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sexta-feira, 4 de novembro de 2011

NO SILÊNCIO DAS BANANEIRAS



Às vezes, eu ouço dizer que o mundo de hoje está perdido. Que a pouca vergonha está tomando conta do mundo. --- Que, a continuar desse jeito, não se sabe aonde iremos parar. Que a vida, antigamente era mais fácil de ser vivida. Que o povo era mais honesto; o mundo mais saudável e uma gente mais séria, etc, etc... Quando ouço algum comentário dessa natureza, eu chego a ficar bobo como é que ainda existem pessoas tão cegas neste mundo a ponto de não reconhecer que a obra de Deus não merece regressão.

 A meu ver, nem tudo vem piorando e sim melhorando e muito. Ora, as pessoas que vivem há mais de cinquenta anos e dizem essas baboseiras, com certeza, possuem uma visão estreita. Isso porque podemos ver, a olho nu, que o mundo de hoje é muito melhor, é mais civilizado e mais adiantado em todos os sentidos. 

Dizer que a vida, antigamente, era melhor; que o povo era mais isso ou mais aquilo é querer cobrir o corpo com a língua. É verdade que, nos dias de hoje, a droga vem prejudicando a vida, mas antes a vida era a própria droga. As pessoas andavam com roupas remendadas, quase não havia aposentadorias, trabalhava-se de sol a sol e não tinha remuneração para tanto. Morria-se com doenças terríveis como sarampo, varicela, caxumba, gripe espanhola, gripe asiática. Dar a luz a um filho era o maior risco de vida; não se falava em cesariana e o parto era uma questão de vida e morte. Um parto complicado acabava com a morte do filho ou da mãe. Isso sem falar nas doenças desconhecidas. 

Não havia um diagnóstico como nos dias atuais e, também, não havia assistência social nenhuma. A miséria ardia aos olhos dos pobres. Faltava emprego, faltavam escolas, faltava luz elétrica sem falar em segurança, telefone, televisão, rádio. A lamparina, o banho de bacia, o pilão, as roupas remendadas, ainda faziam parte do nosso dia-a-dia Enfim, vivíamos num mundo pobre. Mais do que pobre, era miserável. Um mundo de cão. Hoje, não. Hoje, não chegamos a um patamar satisfatório, todavia, melhorou muito. Antes rico era rico e pobre era pobre. À bem da verdade, antes, nem os ricos viviam a vida dos pobres de hoje. 

Há dias, estive conversando com uma senhora que me veio com esse discurso e eu fiquei só ouvindo. Dizia-se escandalizada com a vida dos dias atuais, principalmente, com a pouca vergonha das pessoas, especialmente, das mulheres. Diante do exposto, tentei lhe mostrar que estava um tanto enganada com relação ao mundo antigo e o mundo moderno. Entretanto, como dizia Jesus Cristo: “O pior cego é aquele que não quer enxergar”.

É fácil analisar: Antes as pessoas faziam as coisas às escondidas e, atualmente, fazem à vista de todo mundo. Hoje um jovem transa com a vizinha e não está nem aí pelo que dizem. Um casal se casa e, se não deu certo, já parte para outra. Eu acho que o povo de hoje é muito mais prático. Não estão preocupados com os patrulheiros do alheio. Isso é uma questão cultural. É o conflito de gerações, natural na obra da criação de Deus. Sem esse conflito a vida para e não há progresso. E ainda tem mais: Todo mundo quer ser livre, quer ter liberdade; e a sociedade vive gritando a liberdade para todos e a libertinagem está na cabeça de cada um. Conclui-se que o melhor é acostumar-se com isso e deixar de criticar o comportamento dos outros.

Em época remota, tinha o tal do compadre estar andando com a comadre e isso fervilhava a língua do povo. A “pouca vergonha” acontecia muito em família. Sogro com a nora. Cunhado com cunhada. Padrinho com a afilhada e muito mais.

Certa vez, quase saiu morte aqui em Candeias por causa de um sogro que estava passarinhando, em grande volúpia, a sua digníssima nora, distinta esposa do seu filho e grande mãe do seu neto. Sogro e nora foram encontrados flutuando na própria cama do filho que viajava e voltou de repente. Isso aí deu pano pra manga. Deu água pra barba. Deu chulé no pé da cama e, por pouco, não deu um parricídio.

O mais engraçado é que as pessoas envolvidas pensam que ninguém está vendo. Vão se acostumando de tal forma com a coisa que passam a ficar desprovidos de cuidados. Enquanto isso, os patrulheiros vão esparramando a notícia e os curiosos querem ver aquilo que, antigamente, era chamado de pouca vergonha, e, hoje, vai perdendo a conotação com esse nome. Nos dias atuais, todo mundo tem vergonha de ser vergonhoso. O negócio hoje é se mostrar. Bobo é quem entra nesses assuntos. A conclusão é que cada um viva a sua vida porque quem fala muito pode estar se assentando no próprio rabo.

