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quinta-feira, 11 de abril de 2019

O MEU QUARTO ANO - CURSO PRIMÁRIO

                                          Maria do Carmo Bonaccorsi  - Foto Jesiane Langsdorff


A minha vida de estudante foi bastante marcada pela terceira série do curso primário no Grupo Escolar Padre Américo. ---- A escola era, ainda, nova e muita coisa não havia entrado nos seus eixos. --- Muitos alunos, como eu, talvez tivéssemos a necessidade de uma análise por uma psicóloga escolar ou sido indicado para um professor do padrão do americano, Ron Clark.

Apesar dos altos e baixos, que a vida me oferecia, felizmente eu consegui me recuperar e vir a ser o aluno disciplinado e dedicado, como fora no primeiro e segundo ano e amigo de  minhas professoras, ---- exceto uma: a substituta de Dona Ninita Alvarenga, ---- mesmo porque, esta me parece, nunca ter sido amiga de ninguém. ----

Agora, eu era outro. Tornara-me arredio, isolado dos colegas indisciplinados e me pautava sempre junto daqueles mais queridos pelas professoras. ----- Certa vez a diretora da escola encontrou-se com o meu pai no Bar Piloto e disse-lhe que eu teria mudado muito e para melhor, e quis saber o que meu pai teria arrumado comigo. Então ele disse: “Eu acho que foi a mãe dele”.

O corpo docente da Escola Padre Américo, ainda, mantinha professoras leigas e ou vindas de outras cidades. Formar-se professora naquele tempo era um privilégio de poucas.  ---- Teriam que se deslocar para outras cidades o que teria um custo alto. As professoras, normalmente, eram filhas de pessoas bem aquinhoadas, e quase sempre casadas com maridos endinheirados. Portanto, os seus salários eram destinados á manutenção da aparência. Mesmo porque, considerar-se-ia antiético uma professora dar aula de chinelo de dedo ou de calça comprida.

A professora de então, era mais bem reconhecida, o que infelizmente hoje não acontece. A situação delas era na grande parte estável, haja vista, que durante o governo de Bias Fortes elas ficaram quase seis meses sem receber os seus salários e não fizeram greve e nem barulho. ----- 
(Bias Fortes foi um governador de Minas que dormiu no dia que assumiu e acordou-se no dia em que deixou o governo. Assim era a sua fama.).

Não havia na escola os favorecimentos que existem hoje com boas verbas para a Caixa Escolar, mantenedora dos alunos carentes. Tal qual aos alunos, a Caixa Escolar também era pobre. --- pois não tinha os recursos necessários para manter com dignidade os alunos carentes com merenda e material escolar. Os suprimentos vinham principalmente das festas que a Escola promovia.

O ano de 1958 chegou. ----- A volta à escola encheu-me a consciência de alegria e esperança. Eu jurara que seria um aluno responsável e cumpridor dos deveres e já teria cumprido a promessa no ano anterior. Eu estava comprometido com minha mãe e com Jesus Cristo. --- Minha mãe me fizera jurar perante Cristo de que mudaria o meu comportamento.

Minha professora seria Dona Maria do Carmo Bonaccorsi; famosa como brava e disciplinadora rígida. Isso já não me assustava. Havia quem me não acreditava, mas eu sim, eu tinha a certeza de que o ano de 1958 seria o meu ultimo ano no Padre Américo. --- Depois viriam outras etapas, como curso de admissão ao ginásio, ginasial e contabilidade. Mas já foram outros tempos e também fora de Candeias.

Dona Maria do Carmo Bonaccorsi ficou sendo minha grande amiga desde os primeiros dias de aula o que me fez comprometido com ela também. ---- Lembro-me da data do seu aniversário, dia 16 de julho, quando ela fazia 31 anos... Plena balzaquiana, quando a homenageamos na sala com um bolo oferecido por uma de nossas colegas.

Lembro-me, também, de quando foi o centenário da cidade de Formiga, ela teria ido à festa daquela cidade, e voltou contando detalhes para nós. Foi quando eu fiquei sabendo que Formiga era chamada de Cidade das Areias Brancas e eu alimentei essa curiosidade por muito tempo até ir conferir isso.
 Eu nunca vi Dona Maria do Carmo usar a vara de marmeleiro, fornecida pelo seu Tio Erasto de Barros. --- Ela tinha um olhar duro e nem sempre mostrava os dentes. Ficava vermelha quando nervosa e a sua aula era ouvida pelos vizinhos da escola porque falava alto. ----

A nossa turma tinha um colega indisciplinado, o meu grande amigo até hoje, morador da cidade de Oliveira, cabeleireiro e homossexual assumido desde menino. ---- Renê Ferreira de Oliveira. ---- Dada a sua condição ele era mais chegado às meninas e era difícil conter a sua conversa durante a aula. ---- Sabia a vida de todo mundo na cidade. Numa discussão com ele ninguém vencia principalmente se tratasse de pessoa com o rabo preso. ---- No ano anterior, a professora Ana Zélia de Melo se meteu a discutir com ele, e saiu com a moral esfolada, talvez sem merecer.

Renê seria bom amigo, mas para inimigo nem pensar. Era inteligente, mas não levava o estudo a sério. ---- Filho de Dona Eponina, irmã do Sr. Willian Viglioni. ---- Era repetente obstinado. ---- Dona Maria do Carmo o consertou. --Quando ele começava, ela se levantava, abria a porta e olhava para ele e dizia: “Renê, por favor, saia da sala. Você está perturbando a minha aula, assim quando você estiver decidido a se comportar, bata na porta”. Ele nunca batia na porta, até que um dia bateu; ela o colocou para dentro lhe fez um sermão deixando-o em silêncio. E assim foi lhe dando um jeito. 

Dona Maria do Carmo não tinha alunos preferenciais; para ela eram todos iguais. ---- Lembro-me de um fato bem perto de mim: No dia da nossa formatura, ainda lá no cinema, Dona Eponima, mãe do Renê abraçou-a e lhe agradeceu chorando: “Só você Ducarmo para desencalhar o Renê”!

Finalmente chegou o fim do ano de 1958. ---- As provas nesse tempo iam para ser corrigidas na cidade de Formiga. ---- Essa espera do resultado era um martírio, um sofrimento para os alunos. Mas eu tinha certeza de que teria sido aprovado, como fui. Nenhum aluno dessa turma de Dona Maria do Carmo Bonaccorsi foi reprovado.

A nossa festa de formatura no dia 8 de janeiro, não perderia para nenhuma festa de formatura de uma faculdade. O Corpo docente da escola todo presente à mesa. Autoridades civis e militares e a grande autoridade eclesiástica, na pessoa do então Monsenhor Castro, com o seu discurso maravilhoso, com a sua eloquência e o seu vasto recurso de oratória. ---- Um deputado que teria sido convidado também falou. Enfim um festão.

Concluíram o curso primário comigo os seguintes colegas:
Antônia Aparecida Vilela, Antônio Ítalo Freire, Clarice Alvarenga, Hélio Melo da Silva, Jadir Melo da Silva, Jesus Alves Resende, João Faria, José Gonçalves, Márcio Miguel Teixeira, Marlene aparecida Martins, Marli dos Reis Alves, Nelli Manda Ramos Melo, Neri Ferreira Barbosa, Odete Lopes da Trindade, Raimundo Ferreira de Oliveira, Renê Ferreira de Oliveira, Sebastiana dos Santos, Sebastião Alves de Resende, Silvio José Rodrigues, Silvio Lopes da Silva, Teresinha Luiza Alves, Teresinha Mori, Zélia Alves Alvarenga e Zilene Vilela Alvarenga.

O certificado de conclusão do curso foi assinado, então, pela Diretora Maria do Carmo Alvarenga; a professora Maria do Carmo Bonaccorsi e o Inspetor, Sr. Nestor Lamounier. --- Nesse tempo o Inspetor era indicado pela política e Visitava a escola esporadicamente numa missão política. ---- Outro que também foi Inspetor Escolar nos primórdios do Padre Américo, foi o amigo Miguel Albanez, o nosso querido Biribico.

Para minha tristeza, Dona Maria do Carmo Bonaccorsi, faleceu recentemente. Era a última de minhas professoras. Quando eu estava em Candeias e a via à porta de sua casa, eu ia até lá cumprimentá-la.   E sempre recordávamos juntos aqueles tempos. Eu sentia que a Escola Padre Américo era parte de sua vida. ----- Ela tinha a mesma idade de minha mãe e eram muito amigas desde a infância. Partiram quase juntas para junto de Deus. -----

Onde quer que esteja Dona Maria do Carmo, receba o meu abraço carinhoso do seu eterno aluno.

Armando Melo de Castro.
Candeias MG Casos e Acasos.

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