Total de visualizações de página

domingo, 18 de julho de 2021

CANDEIAS, E UMA SAUDADE.


Nesta época os dias são tão pequenos. Seis horas da tarde estamos no escuro. Agora, no principio do mês de julho, quando deixamos mais um junho para trás. O mês das festas juninas, dos grandes eventos, com as exposições agropecuárias estão a todo vapor, prometendo shows com artistas famosos e outras coisas mais. Completamos, portanto dois “junhos” sem festa junina, sem exposição. iSSO QUER DIZER Isso quer dizer que estamos mais pobres. Pobreza não é simplesmente a falta de dinheiro. Pobreza é falta de lazer, falta de falta de liberdade. Mas numa pandemia, quando ficamos reféns de um vírus, que não sabemos quando nos livraremos dele, isso é um sinônimo de uma grande pobreza em todos os sentidos.

 A infância é um trecho da viagem cuja estrada não há buracos e nem tropeços. Ela é alegria e sem dramas. Mas se pinta uma pandemia, consequentemente esta contamina a infância. --- A inocência e isenção de maldade é um lugar de onde viemos e que não voltamos jamais. É algo que fica guardado dentro de nós como um livro de história gostoso de ler. No entanto as crianças estão guardando para o resto da vida, nos armários de suas memórias, esse tempo que será lembrado assim com muita tristeza, pela perda de de mãe, pai, avós, irmãos etc.

O tempo passa e por vezes nos perdemos nessas encruzilhadas da vida. O presente, o futuro e o passado. Aí dá vontade de voltar... Mas como não tem volta ficamos na busca, como se procurássemos aquilo que não perdemos.Hoje me despertei ainda com o escuro. Como disse, os dias são pequenos nessa época do ano . Parece até que o dia voa. E que esse tempo de pandemia está correndo mais. Acordar com o escuro inspira-me ficar pensando. Isso me faz lembrar o meu amigo Zé Mori, porteiro da Escola Presidente Kenedy, quando ele dizia que colocava uma garrafa de café na cabeceira da cama, acordava as 4,30 horas da manhã, tomava um gole de café acendia um cigarro e ficava ali pensando, afinal levantar-se para fazer o quê?. Do jeito que o Zé Mori contava dava vontade de acordar as 4,30 e imita-lo 

Hoje aconteceu isso comigo, só que eu não tinha café e nem cigarros, porque fumei durante 40 anos mas felizmente deixei o vício há mais de 20. E se eu tenho um conselho para quem fuma, é deixar disso. A saúde melhora muito para quem deixa de fumar.

Mas numa emulação ao meu antigo amigo Zé Mori, eu resolvi acordar, fui até a cozinha e tomei um gole de café frio e amanhecido, voltei para a cama e fiquei pensando. E pensando resolvi dar uma voltinha na minha terrinha, na minha Candeias querida. E o frio estava tão bravo que resolvi ir passear na década de 50, lá em Candeias na praça defronte a Igreja do Senhor Bom Jesus

Ali todo mês de junho aconteciam as comemorações de São João. --- E sempre quem organizava era o Lico do Matadouro, para outros o Lico da Sinhana. Alguém trazia um bom tanto de lenha num caminhão, e lico fazia a grande fogueira. Bem alta com toras de paus que dariam para queimar até o dia posterior. A fogueira ainda fomegava no outro dia. ---- No centro dessa fogueira eram colocados gomos de bambus cheios de água e lacrados. E aquilo dava cada estouro muito violento.

