No meu tempo de adolescente em Candeias as coisas eram muito
diferentes dos dias atuais a começar pelos trajes. Não havia muitas roupas
coloridas. O Jeans ainda era raro, o brim e o fustão dominavam e as mulheres
pouco usavam calças compridas. Os meninos tinham as cabeças raspadas para
evitar piolho nas escolas e por uma questão de economia.
Os jovens eram mais
acanhados e reservados; as moças eram mais tímidas e discretas. Não existiam
casais de namorados se beijando pelas ruas. Isso era feito às escondidas, e
quando dois namorados tomavam-se das mãos eram observados e candidatos a um
matrimônio próximo. O jovem já teria pedido autorização aos pais da moça para
fazer a corte de sua filha e apresentado condições de assumir um namoro que
prometesse um casamento futuro. Fora disso, era um deus-nos-acuda.
O namoro às escondidas era sinal de má intenção do rapaz e
falta de juízo e irresponsabilidade da moça. E quando os pais da moça descobriam
era aquela guerra de família. Os pais, de ambas as partes, tinham interesse de
que os seus filhos se casassem com candidatos aquinhoados. Portanto, os jovens
pobres sempre passavam por algum tipo de humilhação. O rapaz no mínimo tinha
que ter um emprego, e se bebia ou fumava já seria um partido restrito. Se fosse
dado aos jogos de azar, o que era comum em Candeias, o jovem já seria visto
como um “perdido”.
A fofoca era muito mais ativa comparando-se aos dias de
hoje; sobre essa questão os patrulheiros do alheio não perdiam tempo. Os
vizinhos então!... Eram de amargar. Dizem que o amor é cego, mas os vizinhos
não. Casal que namorava no portão eram vitimas dos vizinhos; esses seriam capazes de saber
até a cor da calcinha da moça e da cueca do rapaz. Naquele tempo era pior
porque as pessoas assentavam no rabo para falar do rabo dos outros. Sabiam das
filhas dos outros, mas não sabiam de suas próprias filhas.
Os rapazes da cidade gostavam de ajeitar uma namoradinha da
roça para desenvolver o seu ego. Elas com as suas carinhas de santas eram bem
mais acessíveis porque vinham da roça querendo um namorado da cidade, enquanto
os pais queriam que elas se casassem com os vizinhos roceiros para receber o
benefício do pedaço de terra que viria através da certidão de casamento.
Raramente um rapaz da roça namorava uma moça da cidade.
Naquele tempo rico era quem tinha terra e os fazendeiros que residiam na cidade
era a elite da época. Enfim, a zona rural era bastante populosa, as fazendas
eram mais extensas; muitos sitiantes e havia muita produção de grãos e gado. Era, a agricultura e a pecuária que garantia
a economia do município.
Na zona rural havia muitas escolas municipais. Os professores
permaneciam hospedados nas fazendas e vinham nos fins de semana. A partir da
inauguração do Grupo Escolar Padre Américo, hoje Escola Estadual, muitos pais
trouxeram os seus filhos para a cidade para que pudessem completar o curso
primário.
Entre o Posto de gasolina do João do Nestor e a Casa Celestino
Bonaccorsi, existia uma velha casa, de aluguel que de quando em vez trocava de
morador. Teria vindo de mudança uma família de ruralistas, que tinha uma penca
de filhos. Entre a filharada, havia um adolescente contando os seus quinze
anos. Chamava-se Eustáquio. Eustáquio era um bobo metido a sabido. Gostava de
entrar nos assuntos dos outros sem saber... Gostava de falar de mulheres como
se já tivesse tido vários amores. Gostava de contar histórias vividas por ele
lá na comunidade onde vivia, mas sempre caia em contradições. Ele,
naturalmente, repetia como um papagaio, aquilo que teria ouvido de outras
pessoas.
A praça defronte ao Posto do João do Nestor teria sido
inaugurada recentemente, e era comum os jovens se aglomerarem junto aos
bancos para trocar ideias, falar de suas aventuras, no escurinho do cinema e do
“piscadinho” de olho que teria dado para certa ninfeta.
Certo dia quando ali reunidos estavam eu, Zé Pança, Dico do
Josias, Joel Pacheco, e outros que não me lembro no momento, aproxima-se o
Eustáquio. Aproximou-se e já foi entrando na nossa conversa.
Do outro lado da rua passava uma das jovens mais bonitas da
época em Candeias; filha de um pai de filhas bonitas, o Sr.
Inácio Pacheco Lopes. Elas eram Zélia, Neusa, Leda, Eneida, Inegmar e Eliana. Todas
muito bem casadas. Mas a moça que passava do outro lado da rua era a Inegmar, ainda bem jovem e solteira; parecia uma boneca com o seu corpo bem feito e o seu porte discreto salientando
uma saia de anágua muito bem engomada.
O Eustáquio, no seu porte de cabaceiro de cafezais, chama a
atenção da turma e diz:
Oceis tá veno aquele “pixinho” gostoso que vai do outro lado?
Onti eu vi até a carcinha dela. Ceis precisava vê qui trenzinho. O vento bateu
na bunfinha dela que levanto e eu vi tudo. Logo na hora que eu for toma o meu banho
eu tenho no que pensar. Vô fecha o ôio e vô sangra a curuja.
Nisso o Joel levantou-se e um tanto irritado, bradou:
----“Fala isso ai de novo seu caipira! Fala! Você sabe que
aquele trenzinho é minha irmã???? Seu merda fala de novo! Seu língua de trapo!”.
-----”Que isso sô Joeer, eu tava era brincano, eu pensei que
era uma cunhicida minha”... Eu num vi nada não, num sei de nada não... Que
isso! Nosso que moço brabo meu Deus do céu!
Armando Melo de Castro
Candeias MG Casos e Acasos
Um comentário:
Este tipo de 'gafe' é muito comum ;-) eu também já estive presente em uma situação semelhante e o nervosinho também era irmão!
Este 'causo' me fez lembrar de como eu ficava intrigado com algumas considerações sobre algumas 'moças' lá pelos anos 60...
Eu ouvia as matronas dizerem: "coitada tão bonita, mas é perdida". Puxa! Eu levei um bom tempo até encontrar alguém que me explicasse o que era 'Perdida".
Hoje não existem mais! Todas se encontraram e todos estão felizes.
Abraço Armando, continue com suas publicações, são ótimas.
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