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domingo, 27 de novembro de 2022

O PINTO DO GALO.

 Eu vi numa feirinha aqui perto de casa, uns ovos maravilhosos E o vendedor afirmando que eram ovos caipira. Só de falar que eram ovos caipira a minha boca já foi enchendo d'água e eu comprei uma dúzia para experimentar. Eu não estaria muito confiante, pois já teria sido enganado, com esse tipo de ovo. Pedi a minha mulher para fazer fritos para mim, pois deveriam estar com a gema amarelinha, conforme o vendedor teria prometido.

Uma gema amarelinha de ovo caipira misturada no arroz é o meu sistema --Realmente os ovos estavam com a gema amarelinha. Mas quando caiu na minha boca, a língua os dentes, a úvula palatina, aquilo que eles chamam de sininho deram bronca, A garganta não queria dar passagem. E mais uma vez eu fiquei puto da vida por causa de ovo falsificado. ---- Eu que fui criado comendo ovos caipira, de galinhas que comiam rato, escorpião, merda e outras porcarias mais, para dar aquele sabor delicioso do ovo caipira, a minha boca logo repudiou aquele sabor de ração. Daí então, fermentou em meu cérebro a lembrança dos ovos que eu comia no tempo que ainda não existiam esses ovos de granja.

Eu tinha, mais ou menos, uns 10 anos de idade quando o miolo da minha caixa craniana se fermentou tal qual um líquido numa pipa de mosto. ---Eu estaria impressionado com a forma de reprodução das galinhas. Já teria tomado conhecimento de como a gente chegava ao mundo. Meu pai cuidadosamente teria me contado. E como o seu vocabulário era bem no coloquial e sem rodeios, eu fui logo entendendo que os fazedores de xixi tinham outras funções. Essa mania de substituir o espermatozoide por sementinha não era do seu feitio - (Acho isso uma incongruência) – Portanto, aos oito anos de idade, eu já teria tomado conhecimento como fui parar na barriga da minha mãe.

Meu pai, Zé Delminda, foi um filho criado sem mãe e que teve apenas três meses de escola, mas lia muito e era uma pessoa muito inteligente e bem orientada por si próprio.

Chegou a ser professor da Prefeitura de Candeias na zona rural, num tempo em que os professores de roça eram leigos. ----- Meu pai ensinou-me coisas que as escolas e nem os pais ousavam ensinar. E a bem da verdade, as crianças e adolescentes, na sua maioria, viviam de curiosidade e a rua era a escola da vida. Eu sabia muita coisa, mas fingia que não sabia de vergonha da minha mãe, mas do meu pai eu não tinha nem um pingo de receio.

Minha mãe sempre dava o contra do jeito que meu pai me tratava e sempre dizia: “Ocê tá pondo o Armando perdido zé” --- E meu pai sempre dizia, eu ensino em casa para não aprender na rua. A primeira pinga que eu bebi, a primeira cerveja, foram servidas pelo meu pai, com um pequeno discurso: “Você pode beber, mas nunca pode deixar a bebida beber você e se estendia. – Ele ia à Biblioteca da prefeitura, e pegava livro de histórias infantis e lia para mim e meus irmãos.

Meu pai foi um cara muito bacana. No momento em que escrevo este texto os meus olhos lacrimejam de saudade do meu querido velho. Uma recomendação que ouvi do meu pai desde menino era de que onde a gente estiver na escola, no trabalho ou em qualquer lugar, devemos nos aproximar dos colegas mais bem sucedidos. Preste bastante a atenção nessas pessoas. Geralmente elas falam mais de ideias, além disso o homem é um produto do meio onde convivemos.

Mas voltando à reprodução da galinha, eu perguntei ao meu pai como que o pinto saia da barriga da galinha. Foi quando ele me disse que o pinto não saia da barriga e sim do ovo. E, por mais que ele me explicasse, não conseguia entender. E o pinto do galo? Onde ficava? Eu já tinha pego um franguinho e vasculhado ele todo e não teria visto o pinto dele. Eu queria saber também, porque que pinto chamava pinto... As minhas perguntas quando eram muito complexas, o meu pai sempre dizia: Depois eu te falo, mas ia ficando.