Bem de frente a minha antiga morada, na Rua Coronel João Afonso, existia uma velha casa abandonada, onde hoje está a residência do José Geraldo Eustáquio. Ali, teria sido a morada de uma senhora bastante idosa e que vivia sozinha. Pessoa simplória que tratava dos ratos e das baratas a quem ela os tinha como companhias. Essa senhora se chamava Maria do Fortunato. A coitada passou os seus últimos dias de vida na miséria sobre os cuidados da vizinhança. O quintal da sua casa era cheio de árvores frutíferas e mato. Os meninos moradores da rua viviam vasculhando os pés de amora, pitanga, laranja e limão da china. Nos fundos, havia uma grande moita de bananeira e, como o acesso para seu quintal era aberto, a meninada transitava, por ali, na maior tranquilidade.

Os cachos de bananas sumiam misteriosamente. Não se via quem os colhiam porque essa subtração era feita sempre à noite. A rua era quase escura e a luz que iluminava a cidade era muito fraca. Ainda não existia aqui em Candeias a Cemig. Era a Empresa de Força e Luz Candeense, de propriedade do Sr. Celestino Bonaccorsi. Essa penumbra poderia favorecer a entrada no quintal da velha casa sem ser visto nitidamente.

Meu primo Vicente, que contava uns doze anos de idade, se destacava entre a turma que vasculhava o quintal da velha. Teria ele encontrado um cacho de bananas amoitado que, com certeza, seria retirado, posteriormente, pelo autor do corte. Nessa condição, Vicente aguardou o silêncio da noite chegar para fazer aquilo que dá ao cristão, cem anos de perdão, ou seja, roubar um ladrão. Nessa expectativa, ficou o tempo todo aguardando a hora de cumprir a sua intenção.

Tão logo se viu dentro das condições para tal, atravessou a rua, adentrou o quintal da tapera e foi direto até a moita de bananeira para subtrair o belo cacho da fruta tão apreciada. Foi quando levou um susto danado. Voltou correndo para casa e contou para o seu pai que o espírito de Dona Maria estava gemendo na moita de bananas.

 Mas, o meu tio, supondo que poderia ser algum casal clandestino, não quis ir lá comprovar de que se tratava o barulho. Contudo, foi tomado por uma grande curiosidade no que lhe fez ficar de olho no buraco da janela. Nessas alturas do campeonato, todo mundo já procurava um buraco entre as janelas da frente da casa que eram duas. Era uma grande expectativa. Quem seria? Essa era a pergunta que todos formulavam e aguardavam a resposta.

Depois de algum tempo, viram sair primeiro a mulher. Foi uma surpresa total. Aliás, foi mais um susto do que surpresa quando reconheceram a nossa vizinha. Esposa de um grande amigo nosso. Aliás, amigos de todos da rua. Uma esposa muito dedicada ao marido e à sua ninhada de filhos em número de seis. Uma mulher sem atrativos; magra, nariz vermelho, olhos avermelhados, um fio de sobrancelhas, nádegas minguadas, seios tipo maracujá no ponto, rosto miúdo, dentes amarelados. As pernas eram finas, feito cabra. Sempre se trajando com um vestido modelado num só corte de fazenda barata. Enfim, só seria desejável por algum tarado porque o perfil da adúltera não poderia proporcionar um prazer que pudesse levar o nome de sexual. Seu marido, coitado! Gordinho, barrigudinho, baixinho, fraquinho, agora “chifrudão” e um pintinho dormindo em cima dos ovos. 

Todos estavam aguardando, ansiosos, pela “cara do cara.” Quando ele aparece, olhando para baixo e para cima, sem saber que estava sendo observado da casa defronte através dos buracos das janelas. Era dom Juan ou, talvez, o Rodolph Valentino numa imagem diferente: magro, alto, negro, braços fortes e pés grandes, talvez de tamanho 44 pra cima.

Depois desse dia, o meu tio, que tinha uma língua desassossegada, contava até o tempo em que os dois ficavam na moita trocando banana por maçã, como se fossem Adão e Eva no paraíso da bananeira. Sem deixar também de comentar sobre o tamanho dos pés do Dom Juan, calculando, com isso, a dimensão do seu inhame.

Pois ai está, meus amigos, antigamente uma mulher safada era chamada de “puta de bananeira” Tem quem pensa que os vizinhos, as comadres e compadres antigos eram mais sérios; pois as bananeiras e os lençóis de seda que o diga.

Armando Melo de Castro
Candeias MG Casos e Acasos




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