Eu acho que apesar de ter sido um
menino pobre nunca tive formado na minha alma um sentimento insensível de
revolta, uma queixa amarga e silenciosa, contra as desigualdades estabelecidas
pela vida. Isso porque havia dentro de mim, graças ao bom Deus, um espírito
sempre me orientando a manter um contato do meu coração com a realidade da
vida.
As mudanças comportamentais na
minha adolescência não me marcaram negativamente, portanto eu posso me
considerar ter sido um bom filho, não apenas por ouvir os meus pais dizerem
isso, mas pelo que reflete a minha própria consciência.
Como eu sempre digo, eu fui um
menino bobo, muito bobo. Daqueles que se escondia quando ouvia uma batida na
porta. Mas não gostava de ser assim. Eu tinha vontade de arrancar de dentro de
mim aquela parte idiota e tola, aquela timidez que tirava o lustre da minha
vergonha.
Sou o filho mais velho de uma
ninhada de seis irmãos. Sai de Candeias ainda muito jovem, mas Candeias não
saiu de mim até hoje. Fui orientado por meus pais a amar tudo que Deus me deu. E já que me foi dado o direito de dizer que
Candeias é a minha terra, eu sempre fermentei dentro do meu coração esse
sentimento de bairrismo, de amor, mesmo não tendo sido agraciado com a sorte de
poder viver o tempo todo debaixo de suas nuvens, ou sob o brilho do seu sol, eu
venho sempre à busca desse lenitivo que felicita a minha existência.
Ausente de Candeias eu reviro
as gavetas da minha memória. E aqui estando, eu revivo a minha infância pobre;
as minhas tolices descartadas, bebendo da minha primeira água, vendo a minha
pia batismal e os meus santos com os quais fui orientado na fé.
Hoje de manhã, estando fora de
Candeias, depois de deliciar-me com um belo pedaço de bolo de fubá, feito por minha mulher, dentro dos conceitos da boa culinária, busquei encontrar bem nos
fundos de uma das gavetas do armário da minha memória, a receita de um bolo de
fubá que eu fazia, quando tinha por volta dos meus dez ou doze anos de idade.
A receita era simples, mas o bolo era gostoso para quem não tinha problemas
com azia estomacal ou não conhecesse outras receitas; principalmente para quem não possuía os ingredientes suficientes para uma iguaria melhor, esse bolo não era bem uma delicia, mas deixava quem o comesse em paz com a fome.
03 canecadas de fubá --- 02 canecas
de açúcar. ---01 colher de gordura de
porco. --- 01 copo de leite. Água para inteirar. 01 ovo, ou 02 no máximo. --- 01
colher de sopa de bicabornato. --- Um cavaquinho de canela e uma colher de açúcar
socados até ficar bem fino.--- Uma caçarola de ferro,--- um pedaço de lata tipo a
tampa da panela e brasas.
Ajuntava todos esses ingredientes
numa gamela de madeira, e mexia até soltar bolhas; depois passava um pouquinho
de gordura no fundo da panela (não existia óleo e nem margarina e manteiga de
leite era muito caro) colocava na panela e levava ao fogão de lenha. A panela
era tampada com a lata tipo uma tampa cheia de brasas. Depois de assado, jogava
por cima a canela e o açúcar socado e esperava esfriar para saborear. O pior
era a demora em esfriar e a gente ficar esperando.
Enquanto existiam os fogões a
lenha eu fiz esse engasga gato, que eu e meus irmãos comíamos como se fosse o
manjar dos deuses. Hoje, a gente come coisas que nem se compara, mas para quem
a pobreza era uma coisa natural não existia coisa melhor.
Certa vez eu de posse de uma
revista vi diversas receitas. E dai fiquei procurando uma que fosse a
mais barata. E ao encontrar uma, corri para a minha mãe a mostra-la, quando ela sorrindo me disse:
"Isso é angu meu filho"!
Caímos na
risada! Era a receita de polenta e eu pensei que polenta era bolo.
Ser pobre não é ruim. O ruim é
não aceitar a pobreza e chorar por ela.
Armando Melo de Castro.
Candeias MG Casos e Acasos
Anônimo deixou um novo comentário sobre a sua postagem "RETALHOS DA MINHA INFÂNCIA!":
Fuba suado, café adoçado com rapadura, fruta do lobo, arroz canjiquinha e manteiga caracu foi meu cardapio
pé cascudo.
Bruno Gomide
E eramos felizes
Era de muita gente Bruno. Eu tenho ainda nos meus hábitos, a rapadura e a canjiquinha de arroz com couve rasgada. A canjiquinha eu encontro no mercado municipal e está custando mais cara do que o arroz de primeira. Acontece que as máquinas modernas não quebram o arroz, e para vender a canjiquinha eles o quebra. Grande abraço.
Anônimo deixou um novo comentário sobre a sua postagem "RETALHOS DA MINHA INFÂNCIA!":
Fuba suado, café adoçado com rapadura, fruta do lobo, arroz canjiquinha e manteiga caracu foi meu cardapio
pé cascudo.
Bruno Gomide
E eramos felizes
Era de muita gente Bruno. Eu tenho ainda nos meus hábitos, a rapadura e a canjiquinha de arroz com couve rasgada. A canjiquinha eu encontro no mercado municipal e está custando mais cara do que o arroz de primeira. Acontece que as máquinas modernas não quebram o arroz, e para vender a canjiquinha eles o quebra. Grande abraço.
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