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quinta-feira, 13 de junho de 2019

OH! QUE SAUDADE QUE EU TENHO

                                                                              BAR PILOTO - CANDEIAS MG
Hoje, depois de tomar o meu café da manhã, liguei para um amigo, da cidade de Luz, a fim de parabeniza-lo pelo seu 83º aniversário. E como é patente, um idoso ao dar os parabéns para outro idoso, o traço da conversa não é no mesmo tom da juventude. O meu amigo com o qual outrora, juntos, experimentávamos bons tira-gostos e boas cachaças enquanto discutíamos assuntos interessantes, agora, encontra-se naquela fase de saber, apenas, o que é bom para aliviar ou curar doenças. E o prazer de degustar aquilo que o cérebro pede já não lhe pertence mais.

Disse-me não estar passando bem de saúde, em virtude de ter sido acometido por um diabetes. Falou de doenças, de saudade e como teria sido motorista profissional não deixou de falar em estrada, contudo, na estrada da vida. ----- Lamentei profundamente as  suas queixas, claro, sem boas palavras para conforta-lo.

O tempo não poupa ninguém e a doença advinda pela idade avançada, nada mais é do que um privilégio dado por Deus; a fim de que possamos entender que estamos nos aproximando do fim da estrada da vida e prepararmos para isso. ---- Esta é a melhor maneira de encararmos o fim da vida. ---- Devemos entender que o tempo é como um ácido que corrói o nosso corpo e pede o espelho para que nos mostre o estrago. -Lutar contra o tempo é lutar contra o inevitável. Afinal, nessa estrada não há retorno, a não ser embarcados na saudade.

Após desligar o telefone, fermentou-me nas dornas do meu cérebro a ideia de que a vida é realmente uma estrada que estamos viajando sem saber de onde viemos e nem para onde vamos. Uma viagem por uma estrada cujas margens têm flores e espinhos; retas e precipícios, ora colocando as vidas em riscos; e em outros momentos parecendo estar nos levando à verdadeira felicidade.

 Eu, aos 73 anos, felizmente, não comunguei com o meu amigo a respeito da sua doença. Felizmente não tenho o que me queixar da minha saúde. Mas sinto que não é só a saúde que o tempo nos toma. E como essa viagem da vida não tem retorno, deixamos para trás um rastro que se chama saudade que também dói. ------

Não foi só você Casimiro de Abreu que sentiu aquela saudade da sua infância querida que os anos não trazem mais! ---- Eu também sinto saudade da aurora da minha vida, de um céu sempre lindo, quando eu rezava a Ave Maria, adormecia sorrindo e despertava a cantar. --- Eu sinto, também, muita saudade e saudade dói de verdade.

Saudade de ver minha mãe lavando arroz nas cuias e o meu pai regando a horta; saudade dos meus avós me abraçando e da minha tangerineira no quintal da casa onde eu nasci; dos brinquedos que o meu pai fazia para mim à noite após me ver dormindo para coloca-los atrás da porta nas noites de natal. Sinto saudade da minha Rua Coronel João Afonso, toda cheia de mato e buracos e as mulheres lavando roupa, brigando e com as suas latas d’água junto à torneira pública no meio da rua.  

Sinto saudade sim, dos picolés de cereja e coco queimado do Bar Piloto; da venda do Chico Freire; das fofocas de Dona Ester e Dona Joana do Galdino, do cachorro Lírio do Henrique Sotero e das galinhas de Dona Marica da Melada, pastando na rua e se recolhendo num buraco do muro. ---- Saudade, do açougue do Juquita de Assis, no Beco Belmiro Costa e dos filmes do Oscarito e Grande Otelo, no Cine Operário são José. Uma saudade muito danada dos meninos da minha rua soltando papagaio, jogando bolinhas de gude matando passarinhos com bodoque e jogando piorra. O tempo se incumbiu de manda-los para longe e eu nunca mais os vi em sua maioria.

Saudade do entra-e-sai na Sapataria do meu pai, onde havia um quadro de São Crispim na parede, o protetor dos sapateiros. Saudade, também, da venda do Zé Lara onde buscava o pão de manhã, enquanto a minha mãe coava o café. --- O Grupo Escolar Padre Américo... Ai que saudade doida, das professoras todas já falecidas e os colegas repartidos pelo destino.

Saudade de sair pelas ruas com uma carrocinha vendendo as laranjas de Dona Mariquinha do Sr. Chico Freire e com isso ganhar uns trocados. Os nossos vizinhos; como eu gostava de passar à porta de Dona Filomena Barros, vê-la fazer croché e ganhar o seu sorriso;  como, também, observar o Sr. Erasto de Barros, seu irmão de Dona Filomena, sempre nervoso e com o seu linguajar chulo.  ------------- Muita saudade do Campo do Rio Branco, que ficava abaixo da loja do Vicente Vilela. Aos domingos era dia de futebol e a cidade toda descia a nossa rua... -----  É tanta coisa, é tanta saudade que não dá para por tudo aqui. -----E como disse Clarice Lispector: Saudade é como fome, só passa quando se come a presença.

E eu pergunto e se não tem presença? ---- Claro, não morre de saudade, mas morre com a saudade!

Armando Melo de Castro
Candeias MG Casos e Acasos.



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