Defronto-me
com um calendário de parede, ou seja, um prospecto comercial da Pharma Vita, a drogaria
situada na Rua Coronel João Afonso Lamounier, 481A. ------ Diante disso, dou
uma olhadinha no retrovisor da minha vida e bem lá do início desta estrada vejo
a Rua Coronel João Afonso, antiga rua da ponte, da década de 40 de quando eu
nasci em 1946.
Minha
chegada ao mundo se deu bem ali no número 306, onde hoje reside o Sr. Milton
Alves. ----- Meu Deus! Que saudade! Em cada número desta rua eu teria algo para
contar, mas recordarei aqui apenas os números 481, que entendo ser a antiga
casa de Dona Filomena Barros e 481A, onde residia sua filha Quinha, numa
pequena casa edificada por detrás de um muro alto, com um portão de entrada,
cuja área, creio, era o quintal de Dona Filomena.
Não
tenho certeza de quantos filhos Dona Filomena Barros tinha, mas lembro-me
perfeitamente de quatro mulheres: Guiomar, Muca, Sota e Quinha. ----Guiomar era
casada com Sílvio Barbeiro e residia no Rio de Janeiro. ---- Sota era casada
com Majó --- Muca era minha madrinha e era solteirona------- Quinha era casada
com Dedé do Alonso e tinham quatro filhos meus contemporâneos: Toinzinho,
Márcio, Armando e Rosângela. Aliás, eu imagino que o meu nome tenha sido
inspirado através do meu xará Armando, grande amigo meu.
Percorrendo
os labirintos da minha memória, vejo madrinha Muca moribunda numa cama pouco
antes de morrer numa visita em que lhe pedi a bênção. É a única lembrança que
tenho dessa minha madrinha, falecida quando me encontrava ainda no verdor dos
anos.
Dona Quinha, cozinhando num fogão de lenha toldado de fumaça, enquanto o Xará aguardava uma trempe para fazer a goma de polvilho a fim de colar o papagaio que estávamos fazendo ali no terreiro. Os filhos de Dona Quinha faziam o melhor papagaio (Pipa) chupão, ou seja, aqueles que não utilizavam rabo e que empinavam com facilidade. E toda a meninada queria aprender com eles.
Dona
Filomena e suas filhas estão juntas nos céus, inclusive alguns netos. Eu tenho
saudade de passar na porta de Dona Filomena e vê-la tecendo alguma coisa e
observando os passantes, por cima dos óculos. Esteja com Deus Dona Filomena,
juntamente com as suas filhas e netos. Onde quer que estejam, receba o meu
abraço saudoso e em especial à minha madrinha Muca e ao meu amigo Armando.
Entre a
porta da casa de Dona Filomena e a garagem do Sr. Raimundo Bernardino de Sena, (O
Raimundo do Mariano) então prefeito da cidade, havia uma árvore. E por
ocasião do mandato do Sr. Raimundo, essa árvore localizada no limite da rua,
foi podada, transportada e transplantada para alguns metros defronte a então
residência do Sr. Emídio Alves, hoje o Velório da Funerária N.S. das Candeias.
Esta
transplantação de uma árvore adulta – lembra-me bem - causou um grande boato
entre os curiosos que chegavam a dizer que o prefeito não estaria bom da
cabeça. Mesmo porque, foi ele mesmo quem dirigiu a ação, afirmando que em breve
a árvore estaria brotada. E para vexame da maioria, a árvore lá está até hoje
depois de mais de cinquenta anos.
Quando
busco nas minhas memórias um dia de aperto... Um dia de susto... Um dia que a
viagem da minha vida poderia ter sido interrompida, eu me lembro do dia 1º de
janeiro de 1958 quando eu estava prestes a completar doze anos de vida. Bem de
frente de onde está situado o número 481 A, havia então, uma caixa de registro
da rede de fornecimento de água da Prefeitura. Nesta época eram comuns essas
pequenas caixas com registros, a fim de equilibrar o fornecimento. Cada rua
tinha o seu registro e um determinado tempo para provisão. A rua não tinha
calçamento e nem passeios, portanto andávamos pelo meio da rua. Eu gostava de
passar por aquela caixa e dar um pulo sobre a sua tampa num gesto de menino
travesso.
Eram
sete horas da noite e eu voltava para a minha casa após ter assistido a bênção
do santíssimo, celebrada aos domingos pelo Padre Joaquim. Naquele tempo não
havia missas vespertinas. - Ao sair da Igreja Matriz, deu-se início a uma
grande tempestade. E ao descer a Rua Coronel João Afonso, eu não fiz como de
costume, caminhar pelo meio da rua, fui um trilho ao lado do muro. Bem no rumo da referida caixa, a dez metros de
mim, caiu um raio deixando-me em total desespero diante daquele cheiro forte de
pólvora queimada...
Cheguei
a minha casa totalmente atordoado, causando grande susto aos meus pais. No
outro dia verificava-se que o raio havia arrancado a caixa de cimento de sua
instalação deixando-a com a parte inferior virada para cima. Aos 74 anos de
idade toda vez em que vejo uma tempestade busco nas minhas convicções o fato de
que ninguém morre fora de sua hora...
Mas,
voltando ao prospecto da PHARMA
VITA, penso aqui agora: Eu nunca imaginei que na minha rua fosse
ter, um dia, uma farmácia... Teria sido muita falta de humildade pensar uma
coisa dessas naquele tempo... Portanto, isso me faz sentir feliz... Parabéns
farmacêutica, Srta. Maria Amélia fundadora da Pharma Vita, por ter escolhido a
minha rua, que já não é tão minha, para fincar o seu estabelecimento promotor
de saúde... Ai nesse ponto, da minha tão querida Candeias, no alvorecer da
minha vida, eu vi cair um raio próximo de mim, mas também, vi subir uma pipa
diante dos meus olhos brilhantes... Vi uma árvore adulta renascer cheia de
viço... E vi a morte levando a minha madrinha... Só não vi a tristeza porque eu
não a conhecia e o meu coração era só a alegria de um novato da vida.
Armando
Melo de Castro
Candeias
MG Casos e Acasos
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