Às vezes aparecia por ali uma dupla de cantores sertanejos que ficavam de fora de uma barraca montada próxima ao chafariz, existente ali até hoje, claro, inoperante. ---- A barraca preparava um quentão distribuído gratuitamente para os adultos, um quentãozinho, sem pinga para os meninos não aguar como diziam

Eu tinha a impressão que a nação candeense parava ali naquele local para esta festa. Naquele tempo as pessoas se locomoviam muito pouco, principalmente as mulheres donas de casa. Se viam nas missas às vezes, mas nem sempre. E também não podiam conversar se viam nas igrejas ou na semana santa, mas nem sempre paravam para bater um papo. Mas nas comemorações juninas, era um verdadeiro encontro de amigos do alto do cruzeiro, da laje ou da região da ponte. Eram os três pontos fortes da nossa cidade.

Quem preparava a fogueira e o pau de cebo era o Lico do Matadouro. O pau de cebo consistia numa longa vara de eucalipto, previamente preparada pelo Lico. Ela não era seca e nem verde. Dias antes, a gente passava por ali e estava o lico uma hora descascando-a outra ora já lixando-a. Essa vara era fincada à alguns metros da fogueira. E na sua ponta havia um envelope com a maior cédula do momento. Hoje seria uma cédula de $100,00 reais. E a meninada ficava muito doida para ganhar esse dinheiro, que naturalmente seria um bom dinheiro.

Mas só que o pau era lubrificado com cebo ou óleo queimado. E os meninos se vestiam das suas roupas velhas, que naturalmente ficariam perdidas, para concorrer ao evento. Os mais espertos subiram mais, e logo derrapavam indo parar até o pé do pau. Eles faziam escada. Um subia no ombro do outro, E à medida que fosse limpando o cebo eles iam atingindo o topo . E no final, aquele que pegava o envelope saia correndo e a turma atrás dele querendo parte do dinheiro. ---- Lembro-me de um vencedor --- meu conterrâneo, contemporâneo, e condiscípulo no Grupo Escolar Padre Américo. “O MOSQUITO” (Antônio Canarinho) Eu nunca participei desses eventos. Afinal eu era um menino bobo, e gostava só de olhar e torce

Naquela mesma noite havia outros bailes na cidade. Na antiga fábrica de Farinha do Sebastião da Pecidonha, na esquina de frente o Posto do Itamar. O pagode era animado pelo Sebastião com um tambor e a sua filha Toninha, casada com o Paulo Gomide, cantando e tocando o acordeom. Ali se misturavam músicas de São João, carnaval, sertanejo, boleros e muita pinga. O local tomou o apelido de “Caldeirão do Diabo”.

Na máquina de Café do Emídio Alves, era o pagode do Chiquinho Ferreira, irmão do Alvino Ferreira, animado pelo seu genro Amarlene, um sanfoneiro de primeira e ele num tambor e a sua filha cantando. O repertório era sempre o mesmo, músicas sertanejas, boleros, carnaval, São João. Nos bailes de carnaval, quando o salão ficava meio fraco, Chiquinho dizia para a sua filha, Solta a jardineira minha filha (Música de carnaval) Aí a coisa fervia.

No Clube Recreativo Candeense durante todo o mês havia quadrilha todas as noites, animadas pelos Srs. Geraldo Vilela e Alvino Ferreira.

Quando faltava luz na cidade por problemas técnicos na usina hidroelétrica do Sr. Bonaccorsi, o povo ia para as portas das ruas e os vizinhos interagiam-se nos mais diversos assuntos.

A cidade não era tão deserta como nos dias atuais. O povo saia mais; convivia mais; visitava mais, e era mais solidário porque não existia a televisão. Infelizmente as novelas prendem as pessoas em silêncio a conviver com os dramas criados na cabeça de uma só pessoa, que seja o autor de uma novela nem sempre benéfica.

Eu gosto do mundo de hoje. Sem dúvida temos mais conforto, temos mais dinheiro, temos mais recursos. Mas eu sinto que o povo antigo, era mais tranquilo, era mais amigo, era mais sincero. Desculpe-me meus amigos. Eu falo por mim. Posso estar enganado. Afinal sou de gerações ultrapassadas.

Armando Melo de Castr

Foto Clara Borges.


 

Nenhum comentário: