Total de visualizações de página

sábado, 26 de novembro de 2011

UMA DEFUMAÇÃO ESPERTA

Foto para ilustração do texto.
Tem gente que não tem o chamado “desconfiômetro”, ou seja, princípios de boas maneiras na escolha da hora de visitar alguém. ---- Um exemplo disso é visitar uma pessoa que teve um parente morto e passar dos quinze minutos protocolares que a etiqueta recomenda. ---- Ficar o tempo todo jogando a tarefa do consolo para Deus: “Deus vai lhe dar o conforto”; Deus vai lhe ajudar. De outra forma é ficar especulando a pessoa como se aquilo fosse um depoimento policial.  ---

O visitante quer saber porque o defunto morreu; como foi etc. E essas pessoas nem notam que estão sendo inoportunas. Isso para quem perdeu um ente querido é um martírio ter que ficar falando do morto, principalmente se foi de acidente. O enlutado quer mais é descansar na sua dor. Afinal ele normalmente está transpassado.  ---- Quer visitar, quer telefonar, quer se manifestar, dê um tempo. A pessoa que perdeu o ente querido não tem presa para receber o carinho dos amigos.

Estando o ser humano extremamente frágil, nesses momentos, a pessoa fica descrente, letárgica e pouco se importando para o que as pessoas estão falando. É claro que existem as exceções. A morte de alguém em uma família não é considerada uma devolução para Deus e sim uma perda e nenhum humano gosta de perder nada e principalmente uma pessoa querida. O subconsciente do enlutado cobra de Deus essa perda e a fé apenas vem a ser resgatada com o passar do tempo.

Outros fazem visitas em horários da lida caseira, das novelas e das refeições. Por mais íntima que seja a amizade, esse tipo de visita incomoda.

Eu morava em Lagoa da Prata e minha mulher teria viajado, quando eu resolvi fazer um almoço para mim e minha filha que teria um compromisso escolar. Preparei uma salada, dois bifes, batatinha para fritar e refoguei o arroz. Já ia preparar o feijão, quando a campainha tocou.

Fui atender a porta, quando me dou com um casal. Cada qual com uma Bíblia na mão. E eu já pude imaginar do que se tratava. Era, sem dúvida, um casal de Testemunhas de Jeová. Uns pastores volantes que aparecem nas casas da gente, geralmente, no horário de almoço. Contudo, como tenho o hábito de receber bem as pessoas na minha casa, fiz tudo para ser gentil, mas existem aberrações tão extraordinárias que não dá para levar.

---Pois não...

--- O senhor tem cinco minutos para nos atender?

--- Bem, eu estou preparando o almoço. Minha filha vai para a escola e o meu tempo está contado...

---Mas, serão apenas cinco minutos.

---Se for para falar de religião, em cinco minutos eu... Tudo bem, então! Sendo somente cinco minutos, eu nem vou lhes convidar para entrar.

---O senhor já leu a Bíblia?

---Já! Já li a Bíblia completamente.

---E o que achou?

---Achei, parcialmente, interessante.

.---Mas, por que parcialmente? A Bíblia é toda interessante!

---Para os senhores. Para mim não basta lê-la e sim estuda-la profundamente.

---Qual a parte que o senhor achou mais interessante?

Nesse momento eu interpelei: Olhe meus amigos, vocês disseram cinco minutos e esse tempo já passou. Não dá para discutir a Bíblia desse jeito e nesse tempo. ---- Mas os dois mensageiros de Jeová insistiram e continuaram:

---O senhor pode citar algum livro que o senhor gostou?

---Sim! Claro! Todos que fazem referência direta a Jesus Cristo, desde que na essência da palavra.

---E o Velho Testamento, o que o senhor diz?

---Muita alegoria, especialmente o Pentateuco com ênfase para a Gênese.

A essas alturas, eu não queria ser mal educado e o meu arroz deveria estar queimando. Fui lá dentro tirei a penela do fogo, voltei e abri o meu sermão:

---Vejam, meus amigos. Vocês vão me dar licença, entretanto, não dá mais! Eu estou muito ocupado. Vocês disseram que seriam apenas cinco minutos e já foram mais de quinze. Discutir a Bíblia numa situação dessas é impossível. A minha panela começou a queimar. Aliás, eu queria sugerir a vocês que fizessem esse trabalho em outro horário. Em uma hora dessas, as pessoas estão envolvidas com as refeições, não é verdade?

--- Mas, é nessas horas que a gente encontra as pessoas em casa! Olha! Já que o senhor tirou a panela do fogo, gostaríamos que nos desse mais um minutinho, afinal de contas, estamos gostando de conversar com o senhor.

Pensei cá comigo: e eu não estou gostando nada de ouvi-los seus merdas. E disse-lhes:

---Então, por favor, sejam breves, porque senão eu vou me atrapalhar.

---O senhor sabe que os dias estão contados?

---Dias? Quais dias?

---Os do juízo final.

---Olhem, meus amigos! Entrem, enquanto ou vou lá dentro.

Fui até a sala de jantar e com a minha voz bastante alterada como que de um pai de santo e comecei:

---Eu cavalo, entidade capangueiro tô.

Dei um espaço e continuei:

---Curumbeiro, nem vai dá! --- Esprito aqui falange amola eu! Fluido mau! Rabo de saia e perna de calça. Eu vai fazê mironga. Manda imbora! Não vorta, manda morada, Égun! Ajeita eu sem sussego pá amalá... Eu num aguentá! Vai fazê mironnnnnnnnnnnga...

E comecei a cantar com voz alterada:

---Vô defumá é agora! Ajucá, essa defumação abacé foi quem mandô pra levá perna de calça e rabo de saia daqui e sumi pra lá.

Tão logo sai lá fora, o casal de chatos teriam já saído pelo portão e apavorados sem se despedirem já iam embora a passos largos. Deram uma olhada para trás e me olharam como se estivessem vendo o diabo. -------Gente! Que Deus me perdoe, mas eu não dou conta dessa gente! ---- Mas foi bom eu entender um pouquinho de macumba e me fazer livre através do preconceito deles.

Armando Melo de Castro
Candeias MG Casos e Acasos.






Um comentário:

Unknown disse...

Grande saída Armando, lembrei-me de minha atitude nessas horas. Quando chegam essas pessoas querendo me fazer sermão das maravilhas da bíblia e dizem: "Bom dia, irmão", minha resposta é invariavelmente: "Saravá, irmão"; tiro e queda, a conversa termina aí.