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sábado, 20 de julho de 2013

UMA CÓLICA DE RIM.


Foto para ilustração do texto.
Zeferino veio da zona rural para tentar viver na cidade. Ele era uma verdadeira pamonha. Se não fosse a sua mulher se matar na lavação de roupa, na cata de café e na venda de coisas de porta em porta, o filho Pedrinho nem teria o que comer.

Não possuía uma profissão. Para a labuta de roça, ele não prestava. Morou de agregado em uma fazenda pelos lados da cidade de Camacho e, segundo contavam, era do tipo Jeca Tatu, o famoso personagem de Monteiro Lobato. A diferença é que Zeferino não tomava lombrigueiro e nem Biotônico Fontoura, portanto, era pior que o próprio Jeca, haja vista ter ficado a vida inteira como um lombriguento dizendo que isso ou aquilo não valia a pena. Até que um dia se viu sem qualquer expectativa de trabalho no campo e resolveu ir para a cidade. Mal sabia ele que na cidade a sobrevivência seria muito mais difícil, isso porque na cidade há gastos como casa para morar, consumo de luz, leite, água, verduras e outras coisas mais que empregado de fazendeiro, às vezes, não compra e nem paga.

O único serviço que Zeferino arrumou foi o de servente de pedreiro. Todavia, chegou um determinado momento que nenhum pedreiro o queria como seu ajudante. Ele era mole demais, reclamava de tudo, chegava atrasado ao serviço e era sempre escravo do relógio. Vivia se queixando de ser pobre e era, demasiadamente, invejoso. Para ele, Deus não era justo porque uns tinham carro e outros, como ele, não tinham. Alguns possuíam casa para morar e outros, como ele, não possuíam. Além disso, ele reclamava de não poder comer carne todos os dias, uma vez que esta era a iguaria que Zeferino mais gostava.
Galinha que caísse em seu terreiro entrava na sua panela. O mandiocal no lote vizinho do Antônio do Bastião quase acabou. Zeferino estava tão à vontade para roubar as mandiocas do Antônio que chegava a arrancá-las para vender.
Zeferino era um sujeito bem feio. Ele era baixo, cheio, cabelo amarelado com a forte aparência de sujo, com barba de bode, tinha apenas o queixo e o bigode, com dentes mal cuidados e uma grande pinta junto ao pé do cabelo e ainda uma grande verruga no alto da orelha esquerda parecendo um brinco de cabeça para baixo. Com uma voz mansa, muitas vezes, precisava pedir para repetir o que dizia. Devia ter uns trinta anos, mais ou menos. Era casado com uma mulher completamente avessa a ele, pois ela era trabalhadeira e muito bonita. Quando passava notava-se o seu corpo balançando dentro do vestido e os apreciadores comentavam: “O que essa mulher viu naquele Zeferino? Isso é um bife na boca de um cachorro!”

Eles tinham apenas um filho. Pedrinho com apenas seis anos de idade, era como diziam: “O pai escarrado”. Dava para ver que o filho seria no futuro o espelho do pai.

Era tipo de marido que não aborrecia a mulher. Vivia elogiando a patroa e, constantemente, dizia que se tratava de uma mulher honrada, que não o traía e que, ao final, teria dado muita sorte ao encontrá-la na vida. O vizinho dos fundos, que também era dono do barraco em que vivia Zeferino, criava galinhas soltas e, às vezes, passava para o pequeno quintal de Zeferino um frango ou uma galinha que nunca mais voltavam. Ele, cuidadosamente, furava um buraco e enterrava as penas do galináceo. Gostava bastante de uma galinha feita à moda cabidela, com quiabo e angu, acompanhados de arroz e uma caprichada garrafa de pinga e, para isso, era esperto.

