerra, pois exerceu com lisura a sua cidadania, como comerciante, quando foi proprietário o açougue São Judas Tadeu, fundado por ele e um amigo. ---- Dali Clóvis saiu para exercer o cargo de fiscal municipal do município durante os mandatos dos prefeitos João Pinto de Miranda e José Pinto de Resende. --- Exerceu, também, a função de Juiz de Paz, tendo sido eleito no final da década de 50 quando esse cargo era eleito pelo povo junto as eleições para prefeito. 

Deixou de ser fiscal para exercer uma atividade na Agência dos Correios e Telégrafo de Candeias num reconhecimento justo do governo para os pracinhas brasileiros, dos quais muitos não estavam em situação financeira satisfatória.

Certa vez quando eu curiosamente conversava com o Clóvis sobre a guerra ele fez comigo um comentário que me deixou pensativo. Eu pude sentir no seu olhar que ele guardava dentro de si algo que não o fazia feliz enquanto disse: “A pior coisa da guerra é você se sentir sozinho no meio de muita gente”. "A gente não conhece quase ninguém e todo mundo não conhece a gente." Você se lembra do seu povo, da sua cidade, do Brasil, mas não sabe se vai voltar se vai viver de novo aquela vida tão feliz que você vivia." "É como a gente tivesse morrido e estava num inferno." "Naquele momento você perde o ânimo até para rezar."  Você vive num mundo de incertezas. Não sabe se amanhã estará vivo, morto ou desaparecido, como aconteceu com dois colegas. Um foi encontrado morto e o outro desaparecido."

Eu suponho que a pessoa que volta de uma guerra, não volta como foi. A guerra deve transformar completamente aquele jovem que foi para matar inocentes e que poderia morrer como inocente. ----- Você pensar que vai matar um ser humano inocente como você, na mesma situação em que você está! Tratar alguém de inimigo, quando no fundo do seu coração ele nunca foi inimigo. Como isso deve pesar na cabeça d alguém que foi criado, ali naquele conceito religioso, tomando a bênção dos pais e rezando para dormir... Meu Deus! Por que a guerra!?

O expedicionário Clóvis Cambraia de Alvarenga, como os demais companheiros candeenses que lutaram brilhantemente na Segunda Guerra Mundial enaltece a história de Candeias. Não são todos os municípios de Minas Gerais que têm essa honraria registrada na sua história. Afinal o exercito brasileiro foi à guerra para combater o fascismo e o nazismo. Causa-me estranheza quando ouço alguém chamar Bolsonaro de fascista, sendo ele é um militar do exercito que já combateu o fascismo.

Finalizando registramos aqui de saudosa memória um voto de louvor ao Sr. Clovis Cambraia de Alvarenga, enquanto registramos todo o nosso reconhecimento e respeito não somente pelo fato de ter sido um expedicionário da FEB, mas também, pelo amigo e pelo cidadão que sempre foi. Onde quer que esteja, o nosso herói, enviamos-lhe o nosso abraço.

Armando Melo de Castro
Candeias MG Casos e Acasos.



CANDEIAS MG CASOS E ACASOS

398 TEXTOS SOBRE CANDEIAS

307 000 CURTIDAS.































sábado, 23 de maio de 2020

AS LARANJAS DE DONA JULITA.

                                                                         Dona Julita Macêdo

Numa revirada nas gavetas das minhas memórias, encontro-me com Dona Julita Macêdo, quando ela morou numa casa antiga que ficava onde está hoje, o prédio do Zé do Anjo, ao lado do galpão que estabelecia a sua oficina mecânica. 

Eu tinha os meus doze anos e meu pai havia me colocado como aprendiz na oficina mecânica.  Naquele tempo era assim: o pai chegava a casa e dizia ao filho: eu arrumei serviço para você, vai começar amanhã. Não tinha esse negocio de saber de salário e nem o que iria fazer. Era uma ordem e pronto. Os pais arrumavam serviço para os filhos trabalhar de graça e o patrão dava o que queria.


Dona Julita estava sempre costurando ou bordando, na sala e quem passasse pela rua poderia vê-la com a sua filha Ivone enquanto trabalhavam e ouviam rádio. Lembro-me de certa feita, ver e ouvir a Ivone cantando junto com Caubi Peixoto, através do rádio, a canção, “Conceição”, quando esta fazia grande sucesso.


Posteriormente ela mudou-se para uma casa nova na Rua do Capão, hoje Rua Pedro Vieira de Azevedo. Dona Julita mulher de estatura alta, magra, olhar severo, filha do coronel João Afonso Lamounier. Boa mãe, boa amiga e muito brava. Não mandava recados. 


