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terça-feira, 21 de maio de 2019

O MEU PÉ DE TANGERINA.



Hoje, de manhã, verifiquei que, nesta data, estou morando neste mesmo apartamento, aqui em Juiz de Fora, há seis anos e que jamais teria morado por tão longo tempo em uma única residência a não ser na casa de meus pais. -----

Aqui eu teria completado vinte e cinco mudanças de tetos sob os quais eu tenho vivido incluindo cidades, pensões e casas, no decorrer da minha vida como bancário e algumas já depois de aposentado. Parece-me que isso me fez acostumado com a vida de cigano. --- Nessas andanças aprendi que vida é uma estrada cheia de obstáculos. Nascemos, vivemos e morremos. Somos enganados logo que chegamos ao mundo no momento em que nos colocam na boca um bico seco no sentido de nos castrar o choro.

Aprendi, também, que viver é uma arte que exige paciência, fé em Deus e tranquilidade. ---- Gosto muito de lembrar o poeta Vicente de Carvalho quando disse que a felicidade existe sim, mas nós não a alcançamos porque está sempre onde a pomos e nunca a pomos onde nós estamos. --- Crescemos em um mundo negativo onde a mentira impera. Os mais velhos mentem e os políticos roubam quando deveriam ser modelos sociais omitindo, assim, a condição de seres exemplares.

Chegamos à vida adulta por um caminho no qual a tristeza vai lado a lado com a alegria que é sempre menor. A Obra da Criação de Deus é perfeita, entretanto, é constituída de linhas tortas que nem sempre são respeitadas ou entendidas. Com isso, toma conta de grande parte das pessoas o sentimento de inveja, de vingança, mentira e maldade. Isso são coisas que trazemos de nossa infância.

A verdade é que vivemos enganando e iludindo a nós mesmos. Isso se deve ao fato de sermos frágeis. Nascemos sem pedir, vivemos entre a cruz e a espada e morremos contra a vontade. Obviamente, queremos ir para o céu, todavia, sem a necessidade de morrermos para isso. 

O sentimento humano deveria ser trabalhado desde o dia do nascimento, todavia, não o é. Vivemos em um mundo viciado e o vício é contaminante. Os pais que deveriam ser os responsáveis, na realidade, são vítimas de um modelo social deturpado. E, com isso, somos dominados por sentimentos que retratam um sofrimento íntimo que vive corroendo o ser humano em sua grande maioria e destruindo o mundo encantado das crianças.

Em cada mudança de residência que fazemos parece que fica um pedaço da gente para trás. E nessa meditação, eu me lembro da primeira mudança que fiz na vida, quando eu contava dez anos de idade, minha família mudou-se da casa onde eu nasci na Rua Coronel João Afonso. Era uma velha casa vendida pelo meu pai, a fim de construir outra na mesma rua, porem num lote vago, na parte de baixo.

Essa mudança foi a primeira tristeza que entrou pelos meus olhos, registrou-se no meu cérebro e se acomodou no meu coração, hoje transformada em nostalgia.

Eu estava com meus dez anos de idade e ainda não tinha me deparado com a essência da vida. Naquele tempo, o céu era mais azul e as nuvens mais brancas. A velhice ainda não entendida e a morte pouco reconhecida. As minhas esperanças eram limitadas porque eu nem sabia o que esperar! ----- Eu não tinha expectativa para me formar em nada Não tinha uma televisão para me mostrar a ostentação da vida. Não tinha um rádio para ouvir uma canção que fosse alegre ou degradante. Não tinha um brinquedo de loja. O meu mundo era pobre e muito pequeno, porém, era imensamente e feliz.

E os limites deste mundo estavam no quintal da nossa casa que, em função daquela mudança, ficaria para trás. Assim, eram os meus amigos: o pé de lima da Pérsia, o pé de laranja, o pé de pêssego, o abacateiro e a minha preferida, a querida árvore na qual tantas vezes eu brinquei sob a sua sombra com o meu caminhãozinho construído pelo meu pai. Era o meu pé de tangerina pura sem mutação, hoje muito rara e que possuía frutos doces e saborosos dos quais eu nunca mais pude apreciar. A minha tangerineira era como a minha árvore de natal e os seus frutos eram os presentes vindos de Deus.

Despedi-me da minha árvore querida como um noivo que se despede da noiva ao ir para a guerra num banho de lágrimas. Assim, se não me engano, foi a primeira vez que chorei com o coração. E sempre, quando estou para me mudar de casa, ou vejo algum tipo de tangerina parecida, paira sobre minha mente, esta agressão emocional desencadeando uma dor incurável na forma de um rastro de saudade, que apesar de doída, é feliz.

"As crianças não têm passado e nem futuro; elas gozam o presente"                                                                                                                                                        --- Bruyère ---
Armando Melo de Castro
Candeias MG Casos e Acasos

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