A partir daí o meu convívio
com os trens se tornou rotineiro। A
estação de Candeias era bastante movimentada. Quase nada entrava na cidade ou
saia a não ser via trem de ferro. O meio de transporte rodoviário era então,
muito atrasado. Os ônibus se limitavam em pequenas jardineiras e era um
transporte caro. E os caminhões em número muito reduzido. Comumente ouvia-se
dizer: viajar de trem é bom... É confortável... Parece que o povo daquele tempo
não tinha muita pressa para chegar ao destino... Era um povo mais calmo e não
se irritava com os atrasos constantes dos trens. Não criticavam com veemência,
as deficiências da ferrovia... E as viagens, mesmo de negócios, eram
transformadas em passeios... ---- Estarei certo ou fortuitamente enganado? Ou
quem sabe a ingenuidade de criança ainda perdura em mim?
Junto à estação localizava-se
a máquina de limpar café e um grande armazém de depósito. Muitos trabalhadores
circulavam por lá trabalhando o café। Uma
sirena de som estridente levava a todos os cantos da cidade a marca dos
horários de trabalho. Um motor a óleo bastante barulhento quebrava o silêncio
do largo da estação. Havia, sempre, vagões estacionados no pátio da estação
carregando ou descarregando. Agentes, conferentes, guarda-chaves, pra lá e pra
cá, trajados com o fardamento da ferrovia, davam vida naquele ambiente hoje
morto. De frente, estava a máquina de limpar arroz, bastante movimentada,
beneficiando o arroz produzido no município. Manipulando esta máquina estava o
amigo João do Sô Nico, músico sempre ativo, da Banda de Música.
A chegada do trem de
passageiros dá um clima de festa। A
estação era ponto turístico onde até casais de namorados iam ver o trem chegar
e sair. Os carroceiros apostos, entre eles, Juca Cordeiro, Arlindo Barrilinho,
Serafim e outros, se movimentavam para pegar as mercadorias que chegavam. Os
carregadores de malas abordavam os passageiros e principalmente os
caixeiros-viajantes, cujas gorjetas eram polpudas. Logo após, a Rua Coronel
Marques, ou melhor, a Rua da Estação, aliás, a primeira Rua de Candeias a
receber calçamento; parecia uma maratona... Pessoas que desciam e depois subiam
para ganhar o centro da cidade. Subindo o morro ia o Joaquim Estafeta com
aquele baita saco cheio de cartas sendo levado para a agencia do correio. Os
telegramas eram recebidos e transmitidos através da Estação Ferroviária. O
correio não tinha telegrafo nessa época.
Posteriormente as
marias-fumaça foram substituídas pelas grandes locomotivas movidas a óleo
diesel; e os comboios agora maiores ficaram restritos em seus horários. Pois
apenas uma locomotiva levava a carga de três marias-fumaça...
Há um tempo passado, eu estive
lá remoendo esses quadros de minha infância। Vendo
aquele local deserto, sem uma pessoa, ali, naquele momento, senti uma saudade
danada daquele dia em que fiz a minha primeira viagem de trem e estive tão
feliz naquela plataforma cheia de gente e agora completamente vazia. E ao me
retirar daquele local avistei a única fonte remanescente do ruído de outrora.
Afrontando o tempo, apenas um pouco arredada do seu antigo lugar, está à
máquina de beneficiar arroz. Um pouco mais preguiçosa, mas ainda tendo ao seu
derredor a figura do amigo, João do Sô Nico*, que, talvez, como eu, guardando
dentro de si os quadros veneráveis daquela estação e os apitos da Maria-fumaça,
subindo e descendo... Buscando e levando a vida da cidade. Seria inútil tentar
arrancar de mim essas lembranças doloridas. Elas entraram pelo cérebro,
desceram ao coração e lá se acomodaram.
Armando Melo de Castro
Um comentário:
que historia macabra,e de arrepiar,mas gostei porque são historias reais!!!!!!
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