Com essa mudança, a velha casa ficou abandonada e havia por lá um grande quintal com um pomar cheio de pés de laranjas. Eu no verde dos meus anos trabalhava sem remuneração num dos meus primeiros empregos, na oficina mecânica do Zé do Anjo. --- Não existia essa história de patrão dar lanche para empregados. A gente tomava o café da manhã, almoçava às 11 horas e jantava quando voltava à tarde para casa. Não havia horários. Parava de trabalhar quando a noite chegava. A noite era o relógio.


Da oficina poderiam ser vistas as belas frutas no quintal daquela casa esquecida; Laranjas baianas, doces e deliciosas que cresciam os meus olhos, separadas de minhas mãos apenas por um velho muro quebrado. ------ Ali os olhos viam; o estômago pedia; o cérebro autorizava e a consciência julgava.


Incentivado pelos colegas, Pato, Patinho, Bento, Carlinhos da Alzira, eu comecei a entrar no quintal da casa abandonada e roubar laranjas para todos. 


Até hoje eu sinto o sabor doce dessas laranjas. No meu entender de menino eu imaginara não estar cometendo um roubo. Estaria apenas subtraindo aquilo que estava se perdendo... 


Algum tempo depois, ao passar pela porta do Sr. Nestor Lamounier, irmão de Dona Julita, eu pude avistá-la sentada à sala do Sr. Nestor, quando fui surpreendido com o seu chamado: ----- Oi menino da roupa suja vem aqui! -----Eu levei um grande susto sendo chamado por Dona Julita a qual foi me perguntando: 


-----Como você se chama? De quem você é filho? 


Respondi: Meu nome é Armando e meu pai é Zé Delminda. Diante daquele interrogatório e eu com a consciência pesada, tremi dos pés a cabeça. E ela continuou: 


-----Fiquei sabendo que você anda roubando as minhas laranjas... 


Respondi: Foi só uma que chupei! A senhora está enganada não foi muita não...


----- Só uma né? Sei!... Você além de ladrão de laranjas ainda é um cara-de-pau. Entrou-se no meu quintal e apanhou uma laranja, é roubo. Você não é o menino que trabalha no Zé do Anjo?

Sou mais lá tem outro... 

----Mas quem rouba as laranjas?

E eu chorando respondi: Sou eu...

----Amanhã eu vou lá conversar com  o Zé do Anjo...

Naquele dia eu não dormi. Eu chorei e não podia contar o motivo. E pensava: aquela mulher vai me fazer perder o emprego... Vai me fazer tomar uma sova do meu pai. Era Semana Santa e eu rezei o tempo todo pedindo a Jesus e Nossa Senhora das Dores que me ajudasse. ----- Rezei para todos os santos e em especial para o meu Santo Antônio, mas pensando: eles não vão proteger um ladrão de laranjas, mas parece que todos me ajudaram naquele momento. 

No outro dia, ao chegar à oficina, eu pensei que iria sentir um colapso, quando vi Dona Julita bem ali saindo da velha casa e se encontrando comigo na entrada da oficina. Pensei, é agora que ela vai falar com o Zé do Anjo para me delatar. ---- Mas não. Ela esperava a mim e veio logo dizendo: "Oi menino! Eu resolvi Você podes apanhar as laranjas desde que seja só para você, para os outros não.


Diante daquela surpresa eu comecei a chorar e não tive o que falar. Minha voz sumiu e fiquei por entender o motivo daquela flexibilidade. Talvez tenha sido pelo fato de estarmos em plena semana santa. Mas eu nunca mais apanhei de suas laranjas. Nunca mais entrei no quintal de alguém. Nunca mais chupei uma laranja que não fosse conseguida de forma lícita. Tornamo-nos amigos; onde eu a via, eu aproximava-me dela a cumprimenta-la e mesmo já depois de crescido, Dona Julita me chamava de menino.


Anos depois como pintor de paredes a sua casa foi o meu ultimo trabalho em Candeias, antes de ser levado para São Paulo pelo seu filho Antônio Macêdo, para trabalhar no Banco Mineiro da Produção S.A., – posteriormente Bemge.

Sabendo ela que eu iria dali em diante trabalhar no Banco ela me disse: 


---Você é um menino bom. Vai dar-se bem no Banco. Siga o exemplo do Antônio que você será um gerente. -. 


E os anjos disseram AMÉM. 

Obrigado Dona Julita pela aula de vida que a senhora me deu. Onde quer que esteja receba o meu abraço e o meu agradecimento carinhoso.


Armando Melo de Castro


Candeias MG Casos e Acasos

sábado, 16 de maio de 2020

REMINISCÊNCIAS CANDEENSES.

                                                 VISTA PARCIAL DE CANDEIAS MG. 1948.

