Antiga Casa Celestino Bonaccorsi
A FAMÍLIA BONACCORSI EM CANDEIAS.
Prezados amigos:
Cada povo constrói a sua
história extraída de sua memória. Portanto, um povo sem memória é um povo sem
história, assim diz o filósofo. E um povo sem história, naturalmente irá
repetir os erros do passado. ---- A história de Candeias tem dois tempos
importantes: antes e depois dos
Bonaccorsi. E isso é de todo patente que
as novas gerações não poderão estar alheias a essa história. Eu suponho que os
jovens de hoje ao passarem frente ao prédio onde durante anos foi instalada a
CASA CELESTINO BONACCORSI e ver esse nome cravado na parede poderá sentir o
desejo de saber quem foi Celestino Bonaccorsi, ou então quem foi a família Bonaccorsi.
------------------------ À vista disso, eu pedi ao nosso querido amigo Armando Bonaccorsi, remanescente
da “velha guarda” da família Bonaccorsi e que escreveu um livro sobre essa
importante família para Candeias, o qual preparou esse resumo para conhecimento
das pessoas interessadas e registro na história de Candeias.
Armando Melo de Castro.
Por Armando Bonaccorsi:
O ramo da família Bonaccorsi que veio para Minas Gerais,
tem origem na Comune di Barga, região Toscana da Itália. Dos nove filhos de
Pietro Rocco Bonaccorsi e Maria Lucia Notini, cinco viveram na vila de São
Francisco de Oliveira, então distrito desta cidade; Candeias e Timboré,
vilarejo situado no município de Formiga. Todos retornaram definitivamente para
a Itália. Um deles ficou no fundo do mar!
Pietro Bonaccorsi possuía um
sítio em Latriani, muito próximo a Barga. Seus filhos eram nove: padre Rocco,
Giovanni Pietro (faleceu ainda criança), Iacopo Bernardino, Luigi, Clementina,
Seraphino, Celestino, Eletta e Pietro. Os nomes dos que viveram no Brasil foram
aportuguesados e Iacoppo Bernardino passou a ser chamado de Bernadino, Luigi de
Luiz, Seraphino de Serafim e Pietro de Pedro.
Das duas irmãs, Clementina
era a mãe de Pietro Nardi, que ficou conhecido como Pedrinho Bonaccorsi, pois
desde que chegou a Candeias nos primeiros dias de janeiro de 1930, trabalhou no
comércio com o tio na Casa Celestino Bonaccorsi até o encerramento da firma.
Eletta, casou com Antônio Pieroni em 1910 e foram para os Estados Unidos da
América, onde deixaram muitos descendentes. O padre Rocchino e as irmãs não
vieram ao Brasil.
Bernardino foi o pioneiro da
família a vir para Minas Gerais; desembarcou no porto do Rio de Janeiro no dia
28/06/1890. Chegou sozinho aos 21 anos de idade, mas aguardava-o no porto o tio
Antônio Notini, que o havia chamado para trabalhar com ele. Assim, ajudava
também a irmã e o cunhado na Itália, ainda se recuperando política e
economicamente de tempos difíceis que o povo italiano passava. Dois dias depois
rumaram para a vila de Carmo da Mata, distrito de Oliveira/MG.
Antônio Notini era
comerciante em Fornaci di Barga e proprietário de terras rurais, onde cultivava
cereais, oliveiras e uvas; extraía azeite e fazia vinho para vender. Mas a
Itália estava muito confusa, com a economia estraçalhada devido à guerra de sua
unificação, quando resolveu vender seu comércio e mudar para o Brasil. Encheu
vários baús com diversas mercadorias de sua loja, especialmente tecidos, e
embarcou em Gênova rumo ao Rio de Janeiro no ano de 1869. Nesta cidade
encontrou dificuldades para se estabelecer, por isso resolveu adentrar os
sertões de Minas Gerais com mercadorias transportadas em vários burros para
vender por onde passasse; deu certo e tornou-se mascate pelas estradas,
arraiais e cidades. Retornava à capital para repor o estoque para novas jornadas,
até se estabelecer com uma ‘venda’em Claudio/MG. Voltou a Fornaci di Barga para
se casar com Diamante Vitoi e já com duas filhas mudaram para Carmo da Mata. A
família cresceu com dez filhos. Os Notini proSperaram e foram os maiores
comerciantes do local e proprietários vários negócios e terras rurais. Os
filhos diversificaram suas atividades e tornaram-se industriais, mudando e
estabelecendo-se em Divinópolis/MG. e Petrópolis/RJ.
Dos irmãos Bonaccorsi que
vieram para o Brasil, Bernardino foi o
pioneiro a migrar para o Brasil. Com a família Notini residiu e trabalhou cerca
de quatro anos; aprendeu com as primas a falar e escrever em português; com o
tio e primos os ofícios do comércio. Preparado e ajudado por Antônio Notini,
este o encaminhou à vizinha vila de São Francisco de Oliveira em 1894; com seu
aval alugou uma ‘venda’ no Largo do Rosário, situada a uns 150 metros abaixo da
única capela da localidade.
No ano seguinte, chegaram a
São Francisco os irmãos Luiz e Serafim, constituindo-se a sociedade Bernardino
Bonaccorsi & Irmãos. Em agosto de 1896 chegou o quarto irmão, Celestino,
com 15 anos de idade. Seguindo a tradição italiana, o irmão mais velho era o
cabeça ou chefe, expressada como “il capo” e Bernardino tornou-se o líder nos
negócios.
Todos os irmãos e alguns
sobrinhos residiram em São Francisco e na mesma casa, estabelecidos com
comércio e presencialmente, de 1894 até 1937, cinco anos depois que os irmãos
Luiz e Serafim regressaram definitivamente para a Itália.
Os negócios dos irmãos
cresceram de maneira extraordinária, pois, em 1898, compraram o imóvel alugado
e situado no centro da vila; era um casarão integrado pela área residencial e
comercial. Também compraram um terreno vago numa rua abaixo com 7.800 m². de
área, que se destinava a pasto para os cavalos dos fregueses; era o
estacionamento daquela época! Passaram a ser os principais comerciantes da
localidade e recolhiam os maiores impostos junto à Prefeitura de Oliveira.
Abriram uma filial no povoado de Vieiras Bravos e tiveram uma destilaria de
cachaça.
Trabalharam com muito
empenho e privações. Saiam com tropas de burro para vender variadas mercadorias
de porta em porta pelos sertões, fazendas e arraiais vizinhos. Levavam
mantimentos para cozinhar e muitas noites dormiram debaixo de árvores e em
paióis de fazendas. Ao regressar à vila, traziam produtos rurais que pudessem
dispor para vender aos seus fregueses.
Nas “vendas’ de antigamente
havia de tudo: variados gêneros alimentícios, carne de porco e banha; tecidos e
aviamentos; bijuterias e cheiros; calçados; ferragens; ferramentas; arame
farpado; sal; querosene; cimento...etc.
Com a finalidade de
expansão, Bernardino foi para Candeias e estabeleceu seu comércio no Largo da
Matriz em 1897, cuja firma foi denominada Bernardino Bonaccorsi & Cia. No
ano seguinte comprou o imóvel de Cassiano Maximo da Cunha, pai do João
Cassiano, fabricante da famosa cachaça local; sendo: “um prédio para residência
e comércio”. Hoje é a Av. 17 de Dezembro, onde funcionou a Casa Celestino
Bonaccorsi. A área de terreno tinha mais de 6.000 m². e se estendia até a
antiga Rua dos Fernandes, também denominada Rua dos Capãos; é a atual Rua Pedro
Vieira de Azevedo.
Dez anos após a chegada ao
Brasil, Bernardino voltou à Itália pela primeira e última vez no início de junho
de 1900, junto com o irmão Luiz para se casarem. Os dois irmãos casaram com
duas irmãs, Luiz com Armida em outubro e Bernardino com Guilhermina em
dezembro. Embarcaram em Gênova para retornarem em 15 de janeiro de 1901,
acompanhados das esposas e do irmão caçula Pietro, então com 11 anos de idade.
Após alguns dias de navegação, Bernardino foi acometido de grave infecção que o
levou à morte no dia 28/01/1901, (naquela época não existia antibiótico). Seu
corpo foi lançado ao fundo do mar, 59 dias após seu casamento. Guilhermina não
se sentia bem, com enjoos constantes que atribuía ao balançar do navio.
Entretanto, dias depois se revelou a gravidez do primeiro filho.
O destino do casal era
Candeias, mas devido ao inesperado e trágico falecimento do marido, Guilhermina
acompanhou sua irmã Armida com os cunhados para São Francisco de Paula, onde
ficou morando. Nesta vila, Celestino ficou cuidando dos negócios durante as
ausências dos sócios em viagem à Itália, e Serafim em Candeias.