Encontrava-me totalmente perdido e muito curioso. Mesmo porque, o meu pai me explicou direito como eu teria nascido. Como nasce um bezerro ou um cavalo, o gato e o cachorro. Mas, a galinha eu não sei se por falta de paciência, ou por falta de palavras adequadas, ele não teria me convencido de como era o processo da reprodução através dos ovos.

 A nossa morada era uma casa germinada onde moravam o meu tio João e meu pai. Os quintais eram juntos e bastante grandes. Tia Eliza criava muitas galinhas e o galinheiro dela ficava no fundo do quintal. Eu sempre estava por perto estudando as suas vidas. E por mais que eu tentasse entender o modo de  procriação desses animais, estava muito difícil para eu associar a diferença entre um mamífero e uma ave. Quando uma galinha botava um ovo, o galinheiro virava um frege. Cacarejavam como se houvesse botado um asteroide. Aquilo parecia uma grande festa pelo nascimento de um filho. Mas, eu não tinha visto o processo de incubação. Como que um pinto saia do ovo se eu via sair era uma gema amarelinha dos ovos que minha mãe fritava?  As explicações do meu pai sobre a incubação eu não teria entendido absolutamente nada.

Certo dia, fiquei horas e horas, de tocaia sobre um ninho para ver como o ovo saia de dentro da galinha. E vi! Vi tudo, inclusive o sofrimento da pobre ave. Roubei-lhe o ovo e o quebrei para ver se saia um pinto. Mas, que nada! Minha tia vendo a minha curiosidade me explicou direitinho, dizendo que a galinha ficava dormindo sobre os ovos durante 21 dia, dai saia os pintinhos. Ai já bateu em mim o remorso de ter quebrado o ovo da galinha, e a dó de comer ovos, imaginava que cada ovo comigo era uma galinha perdida. Aquela coisa da galinha ficar durante dias sobre os ovos fez a minha cabeça rodopiar. Parece que os meninos de antes eram mais curiosos e menos inteligentes.

 O meu projeto de descobrir como aqueles ovos poderiam se transformar em pintos deixou-me aguardando com ansiedade o dia em que a minha tia fosse colocar uma galinha para chocar. E essa hora chegou. Todos os dias, assim que eu vinha da escola, corria para visitar a choca que estava lá inerte sobre os ovos.

Um belo dia, quando cheguei para ver a minha amiga mamãe-galinha, lá estava  tota pimpona e alguns pintinhos já estavam com o bico fora das penas dela. E a minha tia me recomendou, Não mexa porque senão ela fica brava. No outro dia quando voltei da escola e fui correndo visitar a mamãe-galinha, o ninho estava vazio, ela ciscando e alimentando os pintinhos. E eu mais do que depressa fui pegar um pintinho e quando fiz essa tentativa, essa galinha me avançou e eu tive que sair correndo morrendo de medo. Mas eu passava horas pastorando essa galinha de pintos, um pouco mais distante, porque tinha medo da choca me avançar de novo.

 Aos domingos era dia do frango com macarronada. Quem o matava era a minha avó, pois minha mãe tinha dó de fazê-lo. E neste momento, quando o pobre galináceo se estrebuchava para morrer, eu já o apalpava para examiná-lo, pois uma incógnita ainda mexia com os meus neurônios. Fiquei observando com a maior atenção a minha mãe depenar, sapecar, lavar e desventrar o frango, já quase galo.

Ansioso eu aguardo a chegada do meu pai para me dar a resposta que iria satisfazer a mais funda das minhas curiosidades:

Pai, como que o galo faz pinto se ele não tem pinto!?

 E meu pai rindo, satisfeito por ver-me interessado num assunto macho, responde:

“Vamos lá fora. Eu vou explicar tudo pra você. ”Ouvi quando minha mãe bradou!