Essa quarentena tem mexido com os meus neurônios. Eu tenho encontrado tempo para pensar de tudo. Já pensei no meu tempo de estudante que mais me marcou desde o tempo do meu curso primário em Candeias, no Grupo Escolar Padre Américo. Recordo-me de muitas passagens durante esse tempo que teve o seu primeiro dia em 03 de fevereiro de 1953, quando a diretora era a Dona Stela Marques, esposa do fundador de Candeias, Dr. Zoroastro Marques da Silva.

Esse tempo está muito bem guardado na minha memória, e posso ainda me lembrar de muitas professoras entre elas, as primas, Dona Maria do Carmo Alvarenga e Dona Ninita Alvarenga. --- As irmãs Maria do Carmo Bonaccorsi, Iêda Bonaccorsi e Ione Bonaccorsi. --- As irmãs Zélia, Nenem, Enir e Celinha, filhas do Sr. João Eleutério Parreira, coletor da Coletoria Estadual. Celinha era a filha caçula, recém-formada. que veio a se casar com o nosso amigo, candeense por adoção que ficou guardado na história de Candeias, José dos Santos Portela. 

 Naquele tempo formar uma filha para professora não era fácil. Faltavam professoras em Candeias. Quando uma se engravidava, necessário se fazia vir substitutas de fora, Campo Belo, Itapecerica ou Formiga.

Recordei-me, também, da primeira vez que fui à Câmara Municipal e assisti uma reunião. Eu era muito jovem e posso me lembrar de que o Presidente da Câmara era o meu amigo Edson Cordeiro, vereadores, posso lembrar-me do Sr. Willian Viglioni e Wantuil de Castro, meu tio.

Outra coisa que bateu aqui na minha cabeça jogado pela quarentena é o Horto Florestal e o senhor que trabalhava lá, o Sr. Vitor. Meu pai há anos vinha pelejando para fazer nascer uma semente de tento, esses tentos vermelho e preto que as pessoas usam para jogar truco. Mas nunca teria conseguido. ---- Sr. Vitor disse para o meu pai que nunc teria tentado cultivar aquele tipo de semente, mas que ele teria que coloca-la a ferver porque tinha a casca muito dura. ---- Todas as tentativas foram inúteis e o Sr. Victor acabou desmoralizado na boca do meu pai: “Aquele veio num sabe é nada”.

Outra coisa que mexeu no fundo das gavetas da minha memória foi a inauguração do Campo de Viação em Candeias, quando tiveram muitos políticos presentes, Candeias nesse tempo tinha o melhor prefeito de todos os tempos, o Dr. José Pinto de Resende. ---- Aquele grande coador num poste chamava a atenção de todo mundo. Até então a grande parte dos candeenses pensavam que BIRUTA era gente doida ou perturbada.

Outra coisa que passou pela minha cabeça, foi o cinema de Candeias, o Cine Circula Operário São José. Antes da televisão tinha seções todos os dias. Comumente aos sábados e domingos eram duas seções. O cinema recebia muitos artistas e o ingresso era praticamente o preço da entrada de cinema. --- Lembro-me de alguns como os sertanejos Tibaji e Miltinho. Pedro Bento e Zé da Estrada, Cascatinha e Inhana, Duo Guarujá e o mais famoso sanfoneiro do Brasil o Mário Zan. --- Lembro-me, também, quando estiveram num circo em Candeias, elas eram novinhas, as Irmãs Galvão. Chegaram a Candeias de caminhão leiteiro, vindo de Itapecerica, via camacho.

Com toda essa fermentação no meu cérebro eu não poderia esquecer uma porção de amigos, meus contemporâneos, amigos e colegas de escola. Colegas das primeiras doses, das primeiras farras. Muitos já falecidos, mas ainda vivos em minha memória.

Ontem quando navegava na internet o meu amigo Coronel, O Deoclecio Ribeiro, dedilhando um violão e cantando uma canção de Roberto Carlos Recordei-me imediatamente do seu irmão Flávio Ribeiro do Nascimento, meu contemporâneo, e grande amigo falecido ainda jovem, mas um amigo daqueles que não morrem, pois ficam guardados para sempre nos nossos corações. ----- 

A idade trás para dentro de nós um sentimento nostálgico. Foi como se tivesse o amigo Flávio perto de mim, conversando, tocando violão e cantando como em tempos passados, essa música que Flávio tanto gostava. ----

Outro amigo que veio à tona de minha memória, foi o meu amigo Wanderley Alvarenga, o Ley Careta. Éramos amigos e compadres, levara-me para padrinho de seu filho Cristian. Ley gostava declamar poesias, algumas delas: O Tédio; O jogador na Igreja; Orgulhosa; Meus Oito Anos, um texto sobre Rui Barbosa o Gigante Notável. e muitas outras. “Entre as que a turma mais pedia era ‘A BUNDA QUE VALE TUDO”. esta eu pude encontrar na internet e a coloco aqui como uma boa lembrança do meu amigo querido Wanderley Alvarenga, o Ley Careta.

