A
meu ver, nem tudo vem piorando e sim melhorando e muito. Ora, as pessoas que vivem há mais de cinquenta anos e
dizem essas baboseiras, com certeza, possuem uma visão estreita. Isso porque
podemos ver, a olho nu, que o mundo de hoje é muito melhor, é mais civilizado e
mais adiantado em todos os sentidos.
Dizer
que a vida, antigamente, era melhor; que o povo era mais isso ou mais aquilo é
querer cobrir o corpo com a língua. É verdade que, nos dias de hoje, a droga
vem prejudicando a vida, mas antes a vida era a própria droga. As pessoas
andavam com roupas remendadas, quase não havia aposentadorias, trabalhava-se de
sol a sol e não tinha remuneração para tanto. Morria-se com doenças terríveis
como sarampo, varicela, caxumba, gripe espanhola, gripe asiática. Dar a luz a
um filho era o maior risco de vida; não se falava em cesariana e o parto era
uma questão de vida e morte. Um parto complicado acabava com a morte do filho
ou da mãe. Isso sem falar nas doenças desconhecidas.
Não
havia um diagnóstico como nos dias atuais e, também, não havia assistência
social nenhuma. A miséria ardia aos olhos dos pobres. Faltava emprego, faltavam
escolas, faltava luz elétrica sem falar em segurança, telefone, televisão,
rádio. A lamparina, o banho de bacia, o pilão, as roupas remendadas, ainda
faziam parte do nosso dia-a-dia Enfim, vivíamos num mundo pobre. Mais do que
pobre, era miserável. Um mundo de cão. Hoje, não. Hoje, não chegamos a um
patamar satisfatório, todavia, melhorou muito. Antes rico era rico e pobre era
pobre. À bem da verdade, antes, nem os ricos viviam a vida dos pobres de
hoje.
Há
dias, estive conversando com uma senhora que me veio com esse discurso e eu
fiquei só ouvindo. Dizia-se escandalizada com a vida dos dias atuais,
principalmente, com a pouca vergonha das pessoas, especialmente, das mulheres.
Diante do exposto, tentei lhe mostrar que estava um tanto enganada com relação
ao mundo antigo e o mundo moderno. Entretanto, como dizia Jesus Cristo: “O
pior cego é aquele que não quer enxergar”.
É fácil
analisar: Antes as pessoas faziam as coisas às escondidas e, atualmente, fazem
à vista de todo mundo. Hoje um jovem transa com a vizinha e não está nem aí
pelo que dizem. Um casal se casa e, se não deu certo, já parte para outra. Eu
acho que o povo de hoje é muito mais prático. Não estão preocupados com os
patrulheiros do alheio. Isso é uma questão cultural. É o conflito de gerações,
natural na obra da criação de Deus. Sem esse conflito a vida para e não há
progresso. E ainda tem mais: Todo mundo quer ser livre, quer ter liberdade; e a
sociedade vive gritando a liberdade para todos e a libertinagem está na cabeça
de cada um. Conclui-se que o melhor é acostumar-se com isso e deixar de
criticar o comportamento dos outros.
Em
época remota, tinha o tal do compadre estar andando com a comadre e isso
fervilhava a língua do povo. A “pouca vergonha” acontecia muito em
família. Sogro com a nora. Cunhado com
cunhada. Padrinho com a afilhada e muito mais.
Certa
vez, quase saiu morte aqui em Candeias por causa de um sogro que estava
passarinhando, em grande volúpia, a sua digníssima nora, distinta esposa do seu
filho e grande mãe do seu neto. Sogro e nora foram encontrados flutuando na
própria cama do filho que viajava e voltou de repente. Isso aí deu pano pra
manga. Deu água pra barba. Deu chulé no pé da cama e, por pouco, não deu um
parricídio.
O mais
engraçado é que as pessoas envolvidas pensam que ninguém está vendo. Vão se
acostumando de tal forma com a coisa que passam a ficar desprovidos de
cuidados. Enquanto isso, os patrulheiros vão esparramando a notícia e os
curiosos querem ver aquilo que, antigamente, era chamado de pouca vergonha, e,
hoje, vai perdendo a conotação com esse nome. Nos dias atuais, todo mundo tem
vergonha de ser vergonhoso. O negócio hoje é se mostrar. Bobo é quem entra
nesses assuntos. A conclusão é que cada um viva a sua vida porque quem fala
muito pode estar se assentando no próprio rabo.
