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domingo, 5 de junho de 2011

UMA FERIDA CANDEENSE


---- Candeias, no passado, teve dois pontos turísticos relevantes. Um deles é a cachoeira na qual foi instalada, no princípio do século passado, a usina hidroelétrica do senhor Celestino Bonaccorsi, quando Candeias, era ainda, um distrito de Campo Belo. ----- Com o advento da Cemig para Candeias, na década de 60, a usina do senhor Bonaccorsi foi vendida para a Prefeitura. --------------------------  O outro ponto era a Serra do Senhor Bom Jesus, devastada pela indústria da pedra, fazendo dela uma buraqueira desmedida e esburgando a sua beleza original.

----Lamentável é o fato de que as pessoas, então, responsáveis pelo município de Candeias e que deveriam e poderiam, sem dúvida, terem impedido essa destruição não o fizeram, simplesmente por falta de sensibilidade; falta de patriotismo; falta de cultura e compromisso para com o futuro. E a nação candeense assistiu dos camarotes de sua história, esvair-se lhe de um patrimônio que deveria fazer parte dos anais da história do município a exemplo de muitos outros municípios que tiveram as suas usinas municipais ou particulares desativadas pela chegada da Cemig, mas aproveitadas como ponto de turismo cultural ou lazer.

 ---O local era frequentado pelo povo de Campo Belo, que tinha a usina de Candeias como um passeio turístico.

---- Aos domingos, principalmente, carros e caminhões do tipo pau-de-arara, dirigiam-se para aquele local a fim de se banhar e pescar. E como tinha peixe! Lambaris, piabas, cascudos, mandis e muitas outras espécies eram pescados entre aquelas pedras, pois havia ali diversos tanques. O local era também servido ao povo de Campo Belo, principalmente no verão.

---Lembro-me do Zequinha da Donate. Ele era ainda bem criança e nadava feito um peixe, mergulhava-se e saía sempre com um peixe na mão.

---As pessoas assando churrasco, bebendo cerveja e tudo era uma alegria. Acontecia, de quando em vez, uma briguinha que não ia para frente porque a turma do “deixa-disso” logo dava um jeito.

---Na área, existia um chalé onde sediava o Clube dos 21. Eram vinte e um sócios, dos quais me lembro do Luizinho Bonaccorsi, Midinho, Orlando do Melão, e outros.

---O ambiente era saudável e não havia deturpação. Parece-me que naquele tempo as pessoas tinham mais compromisso com a cidadania, com a civilidade o que, infelizmente, tem faltado muito, nos dias atuais.

Pessoas idosas frequentavam em comum àquele local. Pessoas requintadas da nossa sociedade iam ali, se divertiam e voltavam satisfeitas. O povo candeense, se misturava sem preconceitos; era o negro e o branco; o rico e o pobre; o feio e o bonito. ---- A beira do canal da usina, próximo da casa dos usineiros, era gente cantando ao som de violão; assando carne, bebendo cerveja quase quente e tomando cachaça. Que tempo bom meu Deus! Aquilo não poderia ter acabado. Os usineiros sempre emprestava um quarto para as senhoras trocarem de roupa e as suas salas para pessoas idosas.

---Estava sempre presente um vendedor de bebidas ambulante, com cerveja gelada, levada através de um tambor com barras de gelo com serragem. Gelo que era fornecido em barras pela manteigueira.

---Era interessante para as crianças quando ficavam conhecendo o local onde era gerada a energia elétrica que iluminava a cidade. Eu fiquei abismado quando vi, pela primeira vez, as máquinas que produziam a luz que iluminava as nossas casas. Lembro-me, ainda, do meu pai tentando me explicar como era feita esta transformação. Lembro-me da minha curiosidade em saber como transformar água em luz.

 ---À porta da usina, havia um grande passeio no qual os pescadores, em outros dias, à noite, estendiam os seus lençóis próximos de uma pequena fogueira, debaixo do pé de manga até hoje lá existente. Comiam, bebiam e dormiam. Meu pai era um desses pescadores e sempre se me fazia acompanhá-lo

---A casa com as duas residências dos usineiros e o canal deveriam ter sido aproveitados como um clube campestre municipal.

Sabe-se que em muitas cidades, onde as prefeituras se tornaram proprietárias de usinas que antecederam a Cemig, foram transformadas em pontos turísticos para o povo. A cultura de preservação do patrimônio público estava presente nesses municípios. Privilégio que o povo de Candeias não teve.

---Infelizmente nada foi aproveitado. Até o galpão todo construído de pedra, onde fora instalada as máquinas geradoras, foi aproveitado, tendo sido destruído deixando apenas um rastro da falta de sensibilidade, falta de amor e falta de competência administrativa dos responsáveis de então. Nada foi conservado como herança para as novas gerações.

--Aqui, em Candeias, aquele local onde poderia estar à vista dos nossos jovens um local histórico, está os sinais da destruição desalmada; da irresponsabilidade daqueles que detinham o poder na época dessa transição. Nem o galpão, todo construído de pedra onde foi instalada a usina, mereceu ser preservado. Parece até, que o instinto de destruição dos responsáveis exercera ali o impulso inato da insensibilidade; da falta de respeito com aqueles que teria construído um capítulo importante da história de Candeias.

--- A outra destruição foi na Serra do Senhor Bom Jesus. Ali poderia ter sido reservado para um parque ecológico bem próximo à zona urbana. ----- Candeias tendo diversas pedreiras em seu município poderia as pedreiras da Serra do Senhor Bom Jesus terem sido poupadas da destruição.  No entanto os responsáveis pelo município permitiram a destruição de uma área que jamais poderia ter sido agredida pela indústria da pedra. Mas as mazelas dos responsáveis, cuja ignorância exigida para o poder público seria dispensada, permitiu mais esse prejuízo para a história do nosso município.

--Na Serra do Senhor Bom Jesus, os jovens faziam os passeios dominicais, chamados piqueniques. Os namorados se juntavam num grupo, muitas vezes acompanhados pelos pais e levavam os lanches na época chamados de “merenda” ou, até mesmo, de uma refeição leve. Não existiam os rádios à pilha, portanto, para o barulho sonoro era levado um violão. E, debaixo de uma árvore, a turma se reunia, quase sempre, perto de uma grande pedra onde, muitas outras, serviam de mesa e de bancos. A área tinha diversas frutas silvestres como guabiroba, araticum-cagão, marmelada-de-cachorro, araçá e muitas outras, cada uma no seu tempo.

---Meu Deus! Como nós que amamos a terra em que nascemos, precisamos de alguém que cuide bem de nossa tão querida terra Candeias. Alguém que a preserve e a ame de verdade.

---Infelizmente a nossa história está marcada por capítulos tristes, que poderiam ser evitados. É lamentável... Deveras lamentável.

Armando Melo de Castro.

Um comentário:

FELTRO POR MIM disse...

Candeias tem muita história, história perdida no tempo, que seria digna de museu. Me admira até hoje nenhum Prefeito, nenhum vereador ter lutado pela preservação da história Candeense!