A Bunda Que Vale Tudo.
Quando ela passa, todo mundo espia.
Não para a cara que não é formosa
E sim para a bunda, tão mimosa.
Em bunda eu nunca vi tanta magia.

Treme, requebra, anseia, rodopia,
Dentro de uma expressão maravilhosa
Deve ser uma bunda cor de rosa
Da cor do sol quando desponta o dia.

E ela bem sabe que sua bunda é boa
Vai rebolando pelo mundo à toa
Deixando a multidão maravilhada.

E eu a contemplo num silêncio mudo
Não pela cara que não vale nada
E sim pela bunda que me valia tudo.
-
-----Ao meu amigo Ley, onde quer que esteja receba o meu abraço.

Armando Melo de Castro
Candeias MG Candeias Casos e Acasos.


quarta-feira, 13 de maio de 2020

MONSENHOR CASTRO.


                             Monsenhor Castro
Hoje o nosso Blog Candeias Casos e Acasos estará homenageando um nome que é uma referência na história da nossa cidade. Trata-se do Monsenhor Joaquim de Castro.

 Monsenhor Joaquim de Castro nasceu em Candeias no dia 26 de julho de 1915. Filho de Francisco Alves Vilela (Xixico Vilela) e Dona Etelvina Rosa de Castro. Foram seus padrinhos, o avô paterno, José Primeiro Vilela e a avó materna, Dona Rita Carolina de Jesus. Duas ilustres e tradicionais famílias que muito fizeram e ainda fazem para o nosso município: família Castro (Dos Carrilhos) e família Vilela.

Vinte e dois dias após o seu nascimento falecia a senhora sua mãe, vítima de complicações do parto de seu único filho. Seu pai, Francisco Alves Vilela, em segundas núpcias teve outros filhos, entre eles o Sr. Candinho Vilela. A criação e a formação do insigne reverendo ficaram a cargo dos avós maternos, o Capitão Joaquim Carlos de Castro e Dona Rita Carolina de Castro, a Dona Ritinha, que o criou como filho junto aos seus filhos; fato que o levou a considerar os seus tios como irmãos. São eles: Daniel, Miguel, Getulio, Rafael, Joaquim, Manoel, Tonico, João, Geraldo, Sinhá, Sinhana, Maria José, Maria Madalena e Etelvina, sua mãe.

Por ter ficado órfão de mãe, com apenas vinte e dois dias de vida e sobre os cuidados da família materna, muita gente ignora que o Monsenhor Castro foi neto do Alferes, José Primeiro Vilela, e sobrinho dos mais conhecidos membros da família Vilela, Cândido Alves Vilela (Candola), José Vilela, Vicente Vilela, Aurélio Vilela, Paulo Vilela e muitos outros, pois se sabe que o Sr. José Primeiro Vilela era patriarca de duas famílias numerosas, somando-se vinte filhos.

Tão logo tenha lhe aflorado o desejo de ser um sacerdote de Cristo, sua família lhe encaminhou para um seminário de Belo Horizonte. Sua ordenação sacerdotal aconteceu no dia 24 de setembro de 1938, quando contava com 23 anos de idade.

Monsenhor Castro era um líder nato. Dono de uma eloquência fantástica. Rico, sendo herdeiro único da fortuna de sua mãe, ordenou-se, sem parcimônia, numa época em que os pais mandavam os filhos para o seminário a fim de conter estudos gratuitamente, o que não foi o seu caso.

Logo que foi ordenado padre, teve uma pequena passagem pela paróquia da cidade de Cana Verde, vindo posteriormente para a Paróquia de Candeias permanecendo aqui pelo resto de sua vida. Sem dúvida alguma, a maior autoridade eclesiástica, até hoje, exercida em Candeias, foi de Monsenhor Joaquim de Castro. Grande conselheiro apesar de ser extremamente moralista. Era bem aceito.

O partido político da UDN (União Democrática Nacional) deteve o poder na Prefeitura de Candeias durante muitos anos. E Monsenhor Castro foi sempre ouvido pelos prefeitos. E quando em missões mais importantes em Belo Horizonte, a sua presença era imprescindível. A Cemig, por exemplo, foi instalada em Candeias numa época de muitas dificuldades e o Prefeito da época teve que contar com a valiosa ajuda do Monsenhor com seus argumentos perante o poder do Estado.

Mesmo sem a sua interferência direta, era sabido da sua influência no cenário da política candeense. As barraquinhas de São Sebastião e Nossa Senhora das Candeias, hoje relembradas com saudosismo, eram muito organizadas à vista de sua orientação. Trata-se de um marco importante na história de candeias. Infelizmente, essas quermesses nunca mais tiveram a mesma conotação após a morte do Monsenhor Castro.

