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quarta-feira, 23 de março de 2022

OS MEUS 18 ANOS E O COADOR DE PAPEL.


     A literatura conta que o coador de café, foi inventado por uma senhora chamada Melitta Bentz, em 1908, uma alemã que não se adaptou com os coadores de pano... Melitta teve muita dificuldade para manter a sua fabriqueta que foi fundada numa época de guerra e recessão, mas nem assim ela desanimou e vendia os seus produtos de porta em porta. O seu invento começou, contudo, a ser exportado no ano de 1929. --- Aqui no Brasil o filtro de papel chegou apenas no final da década de 60.

No princípio da década de 60 quando eu contava 18 anos, e estava por chegar à ditadura militar, eu fui parar na cidade de Mogi das Cruzes no Estado de São Paulo, onde me vi como um peão de obra, morando num barraco nos fundos de uma construção do Banco do Estado de São Paulo. Ali, à noite, eu queimava as minhas latas, como diziam, num fogãozinho jacaré a querosene; fazia a janta reservada para o almoço do outro dia, coava o meu café e bebia a minha caninha Tatuzinho, quando, também, fritava um pedação de linguiça, daquelas mistas que ficam dependuradas nos açougues a disposição das moscas e mosquitos. Essas linguiças normalmente tem cheiro de tudo, menos de carne. Às vezes o cheiro parecia com o de uma carniça de longe. Afinal, aquelas linguiças só não tem a bosta e a urina dos animais, no mais tem tudo. Eu bebia a minha caninha Tatuzinho, como se tivesse saboreando um Macallan 18 anos e completava o gosto com aquela linguiça como se estivesse degustando um caviar francês. --- Tomava o meu banho frio numa torneira que existia próximo do barraco. Eu morava sozinho naquele barraco porque o meu trabalho consistia em apontar o que entrava e saia da obra, durante o dia e a noite; além de ter que ajudar os serventes e pedreiros fora das anotações. A minha função era mais parecida com a de um escravo porque não tinha horário.

Nesse tempo em que não se falava em coador de café, de papel, eu já teria inventado o meu coador de papel e funcionava maravilhosamente. Eu arrumei um funil, desses comuns de plástico, cortei o bico dele, e furei uns buraquinhos ao redor da saída, e dobrava o papel higiênico que vinha a ser dos mais baratos. (eu tinha um rolo só para isso) e ali coava o meu café numa boa. --- Então eu quero dizer que quando apareceu o coador Melitta, ora, ora, eu já conhecia o coador de papel inventado por mim. E olha que anos depois eu o aperfeiçoei, quando surgiu esse rolo de papel de cozinha, aí ainda ficou melhor, substitui muito bem numa emergência qualquer Melitta da vida. Assim que apareceu o coador Melitta no final da década de 60, coar café no papel para mim já era uma coisa velha. É aquela história: “Não tem cachorro caça como gato”.

Foram 4 meses nessa peleja, quando resolvi voltar para Candeias. Eu que antes tinha me preparado para trabalhar num escritório, aprendi datilografia, tinha abandona o ginásio de Candeias na terceira serie me vi de novo, em Candeias trabalhando de pintor de paredes como ajudante do Gabriel Carlos, quando pintamos as melhores casas de Candeias.

No ano seguinte, voltei para São Paulo. Um jovem não pode desanimar quando tem 18 anos. A escola do mundo não dá diplomas, mas ensina a viver.

Armando Melo de Castro.

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