Total de visualizações de página

sexta-feira, 22 de abril de 2011

BAR PILOTO e Seu fundador.

Mário Rigali, o nosso querido Piloto, nasceu na Italia e viveu a grande parte de sua vida em Candeias. ---- Foi um grande incentivador do progresso de Candeias. Teve grande influência sobre a construção de nossas praças, jardins e a estátua de bronze que representa os nossos pracinhas. Bom amigo, prestativo, caridoso e humilde, dedicou a maior parte de sua vida, colaborando com a construção da nossa história.


Algumas pessoas diziam que Mário Rigali teria sido piloto de avião na sua terra. Mas, não. Ele não foi piloto e jamais pilotou alguma coisa. Fui muito amigo dele e pude ouvir dele tratar-se de uma brincadeira. Algum curioso lhe teria perguntado, tão logo ao chegar aqui em Candeias, o que teria feito na sua terra; e num lance, para dar uma resposta esperta, dissera ter sido piloto. Quem sabe estaria aí a sua legítima vocação!? E assim, autodenominou-se, Piloto.Quem conheceu o Bar Piloto no passado e o vê hoje, com certeza, sentirá o que sinto: muita saudade e lamento. Era um estabelecimento modelo de requinte, não só para Candeias, mas para toda a região. Nesse tempo, ainda não haviam sido inventadas as grandes lojas de autosserviço ou o supermercado autossuficiente. O comércio de Candeias, afora a Casa Celestino Bonaccorsi, era limitado a pequenas mercearias, pequenas vendas, onde só se encontravam secos e molhados de primeira necessidade. Produtos como, por exemplo, uma lata de palmito, um salaminho, uma garrafa de um bom vinho, queijos, azeites de oliva, presunto e uma boa mortadela, só eram encontrados no Bar Piloto.

Não se serviam bebidas no balcão. Isso era exclusividade nas mesas e nos reservados. Para isso havia diversas mesas onde o freguês era atendido. E já, naquele tempo, o bar dispunha de dois excelentes funcionários, competentes e responsáveis pais de família: Afonso Ferreira de Oliveira, o popular Afonso da Alvarina, e Sebastião do Leonides. Esses dois candeenses, dignos de louvores, fizeram as suas vidas iniciadas como funcionários do Bar Piloto.


Enquanto os funcionários trabalhavam, Piloto, sempre por ali conversando e num corpo-a-corpo com os fregueses dava uma ênfase de cordialidade.

O bar apresentava, nas prateleiras lotadas, variadas bebidas nacionais e estrangeiras; um longo balcão coberto de mármore sobre uma vitrine iluminada mostrando os produtos disponíveis, sendo esses de primeiríssima qualidade como bombons, chocolates, confeites e guloseimas ornamentadas.

À noite, o barulho era das vozes dos frequentadores, nas mesas trocando ideias e contando histórias diante de uma boa garrafa de vinho ou de cerveja. O requinte do ambiente inspirava o traje discreto dos fregueses e muitos desses se postavam de terno e gravata. O ambiente era frequentado por pessoas de todas as idades: de crianças a idosos.

Durante o dia, o silêncio era quebrado pela sonoridade de um rádio e o barulho da máquina de fabricar sorvetes e picolés. Uns picolés redondos e quadrados, dos mais variados sabores, cereja, limão, abacaxi e, ainda, o sorvete de coco queimado, uma verdadeira delícia!

Diante daquele turbilhão de lembranças, pude buscar, numa das gavetas do meu cérebro, o dia em que completei seis anos de vida. Era o dia 16 de janeiro de 1952, quando fui levado ao Bar Piloto pelo meu pai que me presenteou com um chocolate bem grande. Foi a primeira vez que comi um chocolate. Era uma grande barra com uma embalagem vermelha com umas listras brancas. O nome, ou seja, a marca, seria impossível poder lembrar. Eu só sei dizer que foi um dos dias mais felizes da minha vida.

Com aquele chocolate nas mãos, cheguei a estar desesperado para correr para casa, mostrar para a minha mãe, arrancá-lo da embalagem, dar uma dentada e distribuir um pedacinho para cada uma das minhas duas irmãzinhas que, com certeza, iriam provar, muito primeiro do que eu na vida, aquele delicioso manjar dos deuses.