Fundou o Circulo Operário São José. Era uma associação mantenedora de um pequeno cinema onde os seus sócios eram operários. Posteriormente, dada à dispersão desses sócios, tornou-se seu único mantenedor. Investiu seu capital nesse projeto e o Cine Circulo Operário São José tornou-se numa atração dinâmica, vez que foi considerado o melhor cinema da Região. Mantinha sessões para as crianças aos domingos às 14 horas e o ingresso tinha um desconto de 50% para aqueles que levavam o “bom ponto” do catecismo, exercido na igreja, uma hora antes do filme.

Essa era uma maneira lógica de evangelizar e levar as crianças ao catecismo da igreja. E assim era o Monsenhor Castro. Teve participação ativa na fundação do Ginásio de Candeias através da CENEG, cujo ensino era gratuito. No ano de 1960, o Papa o agraciou com o titulo de Monsenhor em reconhecimento aos inúmeros serviços prestados à Igreja.
Trabalhou durante anos e anos para realizar o seu grande sonho de ver a Nova Matriz com a sua construção terminada, o que não lhe foi possível, pois veio a ser vítima de uma doença incurável.

Partiu desta vida no dia 8 de janeiro de 1968, aos cinqüenta e três anos de idade. Seu corpo encontra-se sepultado numa das naves da Matriz pela qual tanto trabalhou para vê-la edificada.

Inesquecível Monsenhor Castro: Sabemos que você renunciou a muitas coisas em sua vida para dedicar-se, inteiramente, ao seu magistério. Sabemos que não é fácil dedicar-se como você se dedicou às causas de Cristo com tanto entusiasmo, com tanta alegria e com tanto amor.

Muito obrigado Monsenhor Castro e onde quer que esteja receba o nosso abraço.

Armando Melo de Castro
Candeias MG Casos e Acasos.

quinta-feira, 7 de maio de 2020

O CANDEENSE NICO PACHECO.

                                                   Sr. NICODEMOS SALVIANO (Nico Pacheco)
Nas minhas caminhadas, pelos arredores da nossa cidade de Candeias, fiz passagem por uma rua de poucas casas. Uma viela que toma todo o seu lado direito pelo Cemitério São Francisco e do lado esquerdo, estão às poucas casas residenciais. ----- Trata-se da Rua Nicodemos Salviano.


Eu não conheço o critério usado pela Câmara de Vereadores de Candeias no momento de escolher uma rua a quem vai dar o nome de um cidadão merecedor desse ato de veneração e respeito. Mas, entendo tratar-se de um fato relevante, mesmo porque, isso envolve todo um processo de reconhecimento ao homenageado pelos serviços prestados a sociedade, sem esquecer o atributo de personalidade idônea.

O cidadão comum, na posteridade, esteja certo ou errado, queira ou não queira, verá na representatividade da rua a equivalência da homenagem.

Ainda que os políticos vivam considerando diferenças dentro das desigualdades, como também, das igualdades e buscando desculpas de que o conceito sobre a igualdade, de Rui Barbosa, é jurídico, não interessa. Sabemos que a desigualdade social é patente em todos os pontos e é inerente à vida. Portanto, seria de bom alvitre os senhores políticos atinarem pela lição de igualdade que Rui Barbosa deixou para os cidadãos brasileiros:

“A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade... Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais, com igualdade, seria desigualdade flagrante e não igualdade real.” (Rui Barbosa - Oração aos Moços).

Pelo que representa o nome do empresário, Nicodemos Salviano, para a história de Candeias, entendo que a lembrança de tomar o seu nome para colocá-lo numa rua, por parte dos representantes do povo candeense, na Câmara Municipal, foi justa, muito justa. Mas a escolha da rua não teve um critério judicioso. A Câmara não usou de equidade ao escolher a rua onde estaria cravado o nome de um cidadão como poucos na história de Candeias.
Esse ponto de vista não visa ferir a essencialidade da rua. Apenas busca elevar o merecimento do homenageado no sentido de fazê-lo mais evidente.
Portanto, peço desculpas aos senhores moradores da Rua Nicodemos Salviano.

Nicodemos Salviano, o popular candeense tratado pelos amigos de Nico Pacheco, nasceu no dia 04 de abril de 1895, em Candeias. Filho único de Antônio Rodrigues Salviano e Maria Eufrásia de Jesus.

No seu tempo, não havia em Candeias nenhuma escola regular. Portanto, foi educado pelo então pároco, Padre Américo Brasileiro, homem de profunda cultura com quem aprendeu a ler, escrever e adquiriu conhecimentos básicos, além de aprender línguas, entre elas, latim, espanhol e francês. Estudou, também, com o Padre Américo, a arte da música, o que lhe fez ser grande apreciador da música clássica e um louvável pistanista da Corporação Musical de Candeias, da sua época.