Com o falecimento do irmão,
Luiz tornou-se o ‘il capo’, assumindo a direção dos negócios e alterou as
denominações das sociedades para Luiz Bonaccorsi & Irmãos.
Luiz e Armida tiveram quatro
filhos nascidos e batizados em São Francisco de Paula: José, Américo, Alberto e
Mario. O casal foi várias vezes a
Fornaci di Barga, onde a esposa
permanecia longos períodos e lá nasceram os demais filhos; Alvarina, Itálo e
Mara. As duas filhas só vieram para o Brasil depois de casadas; a primeira
casou com o primo Sylvio Bonaccorsi e tiveram
oito filhos; Mara casou com Nicolò Umana e tiveram a filha Ana Maria.
Eles residiram em Candeias e depois mudaram para o Rio de Janeiro e Brasília.
José e Mario foram morar na Itália; Alberto foi para o Rio de Janeiro,
tornando-se comerciante e faleceu com idade avançada.
Américo, o único filho que
permaneceu em Candeias, casou com Alice Viglioni e tiveram uma vida social
muita ativa, com cinco filhos: Luizinho, Armida, Vander, Sonia e Enio. Atuou em
vários negócios comerciais, destacando-se o Hotel Candeense, sempre com grande
procura pelos viajantes e outros hóspedes devido às boas instalações e elogiada
comida. Ficou muito conhecido na região pela dedicação a arte musical e
versatilidade com a clarineta e o saxofone. Além de lider do conjunto musical
Jazz Tiro e Queda, foi maestro da Corporação Nossa Sernhora das Candeias e da
Banda Musical Santa Cecília de Campo Belo.
Os irmãos Serafim e Pedro
também casaram com duas irmãs em Barga; Serafim com Ida em 1910, e Pedro com
Marianna em 1919; após seus casamentos retornaram a São Francisco. O primeiro
casal não teve filhos, e em São Francisco nasceu a primeira filha do segundo
casal, Carolina, em 1920. No ano seguinte, Pedro com a família foram a passeio
à terra natal e ocorreu que a esposa não quis voltar; ele é que ia
visitá-los e permanecia longos períodos
na Itália, onde nasceram os filhos Francesco e Antônio, que depois de casados
vieram com as esposas para Timboré para trabalhar com o pai na sua ‘venda’,
máquinas de beneficiar arroz e café, com cultivo agr[iocola e pecuária.
Celestino cuidava dos
negócios em Candeias desde 1902, onde casou com a viúva de seu irmão em 1903.
Do casamento anterior nasceu Bernardino, o primeiro filho de Guilhermina e com
o mesmo nome do pai. O novo casal teve
mais seis filhos, Brasilina (faleceu com poucos meses); Sylvio, Maria,
Josephina (Pepina), Celestina e Julieta, que é viva e próximo de completar 105
anos de idade em dezembro.
As sociedades foram
divididas com as saídas de Luiz e Serafim que retornaram para a Itália em 1932,
ocorrendo a alteração da sociedade em Candeias para a firma Casa Celestino
Bonaccorsi Ltda., mantendo-se a filial em Timboré.
Um dos maiores feitos de
Celestino ocorreu depois de um período de 17 meses passados na terra natal com
toda a família, após o retorno em 1923, quando deu início a constituição da
Empresa Força e Luz Candeense S/A., com a necessária autorização dos orgãos
competentes para instalação da hidrelétrica. Assim como o planejamento e
ionício das construções da barragem no Rio Santana, do canal de desvio das
águas para a tubulação de ferro, da casa conjugada para os operadores da usina
e da casa das máquinas; aquisição das turbinas geradoras de energia, e
especialmente a captação de recursos para a necessária capitalização da
sociedade.
Contudo, a maioria das ações
foi por ele integralizada junto com seus familiares. Concluídas as etapas da
linha transmissora, construção da distribuidora central com transformadores de
energia contínua para energia alternada, rede elétrica com postes ade iluminação
pública e instalações domiciliares, foi inaugurado o fornecimento de energia
elétrica na Vila de Nossa Senhora das Candeias, em 26 de junho de 1926. Fato
contínuo foi que a inauguração da energia elétrica resultou em grande lucro
para ele, pois só a Casa Bonaccorsi vendia as lâmpadas e os materiais
necessários para as instalações domiciliares!
