Na década de 50, por volta do ano
de 1955, Candeias era um município que trazia ainda consigo os traços do
distrito que teria pertencido à cidade de Campo Belo, até o ano 1938. O
comércio era praticamente o mesmo. As novas construções eram raras. A Empresa
Força e Luz Candeense, de propriedade do Sr. Celestino Bonaccorsi, já não
atendia a demanda. Afinal teria sido fundada na década de 30 e nenhum
investimento teria sido feito. Já estava àquela empresa caminhando para o
sucateamento.
A Cemig teria sido fundada em
1952, portanto, ainda “engatinhava” nas suas expansões e as preferências eram
para as grandes cidades. Até então, locais como Candeias não faziam parte do
plano de expansão da empresa.
O fornecimento de água encanada
era precário. Ainda existia em alguns pontos da cidade torneiras públicas, onde
as mulheres lavavam roupas nas ruas; e quando o fiscal João do Ibraim, da
prefeitura, vinha com os seus operários capinando as ruas e atingiam os seus
quaradores de roupas, era aquele xingatório, as mulheres ficavam bravas. Isso sem falar dos cachorros
que, às vezes, vinham e pisavam nas roupas expostas ao sol para quarar. Aquele
falatório das mulheres lavando roupas e enchendo latas naquela bica coletiva,
está bem guardado numa das gavetas dos armários da minha memória. Nas casas a
água era muito bem aproveitada até mesmo depois de serem usadas para tomar
banho. Dona Marica da Melada, por exemplo, tomava o seu banho, e vinha jogar a
água usada no seu terreiro da rua para apagar a poeira. Era verdadeiramente um
tempo de vacas magras.
Surge um prefeito, um jovem
prefeito: Dr. José Pinto de Resende, filho do ex-prefeito, Sr. João Pinto de
Miranda. Podemos dizer que existem dois tempos na vida de Candeias: antes e
depois do prefeito José Pinto de Resende. Um prefeito que deveria ser mais lembrado pelo povo de Candeias, pelo seu dinamismo, pela sua competência administrativa, pela atenção com o povo. Um homem que não se escondia em gabinete, estava sempre presente diante do povo e na cola dos deputados e governador, a fim de trazer melhoramentos para Candeias. E tem mais: o seu partido, a UDN, União Democrática Nacional, era de oposição ao governo estadual e federal, e no entanto ele conseguia benefícios para o município.
Ruas foram abertas, terraplanagens
foram feitas. Foram iniciados os calçamentos das ruas, praças e jardins foram projetados.
Era o inicio de uma nova era. Um aeroporto foi construído e servia, também, a
cidade de Campo Belo dada a sua autonomia de operações.
Um horto florestal onde mudas de
árvores eram distribuídas gratuitamente além de ensinamento aos agricultores
como cultivar um reflorestamento.
A cidade foi toda demarcada, ruas
foram alargadas e durante tempos uma grande máquina de terraplanagem veio fazer
esse tipo de serviço.
Mas, falando desse tempo lembro-me
de um fato curioso. Nessa época dada à precariedade do fornecimento de água,
muitas pessoas tinham nos seus quintais uma cisterna. E como o fornecimento da água costumava brecar, quem possuía esses poços atendia os
pedidos das pessoas.
Na casa de Dona Joana Gorda, na
minha rua, quando faltava água da rua, o que não era raro, era um entra e sai danado de gente atrás de uma
lata d’água. Ela possuía um poço que contava quase vinte metros de fundura. E
não era muito fácil puxar lá de baixo um grande balde dependurado numa corda de
bacalhau.
Com o inicio do calçamento da
cidade, apareceram muitos operários vindos de fora especializados em cortar
paralelepípedos. E entre esses operários estava o Balbino, cuja esposa era
doente e não seria apta para tirar água de um poço tão fundo. E era ele quem ia
com uma grande lata do tipo dessas de leiteiros, numa carrocinha buscar da água
de Dona Joana Gorda.
Uma das primeiras próteses feitas
pelo protético Osmar da Sota, no inicio de sua carreira na área odontológica,
ainda como prático, foi a dentadura inferior do Balbino. Balbino, que era muito
econômico teria feito a extração de dentes e a dentadura “de baixo” com o Osmar
por causa do precinho camarada, tendo em vista que Osmar estava ainda
conquistando a confiança da clientela.
Faziam apenas cinco dias que
Balbino estava se sentindo como se estivesse com uma ferradura na boca. Tirava
aquilo para dormir, para comer e mal conseguia beber. Dizia ele que não sabia
nunca que uma dentadura pudesse causar tanto incômodo. O assunto era a
dentadura ao redor do poço onde a maioria das mulheres aguardavam a sua vez
para tirar a água.
Balbino, não conseguia rir, e ao
falar havia de segurar a boca. Parece que estava sendo tomado por um cacoete,
tendo em vista a presença daquele corpo estranho em sua boca.
Chegou a sua vez de baixar o
balde. As mulheres em número de umas cinco falavam, riam e comentavam ao redor
do poço aguardando a sua vez, quando Dona Marica, a mais escrupulosa da turma,
a mais nojenta, pergunta: “Será que tem
sapo lá em baixo... Eu tenho um nojo desses bichos”? Quando uma disse: “Sapo e rã não sei não, mas perereca é os
monte”. Foi um riso total, e Balbino que puxava o balde já na boca do poço
usando as duas mãos riu e a sua dentadura pulou igual uma perereca para o fundo
do poço.
A mulherada foi saindo uma atrás
da outra e foram procurar outra fornecedora de água, bem longe do Balbino. E
nunca mais pediram água para Dona Joana.
Balbino contratou um
profissional que esgotou a cisterna de Dona Joana, recuperou a sua dentadura,
mas a água daquele poço ficou prejudicada. Maria, a filha de Dona Joana era
vista pegando água na bica comunitária e dizia que era para beber, porque era
tratada.
Armando Melo de Castro
Candeias MG Casos e Acasos.
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