Em 1922, após acordo de seu pai com o Sr. Antonino Basílio de Azevedo, da cidade de Itapecerica-MG, casou-se com Dona Zita Bemaventurada dos Santos que contava à época 16 anos, sendo ele onze anos mais velho que ela. Tiveram vários filhos, dos quais, onze sobreviveram. São eles: ------Zizica – Aparecida – Terezinha - Antônio - Alba - Santa – Agda -- Nicodemos - Zitinha - Raimundo e Rosália.

Começou a vida como carpinteiro, porém, no decorrer do tempo, realizou vários empreendimentos, muitos ao mesmo tempo. Destacam-se, entre eles:

Olaria, no lugar denominado Cachoeirinha;
Exploração de jazidas de calcário, nas comunidades de Trindades e Bugios;
Fabricação de farinha de mandioca;
Fabricação de farinha de milho;
Beneficiamento de arroz;
Moinho de Fubá;
Torrefação de café da marca “Café Ene Esse”; (NS)
Fabricação de ladrilhos hidráulicos;
Fabricação de móveis;
Fabricação de urnas funerárias;
Fabricação de bancos de cimento; --- existentes, ainda, nas Praças de Candeias ---.
Fabricação vigas e pré-moldados;
Revendedor de material para construção, inclusive cimento.
O Grupo Industrial do senhor Nicodemos Salviano, formado por diversas pequenas empresas, tinha como sede a Rua Salatiel de Carvalho, 84, e funcionava nos galpões, até hoje lá existentes, já em estado precário, numa área ligada com a sua residência.

Nicodemos foi também dedicado à política do Município, desde os tempos em que Candeias era distrito de Campo Belo. Ocupou cargos públicos como juiz de paz e delegado de polícia. Membro de diretório e candidato ao cargo de vice-prefeito, na década de 50.

Autodidata que nunca parou de estudar. Gostava de inventar coisas e aprendeu a profissão de construtor tendo adquirido o registro no CREA sob nº. 138. Com essa especialidade, construiu inúmeras casas em Candeias muitas das quais ainda existem na sua forma original.

Foi um grande amigo e braço direito, para muitas obras, do Monsenhor Joaquim de Castro. Junto a ele, construiu o cinema de Candeias e, mais tarde, dirigiu a sua reforma transformando-o no prédio que ainda hoje existe, quase na sua forma original.

Sob a orientação do Monsenhor Castro, reuniu um grupo de amigos, entre eles Sebastião Salviano e Antônio Freire, quando fundaram o Círculo Operário São José que tinha por objetivo unir e apoiar a classe operária, tendo sido o seu primeiro tesoureiro.

Foi o construtor das primeiras casas da Vila Vicentina. Foi também o responsável pela construção da Santa Casa de Candeias, instituição que não se concretizou, além de muitas outras construções, algumas já demolidas e outras ainda de pé, como o prédio do Bar Piloto.

Enfrentou o seu maior desafio ao dar início à reforma da antiga Matriz de Candeias. Dirigiu os primeiros trabalhos e ficou à frente da construção da nova Matriz até por volta de 1965. Desgostoso com o rumo que as obras tomavam, adoeceu e veio a falecer, em 19 de fevereiro de 1970, dois anos após a morte de seu grande amigo e confessor Monsenhor Castro.

Alguns casos pitorescos, lembrados por seus filhos e narrados por sua neta materna, Clara Salviano Borges:

Conta-se que ele estava trabalhando na casa de uns franceses que aqui residiam. A mulher, com medo de que ele fosse uma pessoa desonesta, guardou o relógio de ouro do marido. Esse, ao procurar pelo relógio, perguntou a ela, em francês, se ela tinha visto o objeto. Nicodemos respondeu, também em francês, que ela o havia guardado, deixando os dois sem graça.

Diz-se que o Monsenhor possuía uma mula que só deixava o dono montá-la. Aí, meu avô vestiu a batina do padre e montou, enganando o animal.

Ele inventou uma tinta para caneta (usava-se apenas canetas tinteiros na época), feita de amora. Ensinou o segredo apenas para o Sr. Cristovam Alvarenga e não deixou registro da invenção que acabou se perdendo.

Outra tia contou dois casos: ele tinha um amigo que morava em uma rua, mais abaixo da sua casa, e, quando o amigo passava, os dois se comunicavam através de assobio, dizendo frases inteiras por esse meio, se entendendo perfeitamente. E com sua veia de inventor, comprou, certa vez, um automóvel velho da marca Ford que desmanchou para aproveitar peças e, com um pedaço, fez a porta do forno de fogão à lenha que ainda está inteira no mesmo local.

