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sábado, 23 de julho de 2016

SÍLVIO, O BOM PIOLHO.




Em regra geral as pessoas gostam de se mostrarem boas amigas, caridosas, fraternas, solidarias e amorosas. Mas poucas são as pessoas que assim se comportam com fidelidade, sinceridade e lealdade com o próximo. Infelizmente a sociedade humana vai a cada dia se mostrando mais desgastada no seu convívio. – Podemos observar que tudo melhora na vida do homem, menos o homem. Ele continua matando, roubando e traindo, como sempre fez em toda a sua existência. Vejamos os exemplos de nossos políticos principalmente num momento tão difícil como estão passando o povo brasileiro; eles estão envolvidos é em suas reeleições e seus interesses. Não se vê um sentimento baseado no amor por parte desses senhores.


Todos os sentimentos aliados ao amor são extraordinários para o crescimento humano e a base de uma comunidade saudável e feliz. Está mais do que patente de que onde há o amor sincero, a amizade, a fraternidade, a solidariedade, a caridade, enfim todos esses sentimentos sendo oriundos de um amoro sincero e vivo, o sinônimo disso é a felicidade que todos querem. E o doador de todos esses sentimentos é normalmente silencioso e solitário.


Remexendo nas gavetas do armário das minhas memórias, encontrei-me com um candeense que está ali muito bem, guardado. E toda vez que me lembro dele eu me sinto tomado por um sentimento maravilhoso. Chamava-se ele, Silvio Souto.


Silvio era membro da família Souto muito conhecida em Candeias. Tinha como primos: o Antônio Souto, o expedicionário que serviu o Exército Brasileiro na Segunda Guerra Mundial; o Everto do Alonso, o maior goleiro candeense de todos os tempos; o Dedé do Alonso grande jogador do meu querido e amado Rio Branco Esporte Clube; o Bigode que era cantor e jogador de futebol, tendo ido parar no Rio de Janeiro e São Paulo. Bigode foi bem sucedido e chegou a cantar na Rádio Record em São Paulo. Mas desistiu e veio embora. No Rio chegou a jogar num grande time de futebol profissional. Mas, abandonou tudo isso, sem mais e sem menos, para cortar cabelo em nossa cidade.


Ninguém conhecia Silvio pelo seu nome. Era conhecido pelo apelido de Piolho e no popular era “piôio”. Apenas uma pessoa o chamava de piolho, monsenhor Castro. Os dois eram muito amigos. Nos campos de futebol, principalmente, nos jogos da Associação Esportiva Candeense. Nas festas da Igreja, barraquinhas etc. Piolho sempre estava ao lado do Monsenhor, como um guardião do reverendo. Mas nunca era visto participando de um ritual religioso... ---


Trabalhava no Matadouro Municipal, junto ao Lico da Sinhana. Era um homem simples, que escondeu em si durante anos a sua benevolência; o seu caráter cristão e o seu amor ao próximo. Piolho era bem afeiçoado, mas de aparência muito humilde. Estatura mediana, rosto redondo, fala baixa e a barba cerrada e mal escanhoada que lhe fugia o pescoço grosso.


Certa vez nas imediações da curva da linha, local conhecido por uma volta fechada da estrada de ferro que corta as nossas Candeias, situada nas imediações de um local denominado “Santinha”, certa feita, começou a aglomerar-se um bando de urubus, naturalmente aguardando o “urubu rei” para dar inicio ao consumo de uma carniça por ali. Alguém, que não se sabe quem, ao aproximar-se do local observou que se tratava de um homem morto cujo corpo já se encontrava em estado de decomposição.


O mau cheiro já exalava a ponto de se tornar insuportável. A polícia foi comunicada, contudo, o contingente policial, à época, consistia em um cabo e dois soltados. Como o cabo estava ausente, o comando estava sobre as ordens de um soldado que junto de seu companheiro estiveram no local e à distância, alegavam aos presentes terem “estômago fraco”. Apenas tomaram conhecimento de que o morto teria passado pela Estação Ferroviária, dias antes seguindo o caminho da linha, e lavraram uma ocorrência.


Naquele tempo a nossa sociedade era muito desorganizada. Não havia essa responsabilidade de hoje. Mais do que patente é o fato das coisas haverem melhorado e muito... Nos dias atuais o comportamento social é muito diferente... É muito melhor!...


A polícia tentava encontrar entre os curiosos ali presentes, alguém que tivesse a coragem de resgatar aquele corpo pronto para o “bico do urubu”. Mas, naquela hora, onde estavam os caridosos? Onde estavam os religiosos? Onde estavam os representantes da saúde? 


Se até a polícia enrolou quem mais iria dar conta de tal tarefa? Ninguém arriscava colher aquele pobre, mas, filho de Deus, num estado adiantado de putrefação. Ninguém ousava sequer chegar perto tocar naquele corpo humano cujo mau-cheiro atraia a cada vez mais os urubus.


Aparece alguém com esta disposição deixando a população de Candeias toda surpresa. Silvio, o Piolho. Tomou-se de um cobertor, e com as mãos sem nenhuma proteção colheu os restos daquele homem cuja carne já começava a soltar os ossos. Saiu abraçado com aquela trouxa levando aquela encomenda de Deus para ser enterrada no Cemitério São Francisco.


Este foi o maior exemplo de caridade cristã que eu já pude presenciar até hoje em toda a minha vida. Ninguém jamais pudera imaginar que Silvio, o Piolho, pudesse fazer aquilo. Ele sim pode demonstrar o que é amor ao próximo... O que é ser adepto de Cristo no cerne da filosofia cristã.


Portanto, Silvio, nosso bom piolho, onde quer que esteja, receba o nosso abraço, pois, com certeza, estará recebendo as bênçãos de Deus depois do seu feito aqui na terra. Muita gente gostaria de fazer o que você fez, mas não terão jamais a coragem que você teve. O ânimo, e o espirito de caridade. É preciso ser forte, é preciso ser nomeado por Deus para fazer aqui o bem que você fez. Como se sabe você ficou com aquele cheiro por muito tempo perturbando o seu olfato.

 Armando Melo de Castro

Candeias MG Casos e Acasos.

 

 

 

 

 

 

 

 

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