E minha mãe, ao me ver chegar com o chocolate disse logo: “Uai! Vocês foram ao Bar Piloto!?” Era assim. O Bar Piloto era também conhecido pelos seus produtos.

O tempo determinou que Piloto se dedicasse apenas às suas representações e resolveu passar o Bar para frente. E este veio a ser de propriedade do seu mais antigo funcionário, Afonso Ferreira de Oliveira. Posteriormente, foi vendido para a Senhora Nica, esposa do Sr. Bernardino Bonaccorsi, quando foi gerenciado, durante muito tempo, pelo seu filho Guido Bonaccorsi. Daí, o Bar foi repassado para os irmãos Cassiano, os populares “Cabaceiros”.

A cada mudança, evidentemente, o estabelecimento perdia um pouco da sua originalidade, contudo, até então, mantinha as características do verdadeiro Bar Piloto. Mas, a partir dos compradores dos “Cabaceiros”, o estabelecimento perdeu completamente as suas características e, hoje, resta apenas o nome.

A crueldade do tempo e o desinteresse cultural são os responsáveis pelo abandono em que se encontra o Bar Piloto. Já não bastasse isso, temos ainda que lamentar o porquê que a história de Candeias não preencha este capítulo em branco destinado ao Bar Piloto e ao seu fundador; o querido candeense por adoção: Mário Rigali.

É lamentável, também, que as autoridades constituídas, principalmente os senhores vereadores, entre um mandato e outro, durante tantos anos, não tenham tido a iniciativa de homenagear alguém que veio de tão longe para colaborar com tanto amor na construção da nossa história, a história de Candeias.

Sua esposa Elza partiu para São Paulo em busca de estudos para a filha Iara. Piloto aqui ficou. Não abandonou a terra que o adotou. Por muitas vezes, já morando em São Paulo, na década de 60, fui portador de suas encomendas para a sua esposa que nunca mais voltou para Candeias.

Faleceu no dia 26/03/1968, aos sessenta e seis anos, vítima de um câncer prostático e está sepultado no Cemitério São Francisco, onde na lápide do seu túmulo está escrito:

“O CORAÇÃO QUE SE DESFEZ EM VIDA, DOCE CANDEIAS, POR TE AMAR, EU TE DEI; AGORA, DÊ-ME TU, A GRAÇA DE ME SENTIR EM TI, DESFEITO.”

Onde quer que esteja, receba o meu abraço, meu bom amigo Piloto.


Armando Melo de Castro
                 

quarta-feira, 13 de abril de 2011

CALITO E O RIO BRANCO E.C.


Na década de 20 existia, aqui em Candeias, um salão de barbeiro conhecido por todos como o Salão do Pedrinho. Situava-se na Avenida 17 de Dezembro onde se localiza hoje a Grazzy Modas.

Pedrinho (o meu bisavô) era o patriarca de uma prole de nove filhos dos quais três deles, também, eram barbeiros: Juquita, João Piruca e Carlos, o meu avô materno, conhecido pelo apelido de Calito. Exerciam a profissão neste salão o pai e dois filhos, o Juquita e o João.


Calito, tinha o seu salão na sua residência numa das quatro esquinas que formam as ruas Cel. João Afonso e Professor Portugal, onde atualmente reside a família do Sr. Antonio do Orcilino.
Calito - fanático torcedor do Rio Branco E.C.


    Foi barbeiro competente, tinha uma grande freguesia, num tempo em que Candeias tinha diversos profissionais desta área. Mas, era dado a estroinices e por isso nunca conseguiu muito na vida. De quando em vez invernava nos "goles"  e no carteado e daí o salão ficava fechado para balanço. Até que voltava a trabalhar para pagar as contas contraídas durante o período em que estivera invernado.

Trabalhando, Calito era uma pessoa pacata, tranquila. Bebendo era agitado, briguento e às vezes inconsequente, pois, muitas vezes, se tornava violento e era chegado numa arma de fogo, naqueles tempos dos delegados “calça-curta” quando Candeias era uma terra sem lei. Nesse tempo o Campo do Rio Branco Esporte Clube (o time do meu coração) ficava pouco abaixo da casa comercial do Vicente Vilela; e o futebol daquele tempo em Candeias, dava gosto.

O Rio Branco era um time ativo, com uma grande torcida e uma equipe de jogadores das melhores. Por muitas vezes ganhou no seu pequeno campo, partidas contra o Esparta e o Comercial de Campo Belo. A Associação Esportiva Candeense era o seu principal adversário porque neste tempo Candeias ainda não tinha o Clube Atlético Candeense.