Bem de
frente a minha antiga morada, na Rua Coronel João Afonso, existia uma velha
casa abandonada, onde hoje está a residência do José Geraldo Eustáquio. Ali,
teria sido a morada de uma senhora bastante idosa e que vivia sozinha. Pessoa
simplória que tratava dos ratos e das baratas a quem ela os tinha como
companhias. Essa senhora se chamava Maria do Fortunato. A coitada passou os
seus últimos dias de vida na miséria sobre os cuidados da vizinhança. O quintal
da sua casa era cheio de árvores frutíferas e mato. Os meninos moradores da rua
viviam vasculhando os pés de amora, pitanga, laranja e limão da china. Nos
fundos, havia uma grande moita de bananeira e, como o acesso para seu quintal
era aberto, a meninada transitava, por ali, na maior tranquilidade.
Os
cachos de bananas sumiam misteriosamente. Não se via quem os colhiam porque
essa subtração era feita sempre à noite. A rua era quase escura e a luz que
iluminava a cidade era muito fraca. Ainda não existia aqui em Candeias a Cemig.
Era a Empresa de Força e Luz Candeense, de propriedade do Sr. Celestino
Bonaccorsi. Essa penumbra poderia favorecer a entrada no quintal da velha casa
sem ser visto nitidamente.
Meu
primo Vicente, que contava uns doze anos de idade, se destacava entre a turma
que vasculhava o quintal da velha. Teria ele encontrado um cacho de bananas
amoitado que, com certeza, seria retirado, posteriormente, pelo autor do corte.
Nessa condição, Vicente aguardou o silêncio da noite chegar para fazer aquilo
que dá ao cristão, cem anos de perdão, ou seja, roubar um ladrão. Nessa
expectativa, ficou o tempo todo aguardando a hora de cumprir a sua intenção.
Tão
logo se viu dentro das condições para tal, atravessou a rua, adentrou o quintal
da tapera e foi direto até a moita de bananeira para subtrair o belo cacho da
fruta tão apreciada. Foi quando levou um susto danado. Voltou correndo para
casa e contou para o seu pai que o espírito de Dona Maria estava gemendo na
moita de bananas.
Mas, o meu tio, supondo que poderia ser algum
casal clandestino, não quis ir lá comprovar de que se tratava o barulho.
Contudo, foi tomado por uma grande curiosidade no que lhe fez ficar de olho no
buraco da janela. Nessas alturas do campeonato, todo mundo já procurava um
buraco entre as janelas da frente da casa que eram duas. Era uma grande expectativa.
Quem seria? Essa era a pergunta que todos formulavam e aguardavam a resposta.
Depois
de algum tempo, viram sair primeiro a mulher. Foi uma surpresa total. Aliás,
foi mais um susto do que surpresa quando reconheceram a nossa vizinha. Esposa
de um grande amigo nosso. Aliás, amigos de todos da rua. Uma esposa muito
dedicada ao marido e à sua ninhada de filhos em número de seis. Uma mulher sem
atrativos; magra, nariz vermelho, olhos avermelhados, um fio de sobrancelhas,
nádegas minguadas, seios tipo maracujá no ponto, rosto miúdo, dentes
amarelados. As pernas eram finas, feito cabra. Sempre se trajando com um
vestido modelado num só corte de fazenda barata. Enfim, só seria desejável por
algum tarado porque o perfil da adúltera não poderia proporcionar um prazer que
pudesse levar o nome de sexual. Seu marido, coitado! Gordinho, barrigudinho,
baixinho, fraquinho, agora “chifrudão” e um pintinho dormindo em cima dos
ovos.
Todos
estavam aguardando, ansiosos, pela “cara do cara.” Quando ele aparece, olhando
para baixo e para cima, sem saber que estava sendo observado da casa defronte
através dos buracos das janelas. Era dom Juan ou, talvez, o Rodolph Valentino
numa imagem diferente: magro, alto, negro, braços fortes e pés grandes, talvez
de tamanho 44 pra cima.
Depois
desse dia, o meu tio, que tinha uma língua desassossegada, contava até o tempo
em que os dois ficavam na moita trocando banana por maçã, como se fossem Adão e
Eva no paraíso da bananeira. Sem deixar também de comentar sobre o tamanho dos
pés do Dom Juan, calculando, com isso, a dimensão do seu inhame.
Pois ai
está, meus amigos, antigamente uma mulher safada era chamada de “puta de
bananeira” Tem quem pensa que os vizinhos, as comadres e compadres antigos eram
mais sérios; pois as bananeiras e os lençóis de seda que o diga.
Armando
Melo de Castro
Candeias
MG Casos e Acasos
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