Como um moderado consumidor de álcool, estou ciente
que o álcool, em excesso, leva ao alcoolismo inveterado e é, sem dúvida, um
grande inimigo do homem. Nessa circunstância, ele enfraquece o corpo do ser humano,
tira-lhe a resistência e lhe traz as doenças. Dentre outros graves malefícios,
ele diminui a memória, rebaixa o caráter, embrutece a inteligência e pode
acabar, também, com os belos sentimentos que envolvem o ser humano. Pais de
famílias que se entregam ao uso do álcool de forma incontrolável causam grandes
desastres aos filhos, esposas e pais. Nada mais triste do que ver uma pessoa
embriagada, totalmente fora de si.
Contudo, não podemos negar que o álcool usado de forma
moderada traz ânimo para a alma. É a alegria em uma festa e ainda pode
colaborar com a saúde e oferecer uma sensação de prazer, todavia, como um
aperitivo saudável. O problema é que existem muitas pessoas que, ao perderem o
controle, exageram no uso das bebidas etílicas e, é evidente, que todo exagero,
com certeza, é prejudicial à saúde. Não só o exagero do álcool, mas todo e
qualquer exagero.
Agora, a meu ver, as pessoas que não ingerem álcool
por questões religiosas ou filosóficas, ou, ainda, por serem alcóolatras em
tratamento ou, simplesmente, por não gostarem de bebida alcoólica fazerem, aos
quatro cantos, a apologia negativa do álcool, estão erradas. Por exemplo: Um
pastor evangélico, do alto do púlpito da sua igreja, pregar mentiras dizendo que
no vinho que Jesus Cristo bebia não havia álcool é o fim da picada. A começar
que para se chamar VINHO tem que ser fermentado e para ser fermentado,
obviamente tem que existir álcool. A Bíblia Sagrada, em sua essência não proíbe
o vinho. Ela recomenda, apenas, o uso moderado. Aliás, Paulo de Tarso, em sua
Primeira Carta a Timóteo, recomenda no Capítulo 5, Versículo 23 que não se beba
somente água, mas também, um pouco de vinho para a cura do estômago e das
fraquezas.
Eu tenho presenciado e visto, por aí, alguns
pastores fanáticos, que talvez sejam e alcóolatras referindo-se ao álcool com a
um verdadeiro demônio. Todavia, muitas coisas de que falam são oriundas de suas
próprias imaginações, sem qualquer embasamento bíblico. Eu acho graça quando
ouço alguns evangélicos dizerem que o vinho de Jesus era um suco de uva. Ora,
vejamos, se fosse assim como se explicaria o primeiro milagre de Cristo, em
plena festa de um casamento quando Ele transformou a água em vinho
(João/Capítulo 2)? E, por sinal, um vinho de primeira qualidade! Aí, vem alguém me dizer que aquilo era suco
de uva? Pura balela. Opinião tendenciosa, abstrata de qualquer senso lógico.
Não possamos nos esquecer de que nos milagres de Cristo havia o improvável e o
imponderável, todavia, jamais Ele se abdicava da lógica e da filosofia em seus
atos. Com toda a certeza, era um vinho bem melhor do que esses vinhos que os
padres católicos bebem.
Eu penso que recomendar a abstinência para quem é um
doente do alcoolismo e recomendar o uso moderado para os demais está correto.
Agora, ficar pregando, aos quatro ventos, que o álcool é coisa do diabo só
mesmo para um ignorante da maior espécie. É patente que todo o excesso faz mal.
Se alguém tomar seis litros d’água de uma só vez morrerá imediatamente. Se
tomarmos todos os comprimidos de uma caixa de remédio, em uma dose única,
teremos, inevitavelmente, uma morte instantânea. Tudo que entra pela boca, em
excesso, mata. A diferença entre aquilo que cura e aquilo que mata é apenas o
tamanho da dose. Portanto, vamos recomendar aqui a esses pregadores do
cristianismo, que não gostam de tomar um aperitivo, para parar com essa
história de que Jesus Cristo bebia suco de uva; que álcool é coisa do diabo...
Vamos relembrar que vinho é bebida fermentada e a fermentação produz o álcool;
e quando na Bíblia está escrito o vocábulo VINHO, o texto se refere à bebida
alcoólica.
Entretanto, mudando o assunto de pau para cavaco, eu
me lembro, neste momento, do meu amigo Roberto. Roberto era filho natural de
outro amigo, o maestro Américo Bonaccorsi. Filho natural, antigamente, se dizia
um filho fora do casamento. Não sei se Roberto era filho antes ou depois do
casamento do maestro, sei apenas que os dois se davam muito bem. Filho e pai
sempre estavam juntos no Candeense Hotel de propriedade do Sr. Américo. Da
mesma maneira, Roberto vivia, em plena harmonia, com os seus meios-irmãos que
eram os filhos do casamento de seu pai.
Roberto, hoje falecido, foi alcoólatra. Contudo, no
final da vida, já não bebia mais, teria deixado a bebida e vivia
tranquilamente. Porém, quando mais jovem, bebeu todas que teve direito e mais
algumas. Era visto, constantemente, embriagado, apesar de ser pessoa
trabalhadora e cumpridora dos seus deveres. Contudo, nos finais de semana,
anoitecia e amanhecia sobre forte efeito de álcool.
Roberto teria perdido um olho, não sei como. Ele
tinha um olho de vidro, ou seja, uma prótese ocular feita de vidro. Atualmente,
é quase inexistente, preferindo-se mais as modernas próteses de silicone.
Quando Roberto estava chapado, parece que o olho o
incomodava. Não se sabe como, mas era visível. Certa vez, no tempo em que eu
morava na Rua Coronel João Afonso, não havia calçamento na rua e ela ficava
cheia dos montes de ciscos que os empregados da Prefeitura deixavam quando a capinavam.
Em um dia de jogo, no antigo Estádio do Rio Branco
que ficava pouco abaixo da Loja do Sr. Vicente Vilela, era como se fosse festa.
A Rua Coronel João Afonso ficava toda movimentada de pessoas descendo e
subindo. Assim, passou, por ali, o Roberto bastante turbinado pela pinga do
João Marques. Logo ele verga sobre um monte de cisco tapando um olho com uma
mão e olhando sobre o cisco. O Quintino enfermeiro, passou e cuidadoso como
era, perguntou ao Roberto:
"O que aconteceu, Roberto foi um cisco no
olho?”. E o Roberto, com aquela sua voz grossa, um verdadeiro rompante,
denotando que já teria bebido todas, disse:
- ”Que cisco no olho, rapaz! Meu olho é que
caiu no cisco!”.
Armando Melo de Castro
Candeias Casos e acasos.
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