 “Ê Zé! Cê vai acabar deixando esse menino perdido!”

 Armando Melo de Castro

Candeias-Minas Gerais


terça-feira, 8 de novembro de 2022

JOVENS! CULPADOS OU INOCENTES?


 Às vezes eu chego a pensar que morri e estou em outro mundo. Parece até que o mundo que me viu nascer não existe mais. Tudo que antes era proibido ou pecado hoje em dia é coisa normal. Mentir, roubar, falar palavrão, faltar com o respeito com os mais velhos ou com os pais era falta grave dentro de uma família. Uma criança ao se sentar tinha que ter postura, colocar os pés sobre as traves de uma cadeira fazia merecer uns tapas. Se chegasse uma visita, o silêncio das crianças era total. Tomar a bênção dos pais, dos mais velhos e do padre era um dever. Nas escolas a falta de respeito com a professora era falta grave e isso cominava em expulsão, ficando o aluno impedido de se matricular em outra escola. Do jeito que vão indo as coisas, daqui a pouco matar não será crime.

 Hoje em dia, parece que tudo isso era um atraso de vida.  O que já vi e tenho visto chega a me assustar de ver tanta indisciplina. Não se trata de condenar as novas gerações, afinal elas não têm culpa. Afinal, sabemos que vivemos sobre uma lei de causa e efeito. Portanto, não existe efeito sem causa e nem causa sem efeito. E quais são essas causas?

 Recentemente um grande político brasileiro disse que sua mãe lhe dizia que a mentira é necessária, porque ela voa enquanto a verdade engatinha. Um conservador como eu, quase morre de susto diante de uma coisa dessas.

 Não é difícil observar que a televisão trouxe uma grande mudança para a nossa sociedade a partir da década de 60 quando se espalhou pelo Brasil afora,  trazendo consigo a grande parte dos pecados capitais. O convívio das pessoas humildes com o poder persuasivo da televisão; os maus exemplos dados pelas novelas.   De outra forma a integração da mulher no trabalho fora do domestico  sem um preparo devido para isso, deixando os filhos nas mãos de pessoas despreparadas. E agora para completar a internet, ao alcance de todos. Em  suma podemos dizer que as novas gerações vem sendo vitimas do despreparo  do seu meio.

 No passado, por exemplo, roubar era uma das piores expressões. Um ladrão não era condenado apenas pela justiça, mas sim pela sociedade. Lembro-me de um sacristão chamado Onofre, era o xodó do Monsenhor Castro. Ele tinha por profissão pintor de paredes. Certa feita, numa construção de primeira linha em Candeias, vieram pintores de Campo Belo. Nesse meio tempo foram roubadas algumas latas de tinta naquela construção, que investigado descobriu-se que o roubo teria sido feito pelo Onofre sacristão. Foi um escândalo total na cidade.  E o Monsenhor Castro que era um homem rico, pagou os prejuízos para o Onofre e lhe deu o conselho para se mudar de Candeias, porque ali ele não iria conseguir mais nada. Onofre nunca mais foi visto em Candeias. Sumiu de vez.

 No quintal de nossa casa havia uma grande parreira a qual o meu pai cuidava muito bem, o que proporcionava uma boa colheita de uvas, quando na safra tínhamos fartura da fruta que dava para agradar a vizinhança. Certo dia, a Aparecida do Zé do Leonides, esposa do Carminho Machado esteve conosco e viu as uvas, minha mãe colheu alguns cachos e lhe deu de presente. Alguns minutos depois, a Marly, sua irmã estava a perguntar a minha mãe se ela realmente teria dado aqueles cachos de uva para a sua irmã. Seu pai mandara conferir.