Nicodemos Salviano dedicou toda a sua vida à sua terra natal. Aqui nasceu, viveu e morreu. ---- Nasceu, quando Candeias, estava longe de ser uma cidade. Era uma vila sem recursos e sem expectativas, pois, somente em 1938, aconteceu a emancipação do Município, contando, inclusive, com o seu esforço como um dos aliados do emancipador, Dr. Zoroastro Marques da Silva.

Constituiu a sua família com dignidade. Os percalços da vida sempre foram enfrentados quando amparado por uma religiosidade fiel. Sempre de mãos em punho para a luta e colocando sempre a sua inteligência à prova.

Dado à sua autoridade moral e ao seu comportamento lhano era também conselheiro. Muitos pediam o seu conselho, nos momentos de dúvida.

Infelizmente, as empresas do senhor Nicodemos Salviano não subsistiram após a sua morte depois de terem servido a nossa cidade, durante muitos anos.

Quem passar pela Rua Salatiel de Carvalho poderá ver o cenário do que restou, depois de uma longa história de muitos ideais. Trata-se da obra do tempo. O tempo, esse ácido que mata virtudes e ironiza destinos, que transforma a matéria, brinca com a imensidão e corrói a vida em troca da morte.

Os escombros do velho galpão onde funcionava a máquina de beneficiar arroz e a marcenaria. Ali se fabricava de tudo, inclusive urnas funerárias, aquelas de modelos antigos, envolvidas num tecido roxo. Antônio, o filho do Nicodemos, estava sempre ali produzindo aqueles caixões mortuários, quando falecia alguém.

Do lado de fora, está o engenho de serra carcomido pela ação do tempo, parado e ainda contendo a serra fita, como se estivesse esperando alguma tora para serrar.
Ao lado, está o barracão destinado à fábrica de bancos e ladrilhos dando frente para o pátio de secagem dos produtos e outras atividades.

Num canto contíguo, está o galpão da torrefação do Café Ene Esse. Uma das primeiras marcas de café torrado e empacotado da nossa região. Muitas pessoas viram, pela primeira vez, esse tipo de produto através do “Café Ene Esse”, popularmente, tratado de “Café do Sô Nico”.

Um cenário triste para quem se lembra da movimentação existente naquele local, hoje com o silêncio das máquinas e o cessar dos martelos.
Naquela área restrita, havia lugar para tudo e se não tivesse, ou se inventava ou se arranjava.

A família, como base fundamental da sociedade, faz nascer de si valores que dão guia à vida das pessoas. Portanto, é dela que nasce o líder que se coloca disposto, não só pela necessidade de pertencer a ela, mas para servi-la. E é assim que consigo ver você, Nicodemos Salviano. A singularidade do seu modo de vida e a contribuição que você deu à história de Candeias, o faz ilustre. Portanto, hoje, lembramos você e escrevemos aqui para que as pessoas que não lhe conheceu possam saber quem foi você. Um nome digno de respeito e que escreveu um maravilhoso capítulo da história de Candeias.

Obrigado, Sô Nico! Obrigado por Candeias!

Armando Melo de Castro
Candeias – Minas Gerais





sexta-feira, 1 de maio de 2020

MINHA AMIGA DONA ESTER DE PAIVA

                                                             Cruzeiro do Josino - Candeias MG.

Hoje, como às vezes acontece comigo, amanheci com o desejo veemente de colocar a minha conversa em dia com os Céus. Portanto, resolvi ir até ao Cruzeiro do Josino, ponto preferido por mim para falar com Deus. Fui pedir ajuda - entregar os meus pecados e agradecer tudo aquilo que recebo diante da missão que me foi dada aqui neste mundo, no sentido de contribuir com a obra da Sua criação.

Ali, aos pés daquela cruz campal, símbolo maior da redenção cristã, onde, há mais de sessenta anos eu faço as minhas orações e as minhas meditações, abri um dos mais queridos estojos da minha infância e me encontrei com Dona Ester a minha antiga vizinha de quem eu guardo nítidas lembranças pelo carinho que me dedicou, quando eu me encontrava ainda, no verdor dos meus anos. Muitas foram às vezes que nos ajoelhamos aos pés daquela cruz e rezamos juntos. Agora, com certeza, estará noutra das muitas moradas da casa do Pai Celestial.

Que saudade eu senti naquele momento de Dona Ester!...
Retroagindo pela estrada do tempo, volto à minha infância e sinto a presença de Dona Ester dando-me a sua melhor atenção como que alguém muito importante para ela.

Natural da cidade de Itumirim/ MG, na região de Lavras, veio trazida para Candeias através das águas do destino como uma ave aquática extraviada da sua rota. Aqui, se aportou na busca de novos ares e de algo que pudesse atender a sua vida vazia, visto que teria vivido de preencher o vazio dos outros, sem nenhuma resposta. 