Independente da sociedade
com os irmãos, que cessou em 1937, Celestino decidiu investir por conta própria
em outras atividades rurais e industriais, com a fábrica de queijos e manteiga;
comprando terras e plantando café em Candeias e em Campos Altos/MG.; ampliou os
armazéns e galpões para as máquinas de beneficiar arroz e café, com motores
novos e mais potentes. Foi uma época oportuna com bons resultados, que o fez decidir
pela construção do prédio para instalar sua nova loja comercial no mesmo local
da velha. Destinou o piso térreo à área comercial, com seções de calçados, tecidos e armarinhos,
papelaria, bijouterias, ferramentas, gêneros alimentícios; nas vitrines ficavam
expostas louças, talheres e vários
artigos para presentes, além das famosas acordeons italianas da marca
Scandalli. No 1º andar destinou à moradia da família com muitos cômodos; no 3º
andar há uma espaçosa área envidraçada.
Além do comércio tradicional,
foi grande negociante de arroz, feijão e milho, tornando-se grande produtor e
exportador de café pelos portos de Santos e Rio de Janeiro, através da
ferrovia, cujos vagões destinados ao
carregamento do produto ficavam
estacionados em linha exclusiva e ao lado dos seus armazéns, construída
especialmente para esse fim. Na época da safra, trabalhavam em seus armazéns e
máquinas beneficiadoras vários funcionários, além de cerca de trinta mulheres
para a escolha do café, descartando os defeituosos e as impurezas. Atualmente a
seleção de vários grãos são feitos eletronicamente por raios laser ou outros
métodos. Entretanto, foi muito importante para a comunidade candeense naquela
oportunidade pela quantidade de empregos que gerou para tantos e em variadas
atividades.
Importante destacar que na
época não existiam agências bancárias instaladas na vila e a Casa Bonaccorsi
era correspondente do Banco do Comércio e Banco Hipotecário, para diversos
serviços financeiros e cobrança de duplicatas mercantis.
Na expressiva atividade
comercial e industrial que exerceu em Candeias durante 58 anos, foi fundamental
a intermediação econômica para os produtores rurais, nos quais depositava
confiança e eram fieis cumpridores de seus compromissos, fornecendo-lhes créditos
em todas as compras necessárias em seu comércio, cujos pagamentos eram feitos
por ocasião das colheitas de seus produtos. Verdadeiras trocas!
Deve-se destacar que no
movimento de emancipação política e administrativa do município, atuou de
maneira discreta porque era um estrangeiro, apoiou e ajudou financeiramente
para cobrir despesas dos envolvidos na causa, especialmente para as viagens à
capital nas trativas políticas.
Celestino era um brasileiro
de coração e alma. Adotou Candeias como sua terra e por isso decidiu naturalizar-se
brasileiro. Em seguida se engajou efetivamente na política; foi eleito vereador
com o maior número de votos e presidente da Câmara Municipal durante todo o seu
mandato no período de janeiro de 1951 a janeiro de 1955.
No princípio do ano ano de
1960 passou sentir alguns problemas de saúde e sua família decidiu que fosse
para a Itália para tratamento médico, porque em Candeias não haveria como
tratá-lo adequadamente, onde insistia em permanecer. Foi para o Rio de Janeiro
para tomar o navio rumo à Gênova, porto mais próximo de Barga, sua cidade
natal.
Interessante destacar que
chegou ao Brasil no dia 16 de agosto de 1896, retornando à Itália em agosto de
1960, depois de 64 anos vividos em São Francisco de Paula e Candeias. Viveu
mais 6 anos em Fornaci di Barga, sempre esperançoso de voltar para sua terra
adotiva. Eram constantes seus sonhos nas funções de atendimento aos amigos e
fregueses da Casa Bonaccorsi, a ao acordar, lágrimas rolavam pelo rosto de
saudades.
Celestino faleceu no
Hospital de Lucca, capital da Província, no dia 03 de setembro de 1966, aos 85
anos de idade... “morrendo” de saudades de Candeias!
Texto de Armando Bonaccorsi.
Editado por Armando Melo de
Castro
Blog Candeias MG Casos e Acasos.
Um comentário:
Merci de publier l'histoire de la famille Bonaccorsi! Guglielma Luchini, fille d'Annunziata Da Prato et de Giuseppe Luchini, épouse de Celestino Bonaccorsi, est la cousine de mon arrière grand-père Magloire Da Prato. Je ne connaissais pas con histoire. (galaise@me.om)
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