 No ano de 1955, minha professora era Dona Ninita Alvarenga, que teria se transferido para a cidade de Divinópolis dada a transferência de seu Marido, Sr. Edson, chefe da Agência do IBGE em Candeias, antes do Sr. Miguel Albanês. Posteriormente Dona Ninita esteve a Candeias e levou de presente para os seus ex alunos, um lápis moderno que tinha anexado na ponta superior uma borracha. --- Quando apareci com esse lápis, meu pai quis saber a origem e foi até a escola conferir se aquilo teria sido mesmo um presente da professora.

de de São Sebastião do Paraíso, num bar de um conterrâneo, o Lelei, irmão do Carmelio Carvalho. Era a primeira vez que eu saia de casa. Na despedida de meus familiares, minha mãe chorando e meus irmãos tristes, meu pai se aproximou de mim e disse: “Escuta aqui meu filho, seja honesto, não ponha a mão no que não for seu. Eu prefiro que você volte morto para casa, do que com o nome de ladrão. Respeite o seu patrão e a família dele. Que Deus o abençoe.

 Dizem que a oportunidade faz o ladrão. Eu tive muitas oportunidades na minha vida para roubar, mas não roubei. --- Machado de Assis, contrariava esse rifão, e dizia que a ocasião faz o furto, porque o ladrão já nasce pronto, ---- por mim eu não sei se o ladrão nasce pronto ou se é a ocasião faz o ladrão. Sei dizer que o eco das palavras do meu pai, naquele momento nunca fugiram dos meus ouvidos.

 Armando Melo de Castro.

 

 

 

 

 

 

sábado, 5 de novembro de 2022

MORTOS QUE VOLTARAM.


                                                       Erasmo Carlos

Semana passada a mídia informava a morte do cantor Erasmo Carlos. Naquele momento eu fiquei muito chateado porque eu sempre fui fã desse cantor, vivi e convivi com a era da Jovem Guarda, da qual Erasmo era um dos principais junto de Roberto Carlos. Mas ainda chocado com a notícia, vim a saber que se tratava de uma notícia falsa da Folha de São Paulo, que pedia desculpas aos seus leitores e desmentia a notícia. ---  Fiquei feliz ao saber que o cantor estava bem, ainda internado, mas que já era prevista a sua alta.

 Esse equívoco sobre Erasmo Carlos trouxe a boiar no lago da minha imaginação, um fato que aconteceu comigo no ano de 1994 quando eu morava e trabalhava como gerente do Banco do Estado de Minas Gerais na cidade de Luz. Eu apesar de católico, resolvi fundar naquela cidade um Centro Espírita. ---- Por ser a cidade sede de um bispado, o povo da cidade tinha esse desejo, mas não tinha a coragem por receio da resistência  dos padres.  

 Eu entendo o espiritismo como religião, ciência e filosofia. --- A minha profissão me imponha contato com todos os seguimentos da sociedade, portanto eu tinha como clientes, adeptos e pastores de todas as religiões, o que me levou a respeitar todas as religiões. Isso porque toda visita que fazia a uma igreja diferente, lá estava Jesus Cristo, e eu como cristão entendi por ser um católico na minha essência, sem impedimento para me considerar um ecumênico.

 Eu passava por um momento muito difícil de minha vida, e teria encontrado no espiritismo uma fonte de conforto para a minha sobrevivência. Assim estudei profundamente o Kardecismo e resolvi fundar um centro espírita na cidade de Luz, o qual está lá até hoje e funcionando dentro de suas normas rígidas, prestando um excelente serviço as pessoas carentes dentro do sentido humano. Trata-se da Confraria Espírita Allan Kardec, hoje com sede própria e seu espaço ampliado.

 O Espiritismo exerce uma religião sem culto externo, sem sacerdócio organizado, sem cerimônias de qualquer natureza, sem intermediários entre a criatura e o Criador, podendo ser considerada como uma religião cósmica

 Neste mesmo tempo eu era também, envolvido com o rádio amador e sua história. Eu tinha a minha aparelhagem, o meu prefixo e conversava com os chamados amigos macanudos, a quem envio aqui agora um 73 bem apertado. Pois já teria decorado as gírias do radioamadorismo.

