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segunda-feira, 16 de março de 2020

PIOR QUE O CORONAVIRUS É O MEDO.



Minha mulher amanheceu hoje dizendo da necessidade de ir ao supermercado buscar reforços para a nossa dispensa, porque o coronavírus vai arrasar. Dai a preocupação dela comentando: “Na Itália estão todos em casa; na China já morreram tantos; O Zema já trancou as escolas; o Bolsonaro falou isso... E mais isso e mais aquilo”.

Sinceramente eu até lamento não comungar com essa preocupação. Mas não consigo e chego à conclusão de que o meu mundo foi outro. Nele não tinha internet; não tinha televisão; não tinha Jornal da Globo, e nem da Record... A fonte de notícia mais importante era o Repórter Esso, um noticiário radiofônico de 5 minutos de hora em hora. Era tão rápido que os ouvintes tinham que ficar com o ouvido no rádio e às vezes na hora da notícia parecia que o vento levava a voz do locutor e se perdia parte da notícia. Além disso, eram poucas as pessoas que possuíam um rádio. O rádio era um aparelho caro e valvulado, não existiam os rádios portáteis transistorizados.

Diante dessa mexida frenética a respeito do coronavírus eu fico pensando que o medo é pior que qualquer doença; e me recordo que fui criado já esperando as chamadas doenças do tempo, todas contagiosas. Não havia vacinas, se haviam não chegavam ao povão. Varicela, catapora, caxumba, sarampo, coqueluche, doenças que deixavam sequelas e matavam se não fossem tratadas cuidadosamente. Para cada uma tinha um tipo de repouso. Eu tive todas elas. Mas já as esperava. A caxumba era a que mais assustava e preocupava; eram dois inchaços que davam debaixo das orelhas que tinham que ser protegidos, caso contrário baixava para o saco escrotal e o cristão ficava castrado sem poder futuramente gerar filhos. –----

 A catapora era uma varicela mais leve, mas cobria o corpo da gente de pereba deixando cicatrizes para o resto da vida. Eu tenho até hoje as marcas da catapora. As marcas da varicela eram ainda maiores. A coqueluche era uma tosse que leva o filho de Deus a perder o fôlego e ficava até roxo, era preciso às vezes enfiar o dedo na garganta do doente, para puxar o catarro. O sarampo o doente deveria ficar preso dentro de um quarto sem tomar vento. Eu tive todas essas doenças.

Não podia ir à escola e o aluno costumava ficar tão prejudicado que perdia o ano, pois naquele tempo não havia recuperação nas escolas. --- Isso sem falar daquelas mais perigosas: A varíola; a tuberculose e a lepra. Todas contagiosas. Na rua onde houvesse um tuberculoso as pessoas tinham medo até de passar por ela. Só existia a vacina para varíola. Essa vacina causava duas feridas terríveis no braço de quem a tomava. ---

No mais, eram comuns os problemas de garganta e ouvido. Garganta era curada com gargarejo de água de sal grosso; ouvido era dente de alho e azeite de mamona; Gripe chá de laranja com sal e limão da china. --- Como cada gripe altera o vírus, cada uma levava o nome de uma pessoa importante que tivesse contraído o vírus. Uma gripe brava  em 1963 tomou o nome Maria Tereza, a esposa do então Presidente da República, João Goulart.


Para intestino preso eram várias as opções; Não existia “Lactopurga” e sim purgantes de sal amargo, sal de Glauber ou raiz de jalapa. ----- Uma vez por ano tomava-se um lombrigueiro feito de semente de abóbora ou de bucha. Comia aquela farofa às quatro horas da manhã e algum tempo depois tomava um purgante daqueles. Nesse dia o cristão não saia de casa.

O chamado intestino entupido era mais grave, quando chupava jabuticaba com caroço, principalmente aquelas do caroço grande. Elas não prendiam apenas os intestinos, elas causavam um entupimento terrível no cristão.
Para adultos era usado o clister que também era chamado de lavagem. Consistia em injetar um chá morno nos intestinos do filho de Deus, através do fiofó, até ele se borrar todo.

Para as crianças era uma bombinha de borracha injetada com água no mesmo lugar.  ---- Eu me lembro, certa vez eu chupei jabuticaba à vontade, daquelas do caroço bem grande, nada me desentupia, e eu fui crucificado com uma bombinha de borracha daquelas só de lembrar eu me estremeço. Enfim, Toda mãe de família era uma técnica em fitoterapia, ministrava e receitava chás dos mais diversos e curava as doenças. Pouco se ia numa farmácia. Ah! Ia me esquecendo. Nesse tempo tinha um tal de andaço. Seria uma pequena epidemia.

Armando Melo de Castro.
Candeias MG Casos e Acasos.

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