Foto do Álbum de Clara Borges.
Lembro-me de quando Candeias não
tinha sequer uma rua calçada. A Rua Coronel Marques, chamada de Rua da Estação
era o cartão de chegada de quem vinha de fora. E era triste. Se fosse aos
tempos de chuva, os viajantes sofriam com suas malas no meio do barro. Esta,
contudo, foi a primeira rua de Candeias a receber calçamento. E o pedreiro que
o fez foi um senhor chamado Ilídio.
Lembro-me que naquele tempo os
meninos trabalhavam. Vendiam pão, doces, biscoitos, pastel, verduras e frutas,
na rua. Muitos engraxavam sapatos. Eu
por exemplo engraxei muito sapato aos domingos na Rua Professor Portugal. Outro
que foi meu colega e que também tinha um engraxate era o Vicentinho Vilela.
Naquele tempo os filhos ao invés de viver à custa dos pais já os ajudavam nas
despesas. Faço-me lembrar de que o Pedro Pitanga, Dionísio Passatempo, Joaquim Passatempo,
Adão Caixeiro, eram meus fregueses de engraxate.
Lembro-me da Praça Antônio
Furtado, quando não tinha árvores nem bancos. Quando servia de campo de futebol
para os times formados na rua. Quando era conhecida pela Praça dos Circos,
pois, ali eram armados os itinerantes, circos e parques. Barracas de ciganos e
ponto de aglomeração pelas festas de reinado.
Lembro-me das três sirenes que apitavam
na cidade. A mais possante ficava na máquina de limpar café do Bonaccorsi nas
proximidades da estação ferroviária. Ela tinha um ruído tão forte que era
ouvido nos quatro cantos da cidade. A outra era, também, da máquina de limpar
café do Emídio Alves, na Rua Francisco Bernardino de Sena. E a terceira era a
do cinema, avisando que a sessão cinematográfica estava prestes a começar.
Lembro-me dos trens de
passageiros que paravam na estação deixando e levando passageiros para os
diversos pontos do país. Como era gostoso viajar de trem. Ele demorava duas
horas de Candeias a Formiga, e andava sempre atrasado, mas era uma viagem
tranquila. Ali dentro do trem tinha gente de toda parte e às vezes podíamos encontrar
até artistas. Certa vez numa dessas viagens pudemos ver as irmãs Galvão. Uma
com o violão e a outra com o acordeão. Eram jovens cantoras e estavam viajando
no vagão de segunda classe. Junto com a classe proletária. Os trens tinham a
primeira e a segunda classe. E como o acesso de um vagão para o outro era
fácil, muitas pessoas compravam o bilhete de segunda classe e viajava no de
primeira. Esperava o chefe do trem passar e picotar as passagens. No noturno
tinha ainda o restaurante, onde podia tomar refeições quando a viagem era mais
longe. Fora disso poderia tomar uma cervejinha ou refrigerantes.
Lembro-me do Bar do Bóvio e do
Bar Piloto. Candeias não tem hoje um bar que possa ser comparado com esses dois
bares. Bebidas nacionais e estrangeiras. Como não existiam nesse tempo os
supermercados, latarias, azeites de oliva, ou seja, tudo que era importado ou
importante era vendido nesses bares. As vendas vendiam normalmente a alimentação
básica.
Lembro-me da festa do Reinado.
Havia nessa festa candeenses que sumiam durante o ano e apareciam nesse tempo.
A cidade ficava cheia os comerciantes vendiam muito e quando o povo que vinha
de fora ia embora a cidade ficava triste. Da mesma forma era a época da Semana
Santa.
Lembro-me do Carnaval em
Candeias. As mães iam para levar as suas filhas. Não havia essa liberdade que
existe hoje. As filhas eram preparadas para o casamento e os rapazes eram
comprometidos com o trabalho quando pensavam em se casar.
Lembro-me dos domingos de verão
quando vários caminhões iam até a usina que gerava a eletricidade do município
e era de propriedade do Senhor Celestino Bonaccorsi. Parece que lá existia mais
água. E peixe também. As pessoas nadavam, pescava, namoravam tudo dentro de
grande respeito.
Mas, a lembrança que mexe e
remexe dentro de mim... A lembrança que fermenta e aumenta uma grande saudade.
A lembrança que entrou pelo meu cérebro e desceu ao coração e lá permanece, é o
eco dos sinos da antiga Igreja Matriz chamando os fieis para o encontro com Deus;
marcando o meio dia; anunciando a hora do Ângelus e anunciando, também, a ida
de um filho de Deus para o céu... Esse eco é uma mistura de lembrança, saudade
e tristeza.
Armando Melo de Castro
Candeias MG Casos e Acasos.
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