 Na cidade de Luz havia um radio técnico bastante entendido em radio transmissor. E  ele que me acudia nos problemas que apareciam na minha estação. E com isso firmou entre nós uma grande amizade. Mas o tempo, como já disse, tratou-se de fragilizar o radioamadorismo, além dos problemas que isso causava aos vizinhos, pois as conversas entravam nos rádios e televisões da vizinhança, e quase entrava também nos fogões, pois o sinal era bem forte, pois conseguia-se comunicar até no exterior.

 Posteriormente fui transferido da cidade de Luz, e num determinado dia fiquei sabendo que o meu grande amigo Zé do Heitor teria falecido, já há mais de um mês. Fiquei deverás triste com essa notícia, e na minha primeira ida a Luz, na chegada da noite, corri até a casa do meu amigo, para dar os pêsames a sua esposa e lamentar a sua morte. A casa dele fica próximo do cemitério. Cheguei bati na porta e ouvi lá de dentro já vou... Espera um pouco... Aquela voz parecia ser a dele, do meu amigo. Demorou um pouco e nada, bati de novo e a voz torna a responder já vou espera um pouco...  Apesar de ser médio lá no centro, comecei a imaginar que o Zé estava se comunicando comigo. E estava tão envolvido com a doutrina que já comecei a conversar com ele lá de fora como se ele fosse um espírito.

 Demorou algum tempo, ele veio e abriu a porta e eu assustado, parecia que o meu cabelo havia crescido até aos pés. E lhe disse? Uai Zé você não morreu? Ele deu aquele seu sorriso sorrateiro e como sempre engraçado disse:

 “Murri, mais São Pedro me mandou ir para o inferno, o capeta não me aceitou lá e me mandou de vorta aqui pra terra” Ceis vai tê qui me aguentá mais muncado”.

Cê discurpa a demora é que eu tava dando uma cagadinha.

Ai então fiquei tranquilo. Afinal, espírito não caga.

 Armando Melo de Castro

terça-feira, 1 de novembro de 2022

CANDEIAS, E MINHAS LEMBRANÇAS.

O mais antigo hotel de que temos notícia em Candeias é o Hotel do Bitu. --- Esse hotel foi então vendido para a Sra. Geny Resende, esposa do Sr. Manoel Alves, delegado de Polícia. --- O hotel foi remodelado, tinha uma placa luminosa com os dizeres: NOVO HOTEL, de Geny Resende. --- Ele durou muitos anos. Com a morte da Sra. Geny, o hotel continuou administrado pelo marido, Manoel Alves, que posteriormente veio a se casar com a Sra. Vilça Freire. ---

Com a morte do Sr. Manoel, o hotel foi adquirido por uma de suas hospedes antigas que fazia do hotel a sua morada, a Sra. Nely Furtado que dali se transferiu para a sua nova hospedaria próximo da Igreja do Senhor Bom Jesus. --- O local onde era instalado o antigo NOVO HOTEL, foi demolido e ali hoje se encontra a CASA MODERNA MÓVEIS, e na antiga Residência do Sr. Manoel Alves, hoje se encontra a LOJA ZEMA.

Esse local onde se encontrava o antigo Novo Hotel me traz guardado o maior susto que levei em toda a minha juventude quando eu contava 24 anos de idade, no ano de 1970. Eu já residia na cidade de São Paulo, desde 1965. E trabalhava em três empregos. Das 7 da manhã até as 10,30 hs. Com um velho português, que liquidava uma imobiliária. O meu trabalho era de datilógrafo. – Das 12 até as 6 hs eu era continuo do Banco Mineiro da Produção, (posteriormente Bemge onde me aposentei) e das 19 até as 22, de faxineiro, numa Agência do Banco de Crédito Real de Minas Gerais, onde o meu amigo Titoco era contínuo e arrumou para mim esse emprego de faxineiro. ---- Toda essa luta tinha um objetivo, de realizar um sonho. Comprar um carro e consegui. Comprei um carro com 9 anos de uso da marca Simca Chambord, ano 1961.