O vizinho senhorio descobriu que as suas galinhas estavam vasando no buraco da cerca, contudo, não disse nada. Certo dia, ele chegou a ver quando Zeferino, cuidadosamente, jogava milho para atrair a galinha a fim de subtraí-la de seu dono.
O vizinho chamava-se Geraldo e vivia da renda de uns barracos alugados e de um sítio em que produzia alguns litros de leite, uns porquinhos e outras coisas mais. Contava, mais ou menos, com uns quarenta anos e se encontrava, portanto, na idade do lobo. Tinha a estatura mais que média, a cabeça sempre coberta por um chapéu cowboy, a cara redonda, a barba bem feita e um bigodão de sopa. O pescoço era curto e as roupas bem aprumadas. Quando passava, exalava um cheiro forte de perfume de feira e o seu porte traduzia um tipo de Dom Juan barato. Enviuvou-se há algum tempo, acabando por morar sozinho e vindo a cozinhar a sua própria comida. De vez em quando, aparecia uma mulata para lavar a sua roupa e limpar a sua casa. Diziam as más línguas que a cabrocha também lhe prestava outro tipo de serviço.

Zeferino recebia, de vez em quando, a visita do vizinho que, às vezes, tomava com ele um gole de pinga, comia um pedaço de mandioca frita como tira-gosto e comendo, por muitas vezes, até mesmo um pedaço de suas próprias galinhas. Por seu lado, Geraldo também se fazia agradável trazendo-lhe uma dúzia de ovos, um molho de couves, um pouquinho do feijão do sítio, um pedacinho de carne etc e tal e, assim, no beira-beira de vizinho, Geraldo se encontrava, habitualmente, papeando na cozinha do Zeferino que se sentia muito honrado com aquela hospitaleira e lucrativa amizade.

 Vendo Zeferino sem trabalho, Geraldo resolveu empregá-lo em seu sítio cujo trabalho seria tomar conta dos porcos, das galinhas, das poucas vaquinhas e da pequena horta de couve. O salário era pouco, mas, para quem estava sem fazer nada foi um verdadeiro achado.

Por ocasião da visita do antigo Bispo da Diocese de Oliveira, em Candeias, Dom José Medeiros Leite, era hora de crismar o Pedrinho e o vizinho, o senhorio, o patrão e amigo de cozinha, se tornaria agora, também, o seu compadre. Geraldo foi convidado para padrinho de crisma do Pedrinho. Dessa maneira, foi uma festa a crisma do menino. O compadre Geraldo presenteou com uma leitoa, duas galinhas e dez litros de leite para a festa, sem contar o marrão de caruncho dado de presente para o afilhado. Assim, era cumpá Gerardo daqui, cumpá Zifirino dali, cumá Maria de cá e, nessa toada, foi sendo tocada a vida por ali. Cumpá Gerardo já quase não ia ao sítio. - “Lá, quem cuida é o cumpá Zeferino! dizia sempre.

Certo dia, quando estava no sítio, foi acometido por uma forte dor nos rins e resolveu ir embora para a casa a fim de cuidar de seu incômodo problema. Contudo, ao entrar em sua casa, pela cozinha, através de um pequeno portão ao lado do barraco, escutou uns gemidos de quem estava subindo a escada de um orgasmo. Ele parou e, cautelosamente, ficou ouvindo o que se passava no interior do seu quarto e reconheceu a voz da Maria e do cumpá Gerardo que com voz cansada dizia:
--- Cumá do céu! Ocê sabe fazê o negócio bem feito, sô! Ocê é muito mió do que eu pensava!
E ela respondia, candidamente:
--- Ah, cumpá, isso é a sicura que eu tava nela. Eu já tava ficano era doida.

Diante disso, Zeferino dá um tempinho e, logo depois, resolve ir até ao quarto em cuja porta havia somente uma cortina de chita. Neste momento, ele vê o seu cumpá assentado aos pés da cama sem camisa e a Maria lhe passando as mãos nas costas, com os cabelos despenteados, as roupas amassadas e um olhar molengo fluindo orgasmo como se tivesse se despencado do último degrau de uma escada orgásmica.

---Uai, o quê que acunteceu cumpá Gerardo?
---Nada não, cumpá Zifirino! Eu qui pidi pá cumá Maria tirá um berne nas minhas costa. O diabo do bicho tava me incomodano.
---Êh, cumpá Gerardo! Cala a boca, sô! Incomodado tá é eu com uma corca de rim das braba. Mais qui trem danado, rapaiz!...

E a vida continuou...

Armando Melo de Castro.
 Candeias Casos e Acasos


























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