Seu comportamento, involuntário, não atendia os preceitos da sociedade hipócrita e escrupulosa.  Época em que um agouro do destino arrebatava quaisquer sentimentos louváveis. Era um tempo em que a prostituição tinha diversos segmentos e, entre esses, a fome, a miséria e o meio de onde é feito o homem como produto excluso. Dona Ester era uma vítima social julgada como ré por um tribunal sem consciência. Teria sido ela uma prostituta que chegou à Candeias, vinda pelas águas da sarjeta.

Seu desejo de ter um lar lhe foi concedido por Deus com o avanço da idade. Contudo, os filhos lhe teriam sido negados. Casou-se, já idosa, com João de Paiva que lhe acolheu após a sua travessia nesse revolto mar da vida. Desde então, se tornou integrante da Irmandade do Sagrado Coração de Jesus, quando ostentava o seu vestido de tricoline preto e uma fita de seda vermelha ao pescoço como insígnia da confraria. Teria sido um presente do marido que a fez muito feliz. Aquele vestido preto, talvez, tivesse dado a Dona Ester uma emoção muito maior do que o branco vestido de noiva que jamais teria usado.

Agora, perante a Igreja Católica, parece que Dona Ester teria se tornado filha de Deus por ter se casado de acordo com as suas regras. Até então, Dona Ester teria sido  refutada pela igreja.

Era uma vida modesta. Seu marido um pedreiro do padrão: meia-colher e, às vezes, lhe faltava serviço. Dona Ester, com a sua hábil maneira de economizar, fazia com que não lhes faltassem nada. Chegou a juntar dinheiro com o qual comprou um rádio usado sendo, naquela época, um aparelho caro, mas, que lhe proporcionava acompanhar, diariamente, o terço através da Rádio Nove de Julho, de São Paulo.

Dona Ester gostava de ir ao mato catar gravetos e sempre me levava com ela, como companhia. E lá no mato, era aquela preocupação comigo: "Armando! Cuidado, meu filho! Olha no chão para ver se não tem cobra!”.

E eu, com os meus olhos de menino descuidado, nem sei se olhava para o chão. O que eu queria, no entanto, era encontrar as frutas do mato, naquele tempo fartas na região de Candeias, como a guabiroba, goiabinha, pequi, araçá, araticum, marmelada-de-cachorro e muitas outras espécies de frutas silvestres das quais eu tanto gostava e que só existem, hoje, nas minhas lembranças. 

Ainda guardo, na minha memória, um pé de limãozinho doce que existia próximo de onde está hoje, a COPASA, no Bairro Rio Branco. Como Dona Ester gostava daqueles limõezinhos! O pé era muito alto e a gente tinha que levar um bambu para apanhá-los. Às vezes, eu insistia em subir no pé para colher a fruta da sua preferência, mas ela não deixava. Temia que eu viesse a cair do galho.

Dona Ester sabia tudo e me ensinava tudo. Eu a ouvia, atentamente, quando falava. E como eu gostava de vê-la chamar-me de meu filho! O meu coração tinha lugar para muitas mães e eu a coloquei dentro dele como uma de minhas mães.

Éramos vizinhos de frente. Na sua casa, ela não comia nada diferente sem guardar uma prova para mim. Ela criava uma carneira dentro de casa e parece que o animal gostava de mim também. A ovelha era tida como filha. Tratada como “bitinha” da qual tirou lã até completar uma colcha para se agasalhar como se fosse aquilo o calor do animal querido.

Quando a seca chegava e a chuva não vinha, íamos juntos molhar o pé da cruz e pedir auxílio aos Céus. Devota fervorosa de São Benedito e São José, dizia sempre que os seus santos nos aliviariam da seca mandando chuva.

As pessoas que adoeciam na vizinhança tinham uma aliada fiel. Preocupava-se com o doente como se fosse um parente seu.

Quanta saudade eu sinto de Dona Ester! Lembro-me de suas risadas mostrando uma boca sem dentes. Exaltando as rugas de um rosto sofrido. Os cabelos brancos levando a saúde e matando a juventude. Um corpo flácido e fatigado pelo tempo dando mostras de uma vida em decadência; coberto, constantemente, por um vestido de tecido grosso, descorado e desgastado. Um corpo sem o viço de outrora, estampado numa velha fotografia amarelada e dependurada junto de um quadro da Santíssima Trindade na sala de sua casa.

Onde quer que você esteja Dona Ester, obrigado pela presença constante na história da minha vida. Receba de coração o meu abraço, o meu beijo, o meu carinho e a minha saudade. Com certeza, a paz do Senhor estará sempre com você porque você merece.

Armando Melo de Castro
Candeias MG Casos e Acasos.