Viria agora o primeiro problema. Eu não tinha carteira de motorista. Mas não tinha, juízo também. Pois rodava dentro da capital paulista para todo lado naquele carro e sem carteira. Certa vez, naquele espaço frente ao Campo do Pacaembu, tarde da noite, o carro deu um problema, e eu e mais três colegas ali, pelejando para fazer o carro pegar e não pegava, chega a polícia Civil. A sorte é que o Elias filho da Dona Floripes, ele era tenente da Policia de São Paulo, estava junto e conversou com os homens, liberando-lhes a vasculhar o carro para ver se havia alguma coisa de errado, sendo que eles não pediram documentos e ainda nos ajudou a fazer o carro pegar. Foi um aperto aliviado. Coisa de jovens.

Eu imagino que nem Ayrton Senna, nem Emerson Fitipaldi, nem Nelson Piquet puderam ser tão felizes, dirigindo um carro da formula 1, como eu com a minha velha Simca Chambord 61. Quando eu vinha a Candeias, a Fernão Dias, de uma pista só, cheia de buracos e curvas, para mim era como um tapete vermelho. Eu nunca viajava sozinho, sempre vinha comigo um amigo que participava do custo da gasolina. Afinal, o carro bebia bastante e a viagem era longa. --- Eu não tinha carteira até então – Mas na saída eu pedia ao meu Santo Antônio uma ajuda espiritual e nunca me foi negada. Hoje eu vejo que os colegas que viajavam comigo eram mais aventureiros do que eu.

Meu pai me deu uma bronca por não ter carteira e dando direito aos guardas de prenderem o carro e surgir uma série de problemas. Dai eu passei a deixar o carro em Candeias e viajar de ônibus. Mas quando eu chegava a Candeias, eu rodava Cristais, Campo Belo, Camacho Itapecerica e Formiga. O João Cambota teria me dado umas aulas. Dizia que ao ver um guarda, desse uma paradinha e pedisse uma informação e acendesse um cigarro. E parece que isso dava certo, porque nem ele e nem eu, jamais fomos abordados. Mas posteriormente tirei a carteira no bairro do Cambuci em São Paulo no dia 10 de maio de 1971.

Certo dia, eu descia a Avenida 17 de dezembro, em Candeias todo metido, todo gostosão, parecendo ser o Ayrton Senna de Candeias, quando vou passando frente ao NOVO HOTEL, o Sr. Manoel Alves, que tinha os óculos fundo de garrafa, havia comprado um fusquinha, zerinho, vermelho, e estava ainda até com aqueles sinais de novo nas poltronas, Ele não tinha carteira, não sabia dirigir direito além de ter problema de vista. O carro dele que estava de frente para o Alto do Cruzeiro, ele entra no carro dá uma guinada de 90º e atravessa de cheio à minha frente. A frente do meu carro toda amassada e o dele, zerinho, com a porta do motorista toda amassada e a coluna entortada. --- Naquele momento eu pensei que havia lhe matado. Mas felizmente ele saiu lá de dentro cambaleando, assustando, mas inteiro.

Final da história. Ele estava completamente errado. Mas era o delegado, foi feita uma perícia e nomeado o então sub delegado Geraldo da Vargem e os peritos dois motoristas profissionais: Raimundo do Antero e Henrique Pinheiro. --- A sentença do Juiz não me favoreceu. Pois alegara que não teria havido vítimas, então que cada um consertasse o seu. ---- Eu continuei a rodar no meu, mesmo com a frente amassada, até que achei um comprador para quem o vendi a suaves prestações, pela metade do preço. --- Quanto ao Manoel eu nunca mais o vi dirigindo um carro. ---- Mas o que foi bom, é que não ficamos inimigos, fomos sempre bons amigos.

Comecei tudo de novo. E comprei o meu segundo carro, um chevrolet 51 igual ao do Monsenhor Castro. Era 10 anos mais velho do que a minha velha Simca, que eu amava tanto.

É tão bom ser jovem. É tão bom lembrar até dos transtornos da vida em Candeias, minha terra querida.

Armando Melo de Castro