Miguel Simões foi o fundador do time. A população da zona norte da cidade chegava a ser uma torcida fanática, aliás, não podemos nos esquecer que o Rio Branco é um time que está sufocado no esquecimento, mas já foi a “boa bola” candeense de outros tempos o que faz a sua torcida viver de saudade.

Nunca estava ausente nas grandes partidas o Monsenhor Castro, apostando sempre um engradado de cerveja, principalmente quando o jogo era contra a Associação. E o reverendo perdeu por muitas vezes as suas apostas por subestimar o vitorioso Rio Branco. Passarinho, um dos maiores ídolos do Rio Branco deve ter aprendido a tomar cerveja ganhada nas apostas do Monsenhor Castro.

Chico Viriço, o curador, sempre presente e com a cabeça cheia de pinga riscando o chão com uma faca tipo peixeira. Os irmãos “mulatos” João e Mané estavam sempre presentes na torcida-da-paulada. E o Calito, meu avô, se estivesse “invernado”, o bicho pegava.

Certa vez, veio jogar com o Rio Branco, o São Bento de Itapecerica. O São Bento estava atravessando a sua melhor fase. Havia ganhado todos os torneios lá pela região de Itapecerica e estava com a crista bem alta. A torcida do Rio Branco, por sua vez, não se deixava abater. Queria tirar à máscara, a crista, a fanfarra e tudo mais que elevava o São Bento. Faixas nos postes foram colocadas com dizeres agressivos de pouca hospitalidade aos visitantes.

Lá pelas três horas da tarde um caminhão tipo pau-de-arara pára defronte ao campo do Rio Branco. A torcida já começa a chegar e os jogadores acomodados em seu caminhão ficaram quietos aguardando a hora de entrar em campo.

Os insultos já começavam:

--- "Nois hoje vai mijá no tamanduá..." Outro já gritava do outro lado: --- "Que mané mijá, nois vai é cagá nesse bicho feio..." O campo recebendo a torcida, homens, mulheres e crianças. Quem não se divertia com o futebol se divertia com a brigalhada sempre prometida...

É chegada à hora do inicio do Jogo. O Juiz viera acompanhando o São Bento. Era sem dúvida um suicida. Tinha que ser um homem de muita coragem porque aquela partida mais parecia um espetáculo de uma arena romana.

Começa o jogo. A saída é favorável ao São Bento que num toque clássico leva todo o ataque para a área do Rio Branco. Uma cabeceada fatal faz com que o São Bento marque o seu primeiro gol em apenas um minuto.

Novo lance: um jogador do time visitante rola para a esquerda, avança, recebe de novo e toca para a pequena área quando lá já aguardava o atacante do São Bento, que num tiro leve faz o segundo gol com apenas três minutos de jogo.

O clima ficou tenso e as botinas começaram a trabalhar quando de repente Passarinho, o ídolo da torcida do Rio Branco, levou uma “botinada” que fez o neguinho rolar no chão de tanta dor. Ele que era o maior goleador do Rio Branco, agora meio contundido e diante de tanta marcação, não conseguia ver a cor da bola. Assim teve que sair deixando um espaço maior para o São Bento que veio a fazer o seu terceiro gol em menos de dez minutos do primeiro tempo.

Tudo indicava que ia ser a maior “lavada” da história do Rio Branco.

E diante daquele clima efervescente ouve-se um grito:

O desgraçado do São Bento que entrar na nossa área vai levar um tiro nas suas duas bolas e nunca mais vai querer saber de bola. Era o Calito, o meu avô, com uma garrucha na mão ao lado do gol, ameaçando quem se aproximasse da área do Rio Branco.

Não ficou nem um só jogador do São Bento em Campo. A torcida toda incitada via o caminhão saindo e jogadores do São Bento tomando o veículo em movimento.

Meu avô... Meu querido! Onde quer que esteja receba o meu beijo... Você era complicado com uma pingas na cabeça em dias de jogos do Rio Branco, mas era bom também... Isso era por amor ao Rio Branco, o nosso querido time que quando entrava no coração de alguém não saia nunca mais. 

O meu amor pelo Rio Branco é antigo e foi uma herança de meu pai e meu avô materno! 

Armando Melo de Castro
